Em mais um trimestre marcado pela disparada da inadimplência no agronegócio, o Banco do Brasil registrou lucro líquido ajustado de R$ 3,8 bilhões no terceiro trimestre de 2025, uma queda de cerca de 60,2% em relação ao mesmo período do ano passado. No acumulado dos nove primeiros meses do ano, o resultado também refletiu a piora da carteira: o lucro somou R$ 14,9 bilhões, retração de 47,2% na comparação anual.
O resultado foi altamente impactado pelo aumento das provisões. No trimestre, ficou em R$ 17,9 bilhões o custo de crédito do banco, formado pelas despesas de perda esperada com descontos concedidos e deduzidas das receitas com recuperação de crédito.
O montante foi 12,7% maior frente ao segundo trimestre, e chegou a R$ 44 bilhões no acumulado do ano — um salto de 66% em 12 meses. O aumento foi influenciado tanto pelo agronegócio quanto ao agravamento de problemas associados a crédito para grandes empresas.
O índice de cobertura, que é o quanto das perdas potenciais está coberto pelas provisões, terminou o trimestre em 165,9%, 7,9 pontos percentuais abaixo do registrado no trimestre anterior.
Diante desse cenário, o Banco do Brasil revisou novamente o seu guidance para 2025. A projeção de lucro líquido ajustado, que antes apontava para um intervalo mais alto, foi reduzida para uma faixa entre R$ 18 bilhões e R$ 21 bilhões.
Já o custo do crédito – linha mais pressionada pelo aumento da inadimplência no agronegócio e por casos específicos de grandes empresas – passou a ser estimado entre R$ 59 bilhões e R$ 62 bilhões no ano.
“No trimestre passado eu disse que o guidance de lucro era ousado, dado o andamento do ano. Agora, com a necessidade de provisões adicionais, ajustamos [a projeção de lucro”, afirmou Tarciana Medeiros, CEO do Banco do Brasil, em teleconferência. “Houve um compasso de espera do produtor na regulamentação da MP 1314, o que elevou as provisões.”
Principal detrator do resultado do banco, a inadimplência acima de 90 dias do agronegócio atingiu 5,34%, uma alta de 185 pontos-base em relação ao trimestre anterior. A deterioração ficou concentrada na cultura da soja e nas regiões Centro-Oeste e Sul, em um ambiente marcado pela escalada dos pedidos de recuperação judicial de produtores rurais.
No mercado, desconfiança
Esses pontos acenderam o alerta em parte do mercado, com analistas revendo as projeções para o banco. Após o resultado, o Citi rebaixou as ações do BB de “compra” para “neutro”, com recuo do preço-alvo de R$ 29 para R$ 23. O downgrade ocorre dois meses após os analistas terem dado "compra" para o BB.
As ações do banco recuavam cerca de 2,85% na tarde de quinta-feira, 13, negociadas a R$ 22,15.
“É histórico, nós nunca tínhamos enfrentado uma situação como essa; a última vez foi ali nos idos de 94”, disse Geovanne Tobias, CFO do Banco do Brasil, na call com analistas. Naquela época, recorda o executivo, um aumento de capital foi necessário para equalizar as contas do banco.
Desta vez, porém, o banco tem recorrido a outra estratégia. Em vez de um reforço de capital, o BB aposta na combinação de provisões mais robustas com a força-tarefa de renegociação criada após a MP 1.314, que autorizou condições especiais para reestruturar dívidas de produtores rurais.
O programa interno — batizado de BB Regularizar Agro — permite alongar prazos, reforçar garantias e reclassificar operações com base na capacidade de pagamento, ajudando a conter o avanço da inadimplência e a transformar parte das perdas esperadas em crédito tributário, o que alivia a pressão sobre o capital regulatório.
Segundo Tobias, o programa já mostra sinais de avanço. Até o fim do terceiro trimestre, o banco havia analisado cerca de R$ 11 bilhões em pedidos de renegociação, com aproximadamente R$ 5,4 bilhões já aprovados, após reforço de garantias e reavaliação da capacidade de pagamento dos produtores.
A instituição abordou mais de 70% dos clientes enquadrados no programa e projeta chegar a algo próximo de R$ 24 bilhões em propostas de reestruturação da dívida dentro da MP 1.314, à medida que os contratos forem revisados individualmente nos próximos meses.
Nessa estrutura, os contratos podem ser alongados por até nove anos, com um ano de carência — período em que os produtores continuam pagando juros — e passam por uma reoriginação completa, que inclui revisão detalhada da capacidade de pagamento e reforço de garantias.
Entre as garantias, o BB tem exigido alienação fiduciária de imóveis rurais, estoques, máquinas, além de priorizar operações com taxas pós-fixadas, atreladas ao CDI, para preservar o equilíbrio de risco e retorno.
Em paralelo, o banco destaca que essas reestruturações permitem reconhecer parte das perdas esperadas e transformá-las em crédito tributário (DTA), mecanismo que fortalece o capital regulatório sem necessidade de um aporte acionário
Durante a teleconferência, analistas também demonstraram preocupação com o horizonte de alongamento dessas dívidas. O receio é de que a normalização do risco leve mais tempo do que o banco sugere, especialmente porque o índice de cobertura caiu mesmo após novas provisões, sinalizando que a deterioração da carteira ainda não foi estancada.
Em relatório, o Citi resumiu essa percepção ao afirmar que “os efeitos positivos das renegociações devem levar mais tempo que o esperado para contribuir à lucratividade, enquanto novos créditos inadimplentes continuam acelerando apesar das provisões”.
A própria direção do Banco do Brasil admite que o cenário ainda deve se deteriorar antes de melhorar. “O banco esperava que a inadimplência do agro começasse a estabilizar, mas outubro ainda trouxe pressão relevante”, afirmou o CFO do BB.
Com a solução estruturada da MP 1.314 já operacional e um fluxo menor de vencimentos no fim do ano, a expectativa da administração é que o ponto de inflexão ocorra apenas a partir do primeiro trimestre de 2026.