A exatos dois dias da virada do calendário para 2026, a Meta encontrou tempo para movimentar sua esteira de aquisições. E dentro de uma agenda que foi o fio condutor de boa parte dos investimentos de tecnologia ao longo do ano: a inteligência artificial (IA).

Dona do Facebook, do Instagram e do WhatsApp, a companhia de Mark Zuckerberg anunciou a compra da Manus, startup de inteligência artificial. O valor da transação não foi revelado, mas, segundo o The Wall Street Journal, o negócio avalia a novata em mais de US$ 2 bilhões.

O racional do M&A é óbvio. Mas, muito além de reforçar o foco total da Meta em IA, o negócio chama a atenção por ser uma das raras transações nesse espaço envolvendo uma big tech americana e uma companhia chinesa. Ou melhor, com origem no país da Grande Muralha.

A Manus nasceu dentro da Butterfly Effect, empresa chinesa fundada em 2022, e já foi considerada a próxima DeepSeek, a companhia também da China que, no início desse ano, abalou as estruturas – e as ações – das big techs americanas ao anunciar seu modelo de IA.

Com boa parte da sua equipe instalada na China, a Manus começou a tomar forma em 2023. Mas, na contramão das suas raízes locais, tem sede em Singapura, para onde migrou poucos meses após ser lançada oficialmente, em março desse ano.

Essa mudança teve como pano de fundo uma rodada de US$ 75 milhões captada, em abril, junto à Benchmark, empresa de capital de risco americana. O aporte avaliou a startup em US$ 500 milhões e foi criticado nos EUA, sob a alegação de que violava a proibição de grupos americanos investirem em IA chinesa.

Com a migração para Singapura, a Manus também entrou na mira da mídia chinesa, que passou a tratar a empresa como “desertora”. Até então, a companhia havia captado US$ 10 milhões com investidores locais e da região, como a Tencent, ZhenFund e a HSG.

Em meio a esse tiroteio, a startup não oferece seu portfólio na China. O que não impediu a empresa de chamar a atenção com seus agentes de inteligência artificial que prometem executar tarefas autônomas com menos instruções que os modelos de rivais como o ChatGPT, da OpenAI, e a própria DeepSeek.

Há cerca de duas semanas, a companhia traduziu, em números, a evolução dessa oferta, ao anunciar que superou a marca de US$ 100 milhões em receita recorrente anual, apenas oito meses depois do seu lançamento oficial.

De acordo com a agência Bloomberg, o início das negociações com a Meta coincidiu justamente com a divulgação desses dados. O acordo com a gigante americana teria sido fechado em aproximadamente dez dias.

No anúncio de hoje, a Meta ressaltou que a Manus desenvolveu um dos principais agentes autônomos de uso geral capaz de executar tarefas complexas como pesquisas de mercado, programação e análise de dados, que já atende às necessidades diárias de “milhões de usuários e empresas em todo o mundo”.

“Planejamos expandir esse serviço para muito mais empresas”, afirmou a Meta, em comunicado, acrescentando que seguirá operando e comercializando o portfólio da startup, além de integrá-lo aos seus produtos.

Já a Manus destacou em nota que a aquisição é uma validação do seu “trabalho pioneiro” com agentes de inteligência artificial de uso geral. E que seguirá vendendo e operando seus serviços por meio do seu aplicativo e site, além de manter sua sede em Singapura.

“Juntar-se à Meta nos permite construir sobre uma base mais forte e sustentável sem mudar como a Manus funciona ou como as decisões são tomadas”, disse Xiao Hong, cofundador e CEO da Manus, no comunicado divulgado pela empresa.

Em outra ponta, reforçando a mensagem da inexistência de qualquer laço com a China, um porta-voz da Meta afirmou à Bloomberg que, no acordo, a companhia comprou todas as fatias de investidores chineses na Manus, que não contará mais com sócios do país em sua base de acionistas.

Polêmicas à parte, a aquisição é mais uma peça no quebra-cabeças de investimentos da Meta em IA. E, segundo o jornal britânico Financial Times, que cita Liu Yuan, sócio da ZhenFund, um desses primeiros investidores da Manus, os valores envolvidos traduzem esse apetite da Mark Zuckerberg.

De acordo com Yuan, essa seria a maior terceira aquisição da história da Meta, atrás apenas da compra do WhatsApp, em 2014, por US$ 19 bilhões. E da aquisição de uma fatia de 49% da Scale AI, startup californiana, também de inteligência artificial, em junho desse ano.

Os esforços da Meta nessa arena não estão restritos aos M&As. Em janeiro, Zuckerberg, que tem alardeado a ideia de desenvolver uma “superinteligência pessoal”, anunciou um plano de investir até US$ 500 bilhões em inteligência artificial em um prazo de quatro anos.

Como parte dessa estratégia, que inclui, entre outras frentes, um investimento pesado em data centers e no desenvolvimento de seus modelos de IA, o próprio Zuckerberg tem se envolvido – e não tem economizado – no recrutamento de profissionais de inteligência artificial de rivais no Vale do Silício.

No caso específico da Manus, a aquisição traria mais fôlego para a Meta no plano dos assistentes de inteligência artificial, uma disputa na qual a companhia tem pela frente competidores de peso como OpenAI, Google e Microsoft.

Ao mesmo tempo que traz uma nova arma para avançar nessa batalha, o valor envolvido na aquisição pode dar mais munição aos críticos e investidores da Meta, que tem questionado os desembolsos bilionários da empresa nesse espaço, ainda com poucos resultados.

Na Nasdaq, após fechar o pregão da segunda-feira com ligeira queda de 0,69%, as ações da Meta registram alta de 0,13% no pre-market. No ano, os papéis acumulam uma valorização de 12,4%, dando à empresa um valor de mercado de US$ 1,66 trilhão.