Nos últimos 17 anos, o Brasil viu as matrizes energéticas renováveis darem um salto forte. Desde que o governo passou a incentivar o desenvolvimento das fontes eólica e solar, em 2004, a participação delas no parque gerador passou de zero para 29%, enquanto a parcela das hidrelétricas caiu de 84% para 52% e a fatia das térmicas foi de 13% para 19%.
Apesar de ajudarem o Brasil a avançar na descarbonização da economia e elevarem a oferta, essas matrizes trazem consigo a questão da intermitência da produção, com a geração ficando descasada dos momentos de pico do consumo.
E num momento em que a hidrologia começa a dar sinais de que o volume de energia produzido pelas hidrelétricas vai cair, o País deve ver o fim dos preços baixos de energia que perduraram entre meados de 2022 e 2023.
O alerta é da Kinea Investimentos, que vê uma inflexão nos preços de eletricidade se formando no mercado, o que representa uma oportunidade de investimento em empresas de geração hídrica, em especial a Eletrobras.
Em um estudo a ser divulgado na semana que vem, e que foi antecipado com exclusividade ao NeoFeed, o braço de investimentos alternativos do Itaú Unibanco diz que o Brasil vivenciou um período atípico de boas chuvas nos últimos dois anos, abastecendo os rios e reservatórios das usinas hidrelétricas.
Isto foi suficiente para compensar a intermitência das fontes renováveis e atender a demanda do mercado, sem precisar acionar as térmicas, que possuem custos elevados, além de serem poluentes. Combinado com o aumento da participação das renováveis, o resultado foi levar os preços de curto prazo ao piso, fazendo as cotações de longo prazo amargarem 14 meses seguidos de queda, totalizando 55% de desvalorização entre abril de 2022 e junho de 2023.
Mas, em meio aos efeitos do El Niño, com o nível de chuvas em dezembro nos reservatórios se aproximando das mínimas históricas, a Kinea alerta que a instabilidade climática pode diminuir os níveis dos reservatórios, fazendo com que as hidrelétricas não sejam mais suficientes para garantir a oferta de energia, manter os preços baixos e compensar a instabilidade das fontes eólica e solar.
“Com cada vez mais fontes intermitentes no sistema, como vento e luz solar inconstantes, e, com o descasamento entre o horário geração de energia solar e a demanda no horário de pico de consumo, estamos cada vez mais sujeitos a ter que ligar as térmicas no final do dia para garantir o suprimento de energia”, diz trecho do estudo.
A Kinea aponta que os preços já começaram a se recuperar, com a média da curva de preços da energia subindo 47% desde maio. E a tendência é que esse movimento continue.
“A combinação de nossa atual matriz energética com maior instabilidade e intermitência, somada a um ponto de partida extremamente baixo de preços de eletricidade e demanda de energia crescente, que seguia estagnada desde 2015, faz com que os riscos de preço sejam assimétricos para cima”, diz outro trecho do estudo.
Este cenário deve beneficiar empresas de geração hídrica com capacidade descontratada, que é o caso da Eletrobras, além de Copel e Equatorial, permitindo negociar contratos a valores melhores.
No caso da Eletrobras, a Kinea destaca que a empresa responde por mais de 20% de toda capacidade instalada do parque gerador brasileiro, com mais de cinco vezes a capacidade instalada da segunda geradora, a Engie, com 43,8 gigawatts (GW).
“Acreditamos que ela deve se beneficiar diretamente do aumento da volatilidade dos preços de energia, oferecendo um potencial de valorização de acima de 50% num cenário de preço conservador, abaixo do implícito nas curvas hoje”, diz trecho do estudo.
A Kinea destaca ainda outros pontos que jogam a favor da Eletrobras, como os possíveis ganhos de eficiência operacional nos próximos anos e a potencial redução de custos operacionais.