A Motiva Trilhos está em processo de transformar áreas ociosas de pátios de manutenção e terrenos subutilizados ao redor de estações de trem e metrô em shoppings, edifícios residenciais e até arenas para shows.
O braço de transporte de passageiros da antiga CCR identificou 500 mil metros quadrados de áreas privilegiadas sobre trilhos (ou no entorno) espalhadas por São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia. E mais de 90% desses espaços estão na capital paulista, onde cada metro quadrado vale ouro - algo que muitas empresas imobiliárias desejam.
"Temos terrenos que vieram das concessões, além de pátios de manutenção e as próprias linhas. O que estamos olhando é a vocação de cada uma dessas áreas disponíveis e o que faz mais sentido construir", diz Márcio Hannas, CEO da Motiva Trilhos, ao NeoFeed.
A empresa, que responde por 27% do faturamento da Motiva e opera as linhas 8 e 9 de trem (pela ViaMobilidade), 4 (por meio da ViaQuatro) e 5 (ViaMobilidade) do metrô em São Paulo, o VLT do Rio e o Metrô da Bahia, encontrou no real estate uma nova fonte de receita.
A ideia é que o segmento imobiliário, que integra a vertical de receitas acessórias da holding, represente 8% da receita total da Motiva, que no ano passado foi de R$ 4,1 bilhões.
Em cinco anos, a projeção é que o faturamento com serviços (desconsiderado as passagens) chegue a R$ 400 milhões. No ano passado, esse segmento alcançou R$ 130 milhões e a expectativa é fechar 2025 com R$ 200 milhões.
Para chegar a esses números, a companhia elaborou um modelo de negócio engenhoso. Em vez de vender os empreendimentos, a Motiva Trilhos vai construir e alugar.
"Nossa intenção não é operar essas áreas e sim nos aliarmos a parceiros que tenham experiência nesses mercados. A nossa receita virá do aluguel", diz o CEO.
A empresa pode participar do equity das construções através de SPEs (Sociedades de Propósito Específico) junto com construtoras parceiras, alugando áreas de sua concessão.
A decisão do empreendimento que será implementado em cada local vai levar em conta o perfil da região. No entorno da estação Presidente Altino, em Osasco, por exemplo, a localização é estratégica e a maior possibilidade é a construção de um galpão logístico.
Na Marginal Pinheiros, por onde passa a linha 9, a hipótese principal é de construir edifícios residenciais. “Há bons espaços nessa linha. E estamos falando de áreas nobres, onde estão estações como Pinheiros, Vila Olímpia e Hebraica-Rebouças.”
Na área da linha 5 do Metrô, o que está em planejamento, segundo o presidente da Motiva Trilhos, é a construção de um shopping no entorno da estação Capão Redondo, na Zona Sul de São Paulo.
Uma das ideias em estudo é de construir em cima das próprias estações, a exemplo de modelos bem-sucedidos no exterior. “Eventualmente, poderíamos verticalizar esses espaços e fazer obras em cima das estações e das linhas férreas de São Paulo”, diz o CEO.
“Temos exemplos de outros países, em que são erguidas plataformas para fazer esses empreendimentos e o trem passa por um túnel”, complementa.
Também está nos planos a construção de uma arena para realização de shows, mas, por ser uma decisão estratégica, Hannas ainda não pode dividir a localização.
Com 20,1 quilômetros de extensão e 17 estações em operação, a linha vai do bairro da periferia até Chácara Klabin, na Vila Mariana. Ao todo, a Motiva Trilhos controla 189 quilômetros de malha ferroviária no País.
Segurança jurídica
Enquanto os projetos (e eventuais parcerias) estão em fase de finalização para o início das construções começar em 2026, a próxima trilha a ser vencida é a da segurança jurídica para o investimento de construtoras e incorporadoras.
A empresa, segundo Hannas, tem avançado em negociações com o governo do Estado de São Paulo para assegurar que, mesmo com o fim do prazo de concessão, esses espaços permaneçam no controle de quem construiu.
Segundo a companhia, a concessão das linhas 4 e 5 do Metrô termina em 2038. Já o prazo das linhas 8 e 9 da CPTM termina em 2052.
“O investidor, quando faz o plano de negócios, deve considerar que, com o fim da concessão, ele poderia perder o empreendimento, que passa para a mão do concedente”, diz o CEO da Motiva Trilhos.
“Já há precedentes do Estado, na área de aeroportos, de contratos que ultrapassam esse período. Estamos buscando essa regulamentação específica em São Paulo. Queremos levar casos concretos, já com os parceiros, para mostrar que é viável”, complementa.
Naming Rights
Outro plano para gerar receita extra para o grupo é avançar em contratos de naming rights. Na Via 4 do metrô de São Paulo, a companhia fechou um contrato há dois anos, com validade até 2028, para a rede varejista Pernambucanas ter sua marca associada à estação Paulista.
“Agora, estamos com três em fase de aprovação, para sair nas próximas semanas. Só falta a autorização do poder concedente”, diz Hannas.
Serão duas na linha 9 e uma na 8. Além dessas, a Motiva Trilhos fechou recentemente contrato com a Casas Bahia, que vai rebatizar a estação Berrini, na linha 9.
Dependendo do fluxo e do perfil do passageiro, um contrato de naming right pode variar entre R$ 1 milhão e R$ 3 milhões por ano para a Motiva Trilhos.
No primeiro trimestre de 2025, a Motiva Trilhos registrou crescimento de 3,3% no volume de passageiros, com 181,7 milhões de pessoas transportadas. O Ebitda do segmento ferroviário, entre janeiro e março, foi de R$ 585 milhões, alta de 22,5% sobre o período de 2024, o maior entre todos as unidades da Motiva.
No total, a plataforma ferroviária responde hoje por 21% do Ebitda ajustado da matriz. O setor rodoviário corresponde a 67%, e o de aeroportos, 12%.
Em fevereiro deste ano, a empresa encerrou a operação do contrato de barcas no Rio de Janeiro, que era deficitário. “Ele gerava uma perda em torno de R$ 200 milhões por ano. Isso também traz um alívio para a plataforma de trilhos.”
O futuro nos trilhos
Recentemente, a Motiva anunciou a intenção de iniciar um plano de desinvestimentos dos 17 aeroportos em que atua como concessionária. Com isso, a participação do setor ferroviário deve ficar ainda mais representativa.
“A ideia desse desinvestimento é em focar em rodovias e trilhos, com novos projetos e mais concessões. Caso essa estratégia seja bem-sucedida, certamente esse dinheiro será reinvestido nessas áreas”, diz Hannas.
Na quinta-feira, 29 de maio, a companhia divulgou fato relevante em que informa a assinatura de um aditivo para investimentos adicionais de R$ 1 bilhão nas linhas 8 e 9, utilizados na padronização da sinalização ferroviária, além de estudos para implementação de um viaduto entre as estações Ceasa, da linha 9, e Imperatriz Leopoldina, da linha 8.
No primeiro trimestre de 2026, a Motiva Trilhos deve receber do Estado o controle da concessão da linha 17, no formato monotrilho, que integra o contrato de concessão da linha 5.
A empresa também iniciará no segundo semestre deste ano a obra de extensão da linha 4, com mais duas estações, e que chegará a Taboão da Serra. Também com mais duas estações, as obras da linha 5, que vai chegar até o Jardim Ângela, começam no ano que vem.
A Motiva registrou receita consolidada de R$ 3,7 bilhões no primeiro trimestre. No acumulado de 2025, as ações da companhia registram valorização de 34,7%. A empresa tem valor de mercado de R$ 27,6 bilhões.