Em 2015, após quatro anos de pesquisas, Carolina Burg e Jorge Felipe (Pipo) Lemann fundaram a JFL Realty. À frente da gestora de ativos imobiliários e da JFL Living, braço de locação de imóveis long stay para a alta renda da empresa, eles ajudaram a desbravar o conceito, até então pouco explorado, de multifamily (prédios residenciais para aluguel) no Brasil.
Nove anos depois, a dupla segue avançando nesse terreno. Mas, agora, não mais sob o mesmo “teto”. Burg deixou a sociedade em março deste ano, ao vender sua participação para Lemann em um acordo cujos termos são guardados a sete chaves e que vinha sendo negociado desde o fim de 2023.
Assim como a sua saída da JFL, a nova empreitada da Burg só agora ganha ares oficiais. Ela antecipou com exclusividade ao NeoFeed o lançamento da Antonella, empresa que atuará na consultoria, concepção, desenvolvimento e operação de ativos residenciais de alto padrão para locação.
“Se pensarmos só na operação, estamos no mesmo segmento, mas a ideia não é competir com a JFL”, diz Burg. “Havia uma questão de ser vanguardista de novo e olhar outras coisas. Esse mercado está se desenvolvendo, tem vários entrantes, formatos sendo testados e espaço para todo mundo.”
Ela não está sozinha nessa nova etapa. Gestora criada por Gabriel Sidi, um dos fundadores da Domo Invest, a EXT Capital terá uma fatia minoritária, não revelada, na Antonella, que já nasce com uma carteira de projetos com um Valor Geral de Vendas (VGV) de cerca de R$ 650 milhões.
Com esse montante já na largada, a Antonella parte de um modelo para encurtar seu caminho e driblar dois dos principais desafios do multifamily no Brasil, dado que o mercado é relativamente novo no País: o funding para os projetos e o número ainda baixo de ativos concebidos especificamente para renda.
Para efeito de comparação, nos Estados Unidos, país em que esse conceito é mais difundido, dados da consultoria CBRE mostram que, apenas em 2024, serão entregues 440 mil unidades voltadas a esse formato.
Nesse cenário, muitos players de multifamily têm investido em projetos greenfield no Brasil, caso da própria JFL. Mas, a partir de questões como as mudanças no Plano Diretor em São Paulo, que abrem caminho para projetos de uso misto, a perspectiva é de que outros atores avancem nesse espaço.
“A Antonella vai ser mais focada no asset light, na concepção, na curadoria e na operação em si, e não em estar 100% imobilizada no carrego do ativo”, diz Burg. Segundo ela, a aposta é trazer inteligência, know how imobiliário e “cabeça de renda” a esses empreendimentos.
Ao mesmo tempo, a empresa não descarta ter fatias minoritárias em Sociedades de Propósito Específico (SPEs) ou cotas em fundos ligados a determinados projetos. “A ideia é que a Antonella esteja alinhada com a valorização do ativo, seja como sócia direta ou com uma participação desse ganho.”
Nessa proposta, a companhia, diferentemente do antigo CNPJ de Burg, foca o que ela chama de “multi-desenvolvedores” e “multi-investidores”. E já está batendo na porta de investidores institucionais donos de imóveis inteiros e de incorporadoras dispostas a testar e explorar esse formato.
No forno
Com essa orientação e a pegada mantida no long stay, a carteira de cerca de R$ 650 milhões já dentro da “casa” da Antonella inclui cinco projetos em diferentes fases de desenvolvimento e com diferentes parceiros. Esses ativos somam aproximadamente 350 unidades e 25 mil metros quadrados.
Previsto para entrar em operação entre o fim de 2024 e o início de 2025, o primeiro deles terá 47 unidades, com uma, duas e três suítes. O empreendimento é fruto de uma parceria com a construtora e incorporadora Tael e está localizado na Alameda Campinas, na região do Jardins, em São Paulo.
Os ativos restantes ilustram o foco da empresa nas áreas nobres da capital paulista. Há outro projeto no Jardins, além de empreendimentos nos bairros da Vila Olímpia, Higienópolis e Pinheiros, com previsão de início das operações, a cargo da Antonella, entre o primeiro trimestre e o segundo semestre de 2025.
As unidades variam de 45 a 110 metros quadrados. Como é próprio do modelo, a Antonella fará a gestão dos ativos no dia a dia, a partir da oferta combinada de apartamentos 100% mobiliados – de móveis a talheres – com serviços e opções como limpeza, lavanderia e quadras de squash, entre outros.
A empresa também já mantém negociações para outros projetos. Entre eles, um complexo multiuso que será instalado no bairro de Pinheiros e que deve entrar em operação entre 2027 e 2028. Com o que já tem no radar, a meta é chegar a um portfólio de, no mínimo, 43 mil metros quadrados em três anos.
No percurso para superar essa meta e tendo como motor esse modelo mais asset light, Burg avalia a possibilidade de estender, no médio prazo, o mapa de operações da companhia a outras capitais do País.
Ela também não descarta que a Antonella abrigue outras marcas sob o seu guarda-chuva. Essa opção pode ser adotada em ativos que diferem do perfil que compõe a tese de alta renda da empresa, em casos, por exemplo, em uma operação própria de multifamily de alguma incorporadora.
Com diferentes formatos, outras empresas estão unindo forças para ganhar terreno nesse segmento no Brasil. Uma delas é a Greystar, gigante americana de real estate que desembarcou no País em 2023, em uma parceria com o Canada Pension Plan Investment Board (CPPIB) e as incorporadoras Cyrela e SKR.
Outra gigante de real estate de olho nesse filão é a Brookfield. A gestora canadense começou a investir em multifamily no mercado brasileiro em 2021, com foco na média renda e por meio de parcerias com a MRV e a Luggo, empresa de locação residencial da família Menin.
Há mais nomes reforçando esse interesse. Entre eles, a Vila 11, fundada por Ricardo Lahan, ex-Brookfield, e que conta com o apoio do fundo americano Evergreen, e a JHSF, com a JHSF Residences, com condomínios de casas voltadas para locação e o público de alta renda.
Já na direção da escala, existem outros formatos que investem na locação e na gestão individual de apartamentos e não de ativos inteiros, em um modelo mais distante do conceito tradicional de multifamily e associado a plataformas como o Airbnb.
Esse pacote inclui players como Charlie, Taba e 360. Quem também nasceu com essa tese, mas começou a testar a migração para o modelo de operação de ativos inteiros é a Yuca, proptech que já atraiu investidores como ONEVC, Foundation Capital, Tishman Speyer, Monashees e Terracotta Ventures.