As montadoras chinesas de veículos elétricos (EV), que este ano superaram rivais estrangeiros e chegaram ao topo do ranking de vendas no país, estão sofrendo prejuízos em outra frente de investimentos que fizeram nos últimos dois anos: a produção de modelos elétricos com alta tecnologia embarcada em parcerias com as big techs chinesas.

Novas “regras burocráticas” de fabricação de automóveis impostas pelo Ministério da Indústria e Tecnologia da Informação (MIIT) da China estão atrasando o cronograma de lançamentos de modelos elétricos fruto de joint venture de montadoras com a gigante de buscas Baidu, com a fabricante de smartphones Xiaomi e com o grupo de transporte por aplicativo Didi, entre outros.

Até agosto, apenas duas autorizações de novos modelos foram expedidas pelo MIIT. O Projeto Da Vinci da Didi (dona da 99) e a nova fábrica da Xiaomi nos arredores de Pequim, por exemplo, ainda não receberam a aprovação do governo para a produção de veículos - e os motivos são desconhecidos, pelo menos oficialmente.

Especialistas do mercado automotivo chinês apontam algumas razões do que pode estar atrasando os projetos. Em alguns casos, a mudança brusca na formatação de joint venture, dando a uma montadora maior participação que a empresa tech na parceria, ajudou a acelerar a autorização para a produção – sinal de que o governo desaprova a investida das big techs na indústria de carros elétricos.

Uma série de falhas de novos modelos, que deixaram os clientes reclamando de possuir veículos que não podiam ser reparados, também foi citado.

Como até montadoras líderes de veículos elétricos também estão presas no processo de aprovação, analistas passaram a desconfiar de uma manobra do governo chinês para conter superprodução da indústria de carros elétricos do país - a China teria capacidade produzir 40 milhões de veículos por ano, mas a demanda doméstica não passa de 25 milhões.

Todos as possíveis razões citadas ocorreram. A  montadora Nio, listada na Nasdaq, por exemplo, não fez parcerias com big techs chinesas. Mas a fábrica que assumiu na cidade de Chuzhou no início deste ano para fabricar carros para sua submarca econômica Firefly continua parada. Outra montadora, a Xpeng, enfrenta o mesmo problema na unidade de Wuhan.

Reembolso

O caso da startup Niutron é ainda mais enigmático. Fundada em 2018 pelo ex-vice-presidente da Huawei, Li Yinan, a empresa avançou em outubro do ano passado com o lançamento do crossover NV - um híbrido plug-in capaz de cobrir uma autonomia de até 1.257 quilômetros, com participação minoritária da montadora Dorcen.

No entanto, a Niutron não conseguiu cumprir seus compromissos de entrega dentro do prazo previsto, sendo obrigada a reembolsar 24 mil clientes dois meses depois.

Em junho, a Dorcen recebeu a aprovação do MIIT para lançar um SUV que se parece muito com o carro da Niutron, mas sem usar sua marca. Dois ex-funcionários disseram que a Niutron continuou envolvida como fornecedora, mas não poderia ter seu nome no carro.

O Jidu, braço de veículos elétricos da gigante de buscas Baidu, também atrasou o lançamento Robo-01, um SUV, apesar das promessas de que as entregas começariam no terceiro trimestre de 2022.

O grupo de pesquisa fez parceria com a montadora Geely (uma das maiores da China, dona das marcas Volvo e Aston Martin) para criar a Jidu em 2021, com a Baidu detendo uma participação majoritária. Os dois grupos investiram US$ 1,4 bilhão no projeto.

Na semana passada, Geely e a Baidu anunciaram outro modelo de veículo elétrico sob uma nova marca, chamada Ji Yue. O primeiro modelo da Ji Yue se chama 01, que é a versão de produção do conceito Jidu Robo-01, revelado em junho de 2022.

Embora o interior do veículo ainda não tenha sido revelado, o exterior do 01 parece quase idêntico ao Robo-01.

Em meio a questionamentos de as duas empresas terem anunciado uma nova marca sem ter lançado a anterior, o Robo-01, a dúvida foi desfeita com a confirmação de que a joint venture, desta vez, terá participação majoritária da Geely (65%), com os 35% restantes para a Baidu.