A China está ganhando terreno no Brasil com carros, celulares, comércio eletrônico, moda e infraestrutura, áreas em que têm feito investimentos pesados. Mas nunca avançou em software. Uma primeira tentativa de progredir nessa área, em que é uma potência em inteligência artificial, está começando a dar os primeiros passos por aqui.

A Bytedance fechou uma parceria com a IEST, uma consultoria fundada por Tian Bin e que tem como sócio In Hsieh, para trazer o Lark, o superapp corporativo da dona da TikTok, para o Brasil.

A IEST está por trás das principais empresas asiáticas que começaram a operar no Brasil nos últimos anos, como Shein, BYD, AliExpress, Garena e tantas outras. Mas, agora, está começando a desenvolver parcerias mais estratégicas para operar os negócios. “Estamos montando a estratégia para comercializar o software no Brasil”, diz Bin, ao NeoFeed.

O Lark, que significa cotovia e tem um pássaro como símbolo, é uma espécie de canivete suíço digital que substitui diversas aplicações que são populares nos países do Ocidente. Ele reúne em um único lugar recursos de diversos aplicativos, como Slack, ClickUp, Monday, Trello, Zoom, Google Workplace, Microsoft Office e Teams, Calendly, Notion, Confluence e Airtable.

Neste momento, o plano da IEST é oferecer a ferramenta para empresas chinesas que estão instaladas no Brasil. Mas a intenção é, aos poucos, buscar clientes fora desse universo e competir em mar aberto. Há negociações avançadas com algumas empresas, que seriam os primeiros clientes locais.

Essa é a mais nova incursão da Bytedance no Brasil, que é o terceiro país com mais usuários ativos do TikTok, atrás de Estados Unidos e Indonésia, segundo dados da DataReportal do início de 2024. Avaliada em US$ 225 bilhões, a Bytedance é a empresa privada mais valiosa do mundo, à frente da SpaceX, a empresa de foguetes de Elon Musk.

Seu faturamento somou US$ 73 bilhões no terceiro trimestre de 2024, quase o mesmo patamar da Meta, a dona do Facebook, Instagram e WhatsApp, cujas receitas foram de US$ 75,5 bilhões no mesmo período. Mas a Bytedance está crescendo em uma velocidade maior do que a empresa de Mark Zuckerberg, um sinal de que deverá ultrapassá-la em breve.

O superapp Lark, que está em mais de 150 países, ainda é uma operação “minúscula” se comparada com a receita total da Bytedance. Mas seus números não são irrelevantes – e fariam inveja para muitas empresas de SaaS (Software as a Service). Neste ano, a plataforma deve ultrapassar os US$ 300 milhões em receita anual recorrente, um salto de 50% em relação a 2023, de acordo com David Xie, o CEO da Lark.

Na China, a ferramenta é gratuita para até 50 usuários – um número baixo para a maioria das empresas chinesas. Mas isso deve ser revisto no Brasil. Até porque o alvo é conquistar pequenas e médias empresas com o superaplicativo. “Quero chegar a 500 mil usuários no ano que vem”, diz Bin.

O apelo que deverá ser usado para convencer os brasileiros é o fato de que a plataforma pode substituir diversas aplicações que são pagas. Além disso, a equipe da IEST está “tropicalizando” o aplicativo, que já tem uma versão traduzida para o português.

“Ela está integrado com soluções de comércio eletrônico”, diz Lucas Peng, COO da IEST. “E estamos integrando, via API, com soluções de nota fiscal. Isso vai ajudar a criar um ecossistema mais amigável ao Lark no Brasil”.

Não será uma missão fácil. Os aplicativos chineses nunca conseguiram avançar no Brasil e no mundo. O WeChat, que era considerado o WhatsApp da China, por exemplo, nunca decolou fora da China – lá o número de usuários superava 1 bilhão de pessoas.

Mas há um esforço do próprio governo chinês de conseguir romper essa barreira. E a inteligência artificial será fundamental nessa estratégia. A China hoje é uma referência em IA e suas startups estão, em alguns casos, em estágio mais avançado do que as companhias dos Estados Unidos.

O NeoFeed apurou que outras empresas de software, que têm IA no seu core, estão começando a sondar o mercado brasileiro para montar operações.

Uma delas é a Speakly AI, uma empresa que desenvolveu um LLM (Large Language Model) próprio e incubou a Moonshot AI, uma startup chinesa que já é avaliada em US$ 2,5 bilhões e que criou o Kimi, uma espécie de ChatGPT chinês.