Assim que a B3 abriu na segunda-feira, 31 de outubro, um dia depois da confirmação da vitória de Luiz Inácio Lula da Silva para seu terceiro mandato, um grupo de empresas viu suas ações decolarem. Eram as empresas de educação. A Ser Educacional subiu 10,1% desde 28 de outubro. Cogna avançou 4,1%, assim como Yduqs, com alta de 7,5%, e Ânima, com valorização de 6,5%.

A alta era um reflexo da percepção do mercado que essas empresas devem se beneficiar do novo governo de Lula. A valorização das ações refletia também o discurso do presidente eleito que, na Avenida Paulista, deixou claro suas intenções para o setor.

“Nós vamos voltar a fazer uma revolução (na educação). Vai ter ProUni outra vez, vai ter FIES, vai ter Reuni, vai ter Pronate”, disse Lula. “Ninguém venha me dizer que a gente não pode colocar dinheiro na educação, que é gasto. Investir em educação não é gasto, é investimento no futuro desse país.”

Para o presidente do conselho de administração da Ser Educacional, Janguiê Diniz, o mais importante é que o FIES seja um programa sustentável e com uma visão de longo prazo para o ensino superior. “O FIES foi uma ideia importante para aumentar a penetração do ensino superior em nossa sociedade, mas que passou por tantas mudanças que deixou de colaborar com essa visão”, afirmou Diniz, em entrevista ao NeoFeed.

O programa, criado no governo de Fernando Henrique Cardoso, teve seu auge nas gestões petistas, que aumentaram os recursos para o financiamento estudantil para instituições privadas. Em 2014, foram mais de 700 mil financiamentos, o recorde. Ao mesmo tempo, deixou um rastro de endividamento dos estudantes. Tanto que uma lei, sancionada por Bolsonaro neste ano, permite descontos e renegociações das dívidas.

Nesta entrevista, que você lê seguir, Diniz, cujo grupo educacional que ele fundou tem 325,1 mil alunos no ensino presencial e online, fala sobre o perfil do ministro da educação, elenca o que o Brasil precisa fazer para voltar a crescer de forma consistente e diz qual é a principal reforma que acredita ser essencial para o País. Confira os principais pontos:

O que esperar do terceiro mandato do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva?
Temos uma visão positiva do terceiro mandato do Presidente Lula, porque o processo eleitoral mostrou que a sociedade tem visões diferentes do Brasil e acabou vencendo quem buscou mais diálogo e coalizão com as diferentes correntes de pensamento durante o processo eleitoral. Se o Presidente Lula em seu novo mandato seguir com essa estratégia de buscar unificar o País por meio de um diálogo pragmático com as lideranças políticas, temos boas chances de avançar com a agenda de reformas e investimentos que o Brasil tanto precisa para voltar a crescer com consistência.

As ações do setor de educação foram as que mais subiram depois que Lula disse que ia voltar com o Fies, o programa de financiou estudantes. Em que moldes, você acredita que o programa deveria voltar?
Acreditamos que o mais importante é que ele seja um programa sustentável e com uma visão educacional de longo prazo para o ensino superior. O FIES foi uma ideia importante para aumentar a penetração do ensino superior em nossa sociedade, mas que passou por tantas mudanças que deixou de colaborar com essa visão. Nesse sentido, acredito que regras claras e sustentáveis para o programa e que permitam passos a longo prazo, a exemplo do PROUNI que é renovado ou não a cada dez anos, seria interessante para a sociedade brasileira.

Muito tem se especulado sobre os futuros ministros. Mas, antes de especular nomes, qual o perfil que você gostaria de ver à frente da educação brasileira?
Acredito que o Brasil precisa ser mais claro em qual será sua política de estado para o ensino superior, ou seja, definir um padrão de investimentos a longo prazo e definir objetivos claros e atualizados sobre metas a serem atingidas. Com isso conseguiremos definir como vamos posicionar o País no cenário educacional e de formação de mão de obra. Importante lembrar que temos hoje parte do nosso desemprego formado por falta de mão de obra qualificada e não por falta de oferta em si, como é o caso dos segmentos de tecnologia e saúde, que não conseguem preencher vagas por falta de profissionais qualificados. Educação superior também impacta positivamente em produtividade, o que considero fundamental para o crescimento do Brasil. Com base nisso, o Estado pode definir como será sua participação nesse setor e para essa tarefa acreditamos que precisamos de alguém com perfil estratégico e com uma visão de longo prazo sobre o tema.

"Importante lembrar que temos hoje parte do nosso desemprego formado por falta de mão de obra qualificada e não por falta de oferta em si, como é o caso dos segmentos de tecnologia e saúde"

Não há um dado sobre o rombo fiscal em 2023 – os números variam de mais de R$ 100 bilhões até R$ 400 bilhões. O aumento da carga tributária é inevitável e como isso pode afetar as empresas?
Nos parece claro que há muitos anos precisamos de uma reforma tributária mais abrangente e que traga maior competitividade para as empresas e com isso gerar mais empregos e melhorar a distribuição de renda. Essa é uma discussão profunda que Brasil tem postergado e que esperamos que o novo governo consiga aumentar a eficiência de sua máquina administrativa e direcionar melhor os investimentos que o Brasil precisa para voltar a crescer com qualidade, gerar empregos e melhorar sua distribuição de renda.

O que em sua visão precisa ser feito para o Brasil destravar o crescimento e volta a crescer consistentemente?
Acredito que o Brasil precisa ter uma agenda pragmática para aumentar a competitividade e para isso seria importante que o novo governo possa rapidamente dialogar com o congresso e governadores recém-eleitos sobre quais pautas estão mais próximas de consenso e passar a implementar melhorias nos setores de saúde, educação, infraestrutura, tributária, investimentos e geração de empregos. O Brasil precisa ser mais competitivo para isso precisamos melhorar a nossa produtividade e essa é a chave para o crescimento consistente.

Fale-se muito de reformas para o Brasil crescer. Qual delas você considera a mais essencial?
Acredito ser a reforma tributária a mais relevante para o Brasil, especialmente se for acompanhada de uma reforma administrativa para que juntas ajudem País a ser mais competitivo, gerando empregos e permitindo ao governo a evoluir de forma mais rápida e eficiente no desenvolvimento da infraestrutura e no tripé social de saúde, educação e segurança.

É possível Lula governar com um Congresso de oposição? O que fazer para não cair no toma lá, dá cá?
O primeiro ano de mandato geralmente é decisivo em um governo, que por sua vez precisará ser ágil e pragmático para conseguir emplacar suas principais reformas. Historicamente é assim, pois nessa época os políticos estão geralmente saturados das eleições e essa não é diferente nesse aspecto. No primeiro ano teremos um Congresso também mais aberto a fazer alianças políticas que vão de encontro a suas plataformas que foram amplamente defendidas no processo eleitoral. A grande vantagem de Lula foi ter sido aberto a alianças e isso o ajudou a se eleger. Acredito que usar esse capital político nesse sentido será positivo agora.