Nas fotografias de Sebastião Salgado que compõem o livro "Amazônia", há uma imagem de nuvens densas, quase palpáveis, que pairam sobre a imensidão verde da floresta. Chamados de rios voadores, essas massas de vapor d'água que são lançadas na atmosfera para viajar milhares de quilômetros foram a inspiração da nova gestora que nasce dentro da eB Capital.
A Flying Rivers Capital é um split da vertical eB Clima, que lançou o seu primeiro fundo há cinco anos e já captou e alocou mais de R$ 1 bilhão em seis empresas comprometidas com a transição para uma economia de baixo carbono.
O movimento da eB Capital com a Flying Rivers é semelhante ao de outras gestoras globais como a TPG, que criou a The Rise Climate; a Partners Group com a PG Life; e a General Atlantic com a Beyond Net Zero, que detém 12 ativos e US$ 2,4 bilhões investidos.
“Todas as grandes gestoras relevantes criaram unidades segregadas com suas culturas próprias e com um olhar para ESG de forma muito profunda", diz Luciana Antonini Ribeiro, fundadora e CEO da Flying Rivers Capital, ao NeoFeed.
A nova gestora terá marca, identidade e cultura próprias, mas, assim como aconteceu nesses modelos internacionais, vai manter vínculos estreitos com a eB Capital, que segue como sócia e respaldo institucional.
Além de Ribeiro e da eB Capital, Renan Pereira Henrique, que desde 2021 é o responsável por mapear novos negócios e acompanhar as empresas investidas na vertical eB Clima, entra para o quadro de sócios da nova gestora.
“A evolução desse tema exige um novo formato independente e especializado e a Luciana reúne todas as credenciais para conduzir esse passo”, diz Eduardo Sirotsky Melzer, fundador e CEO da eB Capital.
“Essa é a consolidação de um time experiente, com visão global e capacidade de execução. Estou certo de que a nova casa vai liderar o mercado de investimento climático no Brasil e na América Latina”, completa Marcelo Claure, sócio da eB Capital.
Em paralelo ao lançamento de uma gestora focada em clima, a eB Capital tem focado, cada vez mais, em soluções de capital, como operações estruturadas e crédito, o que praticamente dobrou o tamanho da gestora, que chegou a cerca de R$ 9 bilhões sob gestão
Os atuais fundos captados na vertical eB Clima, bem como os demais veículos de investimentos estruturados pela eB Capital, seguem sendo geridos pelos mesmos times de gestão e alocação de capital. Novos fundos estão em estruturação – os detalhes ainda não podem ser revelados.
Se o primeiro fundo contou com forte presença de investidores brasileiros, tanto institucionais como family offices, a projeção para os próximos veículos é de uma participação expressiva de investidores estrangeiros que, segundo Ribeiro, "entendem de clima e entendem a oportunidade que o Brasil oferece".
Frente de atuação
A Flying Rivers Capital vai concentrar sua atuação em três grandes frentes, todas conectadas pelo objetivo central de descarbonização da economia: a transição energética, ou seja, novas fontes de energia, com destaque para biocombustíveis; a cadeia alimentar, com foco em tornar o agronegócio mais produtivo e eficiente com as melhores práticas de sustentabilidade; e economia circular e cadeias de suprimento, para o melhor aproveitamento de resíduos aos minerais críticos necessários para a transição energética.
O track record da gestora tem a Cirklo como exemplo. Criada a partir da fusão das operações da Green PCR e da Global Pet em setembro do ano passado, a plataforma de reciclagem de garrafas PET está perto de R$ 1 bilhão de faturamento.
No início de outubro deste ano, a recicladora, em parceria com a Solar Coca-Cola, uma das fabricantes do refrigerante no País, anunciou o investimento de R$ 20 milhões em uma nova fábrica de reciclagem em Ananindeua, no Pará.
Esse movimento está em linha com a nova regulamentação de uso progressivo de resina reciclada em embalagens plásticas no Brasil. Na terça-feira, 21 de outubro, o governo instituiu o sistema de logística reversa sob a responsabilidade dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes.
Outra investida da gestora é a Bioo, uma plataforma criada com a Sibigás Cótica para produzir biometano a partir de resíduos agroindustriais e orgânicos e injetar esse biogás na rede da Sulgás.
O projeto nasceu com todas as pontas contratadas – da biomassa (resíduos da agroindústria) ao off-take. Além do biometano, a operação gera CO₂ para a indústria alimentícia e biofertilizante, aproveitando 100% dos resíduos. A primeira fábrica na cidade gaúcha de Triunfo foi inaugurada há um mês e outros duas estão em fase final de
Questão de timing
Às vésperas da COP 30 em Belém, o timing parece perfeito para a segregação dos negócios. Mas não é só por esse motivo. Nos últimos 24 meses, o Brasil aprovou marcos regulatórios fundamentais para a agenda climática, como o Marco do Carbono, a Lei do Combustível do Futuro e, mais recentemente, o decreto sobre plásticos reciclados.
"O Brasil se posicionou como um país que entende a temática de clima como uma vantagem competitiva de país", afirma Ribeiro.
A CEO da Flying Rivers também destaca instrumentos financeiros que amadureceram o ecossistema, como o Ecoinvest, uma iniciativa do Tesouro Nacional com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que combinam operações de blended finance com proteção cambial, o que reduz custos de capital para quem atua com sustentabilidade, além de reduzir os riscos para investidores estrangeiros.
"Quando você soma as condições institucionais brasileiras ao fato de que o Brasil tem energia renovável aos montes, é o país do agronegócio com práticas sustentáveis, tem minerais críticos, capacidade de produção com emissão de carbono mais baixa, somos, talvez globalmente, o país melhor posicionado para atuar nessa temática de clima", diz ela.
O Brasil lidera os investimentos em clima na América Latina, mas ainda recebe menos de 4% do capital global em climate techs. O mercado de climate tech na América Latina movimentou mais de US$ 3,4 bilhões entre 2015 e 2024. Segundo a BloombergNEF, o País precisará de mais de US$ 1,3 trilhão entre 2024 e 2050 para ampliar o fornecimento de energia de baixo carbono.