Dois anos depois de abrir espaço em seu portfólio de R$ 5 bilhões de ativos sob gestão para a reciclagem de plásticos, a partir das compras da Green PCR e da Global Pet, a eB Capital está avançando no plano de criar uma plataforma de economia circular. E terá companhia nesse novo ciclo do projeto.

Quem está embarcando nessa tese da gestora brasileira é a Circulate Capital, fundo global de impacto especializado em economia circular que está investindo na Cirklo, marca que passará a reunir os ativos da Green PCR e da Global Pet. As informações foram antecipadas com exclusividade ao NeoFeed.

Parte de um plano da Circulate Capital de destinar US$ 70 milhões para iniciativas dessa cadeia na América Latina e no Caribe, o aporte não teve seu valor divulgado. Assim como a fatia minoritária que o fundo vai deter na nova companhia, que seguirá tendo a eB Capital como controladora.

“Nós avançamos muito, pois encontramos empresas que já estavam no caminho certo”, diz Luciana Antonini Ribeiro, sócia e cofundadora da eB Capital. “Tanto que conseguimos atrair a Circulate. Os investidores por trás deles não deixam dúvida sobre o calibre e a relevância do fundo.”

Com US$ 257 milhões em ativos sob gestão e um portfólio de 17 empresas, em mais de 10 países, a Circulate Capital traz em seu cartão de visitas investidores como PepsiCo e Chanel.

Antes centrado no sudeste asiático e na Índia, o fundo passou a olhar com mais atenção para a América Latina e o Caribe em 2023. E o cheque de US$ 70 milhões para a região também foi “endossado” por grandes empresas globais.

Essa relação inclui Danone, Unilever, Dow, Mondelez, Chevron Phillips Chemical e o IDB Lab, braço de inovação do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O primeiro aporte na região veio em julho deste ano, na colombiana Polyrec.

“Nossos investidores estão todos sentados na mesma mesa tentando capturar o máximo de plástico que puderem”, diz Ernesto Hanhausen, investment partner da Circulate Capital. “Somos capazes de trazer capital para fazer isso acontecer.”

Alguns fatores estão colocando esses pesos-pesados lado a lado. No principal deles, muitas dessas gigantes têm estabelecido metas globais de uso de plástico reciclado em suas embalagens, seja por pressão dos consumidores, de investidores ou de legislações.

“Parte dessas grandes marcas estabeleceu índices de 25% a 50% de plástico reciclado e são metas de curto prazo. Algumas começam a se tornar realidade já em 2025”, diz Ribeiro. “E elas são globais, mas precisam ser cumpridas país a país. Não adianta reciclar muito na Suíça e não reciclar no Brasil.”

No recorte brasileiro, essa demanda já se reflete em R$ 9,1 bilhões movimentados anualmente com a reciclagem de plásticos, segundo a consultoria MaxiQuim. O estudo projeta que o segmento pode ser de três a cinco vezes maior nos próximos dez anos.

“Hoje, o mercado brasileiro recicla cerca de 7% do plástico”, afirma Ribeiro. “Se temos empresas globais que pretendem reciclar, em média, 30%, imagine o tamanho do mercado potencial. É enorme.”

Nesse contexto, a Circulate Capital também vê no Brasil uma grande oportunidade para reduzir a lacuna entre a demanda reprimida crescente e a oferta ainda baixa de plásticos para reciclagem.

“O Brasil vai ser muito significativo para nós. Esse investimento é certamente o mais importante que já fizemos”, diz Hanhausen. “Sabíamos que precisávamos participar com alguém que fosse realmente capaz de gerar escala e a Cirklo nos permite começar e seguir expandindo com grandes volumes.”

Integração

A soma das operações da Green PCR e da Global Pet ajuda a entender esse interesse. Centradas na reciclagem do polietilenotereflato, o popular PET, e com fábricas em São Carlos (SP) e Conde (PB), as empresas têm uma capacidade de reciclar 4 bilhões de garrafas desse material por ano.

Essa equação não se limita ao volume. As duas companhias dominam o conceito conhecido como bottle to bottle. O formato inclui um ciclo que se inicia na compra de garrafas descartadas, que passam por etapas como seleção, lavagem, moagem, transformação em flocos e, posteriormente, em grãos.

O material é reutilizado em embalagens, inclusive de alimentos. Com esse modelo, Green PCR e Global Pet faturaram, juntas, R$ 700 milhões nos últimos 12 meses. Suas carteiras incluem, entre outros clientes, investidores da Circulate, como Danone, Unilever, Mondelez, Dow e Chevron Phillips Chemical.

Parte da evolução para chegar a esses indicadores veio dos aportes feitos pela eB Capital em maquinário nos dois últimos anos. A integração das duas operações, agora rebatizadas como Cirklo, também já vinha em curso antes da chegada do fundo.

Até aqui, a companhia já integrou o departamento financeiro e outras estruturas no backoffice. As próximas etapas vão envolver a produção e áreas como compras e os times comerciais. A projeção é concluir toda a unificação entre o fim do ano e primeiro trimestre de 2025.

Como parte desse trabalho, ainda não há uma definição de quem será o CEO da Cirklo. Já no conselho de administração da nova companhia, a divisão dos assentos prevê três posições para a eB Capital e uma cadeira para a Circulate Capital, além de dois membros independentes.

Luciana Antonini Ribeiro, sócia e cofundadora da eB Capital

Em paralelo, os sócios já começam a traçar planos a quatro mãos. “Como já fizemos boa parte da expansão industrial que programamos, o próximo passo da Cirklo é aumentar ainda mais o volume”, diz Ribeiro. “Aqui, o grande desafio é ampliar a cadeia de fornecedores.”

Uma das alternativas em avaliação é dar mais capilaridade à operação com o investimento em hubs de consolidação de matéria-prima. Hoje, essas atividades estão concentradas nas duas unidades da Green PCR e da Global Pet.

“As garrafas que não são recicladas estão em regiões mais remotas, que exigem uma logística maior e onde a equação econômica começa a não parar de pé”, diz Renan Pereira Henrique, sócio da eB Capital. “Hubs mais pulverizados nos colocam mais perto do catador e permitem reduzir o custo do frete.”

Com o estudo de viabilidade ainda em fase inicial, ele aponta a região Norte como um dos possíveis destinos dessa expansão, que pode resultar num um pacote de 10 a 15 hubs. E destaca outra questão que também ganha força com a nova sócia.

“O PET ainda é o grande vencedor na reciclagem de plásticos”, afirma. “Mas é nosso papel avaliar, de tempos em tempos, outros polímeros e tecnologias que possam se tornar mais disruptivas. E a Circulate traz o viés de olhar para alternativas no mundo inteiro.”

Com a meta estabelecida junto à eB Capital de destinar mais de 1,3 milhão de toneladas de plástico para reciclagem no prazo de dez anos, a Circulate Capital também enxerga vantagens nesse intercâmbio.

“Investimos em 17 empresas e estamos trazendo conhecimento para cá”, afirma Hanhausen. “Mas o Brasil, em particular, é bem mais avançado em termos de reciclagem do que muitos desses países. E também tem muito a nos ensinar.”