Em março de 2020, quando fundou o seu negócio e instalou o escritório na região da avenida Faria Lima, centro financeiro de São Paulo, o empresário José Roberto Kracochansky, CEO e fundador da Jazz, sabia que seus clientes não estariam ali por perto.

Afinal de contas, ele atende companhias que não são instituições financeiras reguladas, mas que querem funcionar como uma, sem ter de passar por todos os trâmites do Banco Central (BC) ou desenvolver tecnologia para tal.

“São empresas que estão a centenas de quilômetros daqui, são regionais e muito nichadas”, afirma Kracochansky. “Perde-se velocidade no roadmap de produtos se você tiver que ir ao BC.”

A mais recente companhia a procurar Kracochansky para encurtar distâncias e pegar uma carona na infraestrutura de banking a service oferecida pela Jazz nasceu no Rio de Janeiro e está espalhada por 2,5 mil cidades.

É a Wappa, um aplicativo que substitui os tradicionais ‘vouchers’ de taxistas no atendimento a cerca de 8 mil clientes corporativos, fechou com a Jazz para abrir contas digitais para os 100 mil taxistas que fazem parte da sua base.

Até o momento, aproximadamente 50 mil deles já estão com contas abertas e o objetivo é conquistar a outra metade. A pandemia, no entanto, tem sido uma barreira, uma vez que uma parcela deles parou de circular durante a crise e não está claro quantos vão retornar às ruas na esteira da reabertura da economia.

“O volume chegou a cair para 30% do nível pré-pandemia. Mas aos poucos eles vão voltando à normalidade”, diz Kracochansky. Por enquanto, o nível está próximo de 75%.

Para a Wappa, a parceria com a Jazz eliminou uma série de gargalos. “Precisávamos fazer uma operação complexa para depositar o dinheiro dos taxistas em todas as contas de bancos deles”, afirma Armindo Mota Junior, CEO da empresa. “Agora, conseguimos depositar no dia seguinte, o que antes fazíamos semanalmente. É algo importante para um público que precisa de liquidez.”

Para poder oferecer a estrutura bancária, a Jazz fez uma parceria com o Banco Arbi, uma instituição agnóstica que não tem produtos próprios. A empresa de Kracochansky, por sua vez, entra com a tecnologia. “Se o cliente quer ter um aplicativo, nós já temos uma versão básica para rodar com a marca dele”, diz o empreendedor.

No caso da Wappa, que já tem um aplicativo, a Jazz fez uma integração que permitirá aos taxistas usar a conta para fazer pagamentos, transferir e receber recursos via TED ou PIX, fazer recarga de celular, realizar saques na rede 24 horas e outros serviços básicos.

Assim como fazem as fintechs, a ideia é primeiro criar um relacionamento financeiro com os taxistas, por meio de serviços gratuitos, para depois oferecer outros produtos que permitam uma monetização.

“Queremos avançar para ter microcrédito, por exemplo, e agregar outros serviços ao aplicativo, como um de seguros para terceiros, que já temos e será adicionado”, afirma Mota Junior, da Wappa.

A Jazz já conta com cerca de 50 clientes, incluindo a Wappa, que somam 2,5 milhões de contas ativas, de setores que vão desde o agronegócio, com produtores rurais que trabalham com antecipação de recebíveis, até turismo, varejo e mobilidade. Em 12 meses, a empresa registrou R$ 1 bilhão em transações.

Com a digitalização do varejo acelerada pela pandemia e o surgimento de superapps, o banking as a service é um mercado que tem se mostrado um terreno fértil para instituições já reguladas pelo BC, especialmente quando o cliente já conta com um aplicativo com uma base expressiva de usuários.

No início do ano, por exemplo, o banco Digio, controlado por Bradesco e Banco do Brasil, anunciou uma parceria com a Uber, para criação de contas digitais para os cerca de 1 milhão de motoristas do aplicativo. O objetivo é que eles possam receber o dinheiro das corridas na hora. A ideia, na sequência, é avançar para outros serviços financeiros, de modo a monetizar a base.

Assim como o banco Digio, o BV (antigo Banco Votorantim), o Banco Original e o ABC Brasil são algumas das instituições que miram fintechs que ainda não conseguiram licenças do BC para oferecer estrutura e tecnologia bancária.

“Cada vez mais será uma oportunidade para bancos de porte médio que já são regulados e não estão no varejo, que podem inclusive vir a comprar alguns desses provedores de tecnologia de banking as a service”, afirma Bruno Diniz, sócio da consultoria Spiralem.

Kracochansky, da Jazz, acredita que trabalhar com um banco agnóstico que não tem produtos financeiros lhe permite atuar sem conflitos de interesse. “O BV, por exemplo, pode ser visto pelas fintechs como um concorrente. Já o Arbi é um banco invisível”, argumenta.

Embora o mercado já conte com algumas soluções, Diniz ainda vê espaço para o segmento crescer antes de uma consolidação. “Lá fora, muitos fundos de venture capital estão colocando dinheiro nessa tese de banking as a service, mas os cavalos vencedores ainda estão se definindo.”