Ao recusar a proposta feita pela Ligga Telecom, de Nelson Tanure, que ofereceu pouco mais de R$ 1 bilhão pela unidade de clientes de fibra óptica da Oi, os credores da empresa de telefonia abriram caminho para que a V.tal, empresa de rede neutra controlada por fundos geridos pelo BTG Pactual, compre os 4,3 milhões de assinantes da Oi Fibra.

A recusa dos credores é fácil de ser entendida. A Oi, que está em recuperação judicial, queria R$ 7,3 bilhões pela unidade. A proposta da Ligga Telecom era quase 90% menor. E, caso não houvesse um comprador, a V.tal garantiu, ao aprovar a RJ, que ficaria com o ativo.

Há uma segunda rodada de propostas, o que deve acontecer no começo de agosto. Em tese, novos interessados podem surgir. Mas o NeoFeed apurou que até nos corredores do BTG Pactual já se acredita que é improvável que alguém queira comprar os clientes de fibra da Oi.

A questão que se coloca é como a V.tal, que se define como uma companhia de rede neutra, será dona de uma operação com assinantes de internet de alta velocidade, competindo com seus próprios clientes?

Desde que esse imbróglio começou, interlocutores do banco de André Esteves sinalizavam ao mercado que iriam operar no modelo de chinese wall, caso não houvesse um comprador para a Oi Fibra.

O NeoFeed apurou que o BTG já teria definido o que fazer. Os clientes de fibra da Oi vão ser separados em uma nova empresa, com um novo nome e até mesmo com um CEO e CFO diferentes da V.tal. “Será uma operação totalmente separada”, diz uma fonte que conhece os planos.

No momento, o BTG Pactual está sondando nomes para assumir essa nova empresa, já se preparando ficar com o ativo – algo que nunca foi da intenção, nem do interesse do banco, que sempre preferiu uma solução de mercado para a Oi.

A nova empresa disputará o mercado com Vivo e Claro, seus concorrentes naturais, mas também com os provedores de internet de fibra óptica independentes, como Alloha Fibra, Desktop e Vero (que se fundiu com a Americanet). A ideia é trabalhar para uma consolidação ou até mesmo uma abertura de capital mais para frente.

A V.tal, por sua vez, seguirá comandada por Amos Genish, um executivo com longa tradição no mercado de telecomunicações – ele fundou a GVT, que foi vendida para a Vivo (onde atuou como CEO), além de comandar a Telecom Italia. “A V.tal tem mais de 80 clientes e vai ganhar outros”, diz essa fonte.

O principal cliente da V.tal, no entanto, é a própria Oi. Em 2023, faturou R$ 5,8 bilhões, sendo que 80% disso veio da Oi, segundo dados do balanço da própria empresa. Mas a companhia de rede neutra já conquistou nomes como Sky, Claro e TIM, entre outros.

Um dos entraves para achar um comprador para a Oi Fibra foi (e continua sendo) o contrato com a V.tal. De acordo com várias fontes, esse acordo é “fora da realidade atual de mercado” e “necessitaria ser revisto”. Sem isso, as grandes operadoras ficaram de fora da disputa.

"Você compraria uma empresa com um contrato atrelado. É uma situação bem complexa e difícil de ser resolvida", diz um executivo do setor de telecomunicações.

Negócio via ações

Para a Oi, a solução não é também o melhor cenário. Ao ser adquirida pela V.tal, o negócio será feito via troca de ações e não em dinheiro – algo que seria importante para quem está em uma recuperação judicial e tem visto o seu caixa sangrar.

Hoje, a Oi é dona de aproximadamente 17% da V.tal. Se os clientes de fibra óptica forem assumidos pela empresa comandada pelo BTG, essa participação deve subir para algo em torno de 27,5%.

“A Oi precisa de dinheiro por conta do caixa esvaziado e as receitas não são suficientes para honrar os compromissos”, afirma uma fonte do mercado de telecomunicações, que acompanha há muito tempo a companhia.

No primeiro trimestre de 2024, a Oi tinha uma posição de caixa de R$ 2,1 bilhões. Mas uma parte disso era por conta da entrada da terceira tranche do DIP (debtor in possession) de US$ 125 milhões do BTG – que tem como garantia as próprias ações da Oi na V.tal.

Uma fonte próxima ao BTG diz que os recursos do DIP são suficientes para garantir a liquidez da Oi. A companhia passa também pelo processo de migrar de concessão para autorização, o que exigirá investimentos de mais de R$ 5 bilhões que serão feitos pela Oi e pela V.tal.

O fim da Oi

Com a venda da Oi Fibra, a operadora de telefonia, como conhecemos, desaparece. Sobra daquela gigante que atuava em diversas áreas apenas a Oi Soluções, que fornece serviços para empresas. “Será uma empresa de um faturamento de R$ 2 bilhões por ano, o que não é desprezível, mas comparado ao que já foi, é quase nada”, diz um especialista do setor de telecomunicações.

A Oi já foi a maior empresa de telefonia do País, com faturamento superior a R$ 30 bilhões. Teve amplo financiamento do BNDES, na época em que o governo do Partido dos Trabalhadores criou a política dos campeões nacionais. Mas, pouco a pouco, enrolada em seus problemas societários, foi se endividando. Em 2016, entrou em sua primeira recuperação judicial, com dívidas de R$ 65 bilhões.

Na longa e difícil renegociação com os credores, a Oi foi vendendo ativos para pagar dívidas. A divisão de torres foi comprada pela Highline por mais de R$ 1 bilhão em 2021. A área de data center foi parar nas mãos da Piemonte Holding por R$ 325 milhões. E, logo na sequência, TIM, Claro e Vivo compraram a operação de telefonia móvel por R$ 16,5 bilhões.

Em 2022, foi a vez de vender sua rede de fibra óptica para fundos geridos pelo BTG, o que deu origem à V.tal, em um negócio de R$ 12,9 bilhões. No mesmo ano, o CPP Investments, o maior fundo de pensão do Canadá, pagou R$ 2,5 bilhões por uma fatia de 9,7% na V.tal, avaliando a companhia de rede neutra em R$ 25 bilhões.

Com esse “saldão”, a Oi conseguiu sair de recuperação judicial em 2022. Mas não demorou muito tempo para voltar a ter problemas. E entrar em nova RJ, com dívidas de R$ 44,3 bilhões, em março de 2023.

A solução? Vender ativos (de novo). O que sobrou foram seus clientes de banda larga da Oi Fibra. E, agora, eles devem parar nas mãos da V.tal, no que deve ser um dos últimos capítulos do que um dia já foi a maior empresa de telefonia do Brasil.