A operadora e agência de viagens CVC Corp concluiu seu aumento de capital em 22 de novembro e captou R$ 226,2 milhões. A emissão de novas ações é parte de uma nova reestruturação na companhia, que nos últimos anos vêm buscando encontrar um norte. Com esse movimento, um profundo conhecedor da empresa volta a ser protagonista: Guilherme Paulus.

O fundador da CVC, por meio dos fundos GJP FIA e Seven FIA, que estão sob a gestão da MAR Asset, de Gustavo Paulus (filho de Guilherme) aumentou sua participação de 6,8% para 10,1% e voltou a ser o acionista de referência. O Opportunity, que detinha 11,6%, reduziu sua participação para 9,8%.

Outra gestora que segue como relevante é o Pátria, que embora não tenha 5% das ações da companhia está com duas cadeiras no conselho de administração - o mesmo número de Opportunity e da MAR Asset.

Com a volta de Paulus, o caminho que a CVC perseguirá nessa nova reestruturação está traçado. A operadora de viagens quer voltar a ser um negócio simples, ou seja, aquele que tem lojas físicas, imprime bilhetes para os clientes, oferece pacotes exclusivos e fecha parcerias com seus fornecedores.

Voltar às origens tem sido uma decisão recorrente em marcas tradicionais. Recentemente, a Tok&Stok trouxe de volta à liderança da operação a fundadora Ghislaine Dubrule com essa missão. A Natura, comandada por Fabio Barbosa, também escolheu o mesmo caminho. Tanto Dubrule como Barbosa usaram a mesma frase: “o foco agora é o back to basics”.

Na CVC, o escolhido para conduzir essa estratégia foi Fabio Godinho, um executivo próximo à família Paulus que conhece o setor de viagem e turismo. Ele já esteve anteriormente na CVC (duas vezes), além de WebJet e GJP Hotels & Resorts. Neste processo de turn around, sua primeira decisão aconteceu semanas depois de assumir como CEO em junho.

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Fabio Godinho, CEO da CVC (Foto: Emerson de Souza/Panrotas)

“No road show do processo de follow on, viviam me perguntando sobre OTA [abreviação de Online Travel Agency]. Havia uma confusão na cabeça das pessoas de que a CVC deveria virar uma OTA. Mas é exatamente o contrário”, diz Godinho, CEO da CVC, ao NeoFeed.

Ele complementa: “Não somos uma empresa de tecnologia como uma OTA. Somos uma empresa de turismo, para quem vai investir no mercado de férias, de experiência. É secular trend”.

O business de OTA na CVC era realizado pela marca Submarino Viagens, uma plataforma que foi adquirida no fim de 2015. No último trimestre, Godinho marcou a operação como write off (ativo reduzido a zero) no balanço da empresa. A justificativa é que a operadora de viagens é “diametralmente oposta à estratégia de vender no digital”.

Com essa decisão, a empresa deixa a disputa de mercado pela cotação do menor preço em passagem aérea e hotel. A concentração volta a ser apenas na criação de valor com a criação de pacotes e destinos exclusivos. Na visão da gestão da CVC, esses produtos estratégicos diferenciam a operadora pela baixa comparabilidade com os concorrentes.

Sair do jogo da OTA não significa abandonar o digital. Mas a CVC volta a ser analógica. Um exemplo é o período da Black Friday. A companhia, que tinha reduzido a zero os investimentos em mídia física, voltou a colocar seus esforços no off-line. A distribuição de anúncios foi de 60% para a mídia física e 40% para a digital.

“Refizemos a jornada de compra do cliente e hoje é um misto entre o físico e o digital. O que fizemos na Black Friday é a volta do phygital. Foi o segundo melhor dia de venda da história da CVC”, diz o CEO.

O investimento no off-line também se estende às lojas físicas. A CVC, que vinha encolhendo o número de unidades desde a pandemia - foram fechadas cerca de 400 -, voltou a colocar a expansão orgânica como prioridade.

No fim do terceiro trimestre, a CVC contava com 1.088 lojas. Até o fim deste ano, a meta é acrescentar 27 novas unidades e totalizar 60 inaugurações no segundo semestre de 2023. A projeção é que a empresa volte a ter 1.400 pontos-de-venda (o mesmo número pré-pandemia) em um curto espaço de tempo.

“Uma operadora de turismo, uma agência de viagens é como um banco, que você pede o saldo, recebe um extrato e acredita que o dinheiro está lá. É a mesma coisa aqui: o cliente compra um pacote e sai com um voucher dizendo que ele tem direito àquele serviço”, afirma o CEO.

Para acelerar esse projeto, Godinho vai explorar o interior do Brasil. A ideia é ter uma loja em cidades de, no mínimo, 30 mil habitantes sem precisar mudar o tamanho e o layout de um ponto de venda CVC.

Com 1.033 franqueados, o CEO da CVC reduziu o valor de abertura do modelo mais barato de loja de R$ 150 mil para R$ 75 mil. Esse corte aconteceu com a regionalização de fornecedores e a simplificação dos materiais. A cidade goiana de Niquelândia, distante 300 quilômetros da capital, é um exemplo dessa regionalização.

“A primeira rodada de abertura são de lojas tradicionais, onde a experiência do cliente é exatamente igual para chegarmos em cidades de 30 mil habitantes”, afirma Godinho. “Mas, como não sossegamos, abaixo de 30 mil existem 3,5 mil cidades. Em breve também vamos nos encaixar também nessas cidades menores.”

O que vem pela frente

O desafio da CVC não é pequeno. Em maio deste ano, o então CEO Leonel Andrade renunciou ao cargo. Ele estava no comando da operadora de turismo desde abril de 2020 lidando com uma turbulência atrás da outra. Assumiu uma empresa em crise de imagem em razão de distorções contábeis e encarou uma pandemia que fechou o turismo global.

O primeiro ano completo sem restrições gera resultados para empresas de turismo. A quantidade de viajantes no Brasil está cerca de 5% abaixo dos patamares pré-pandemia no ano, até setembro, segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). O mercado projeta crescimento de 5% a 7% do turismo nacional em 2024.

“Nós vamos crescer muito mais do que isso porque eu terei muito mais capacidade exclusiva. Vou crescer o mercado mais o ganho de share”, diz o CEO.

Guilherme Paulus
Guilherme Paulus, fundador da CVC

Após 14 trimestres consecutivos de prejuízo, a CVC voltou a entregar lucro aos seus acionistas. Foram R$ 36,5 milhões no terceiro trimestre, um resultado que exclui os efeitos contábeis do impairment tanto dos ativos fiscais diferidos como da Submarino Viagens, em razão da revisão do plano de negócios, e da marcação à mercado do bônus de subscrição.

Embora tenha conseguido colocar quase R$ 222 milhões em caixa, o endividamento da CVC continua alto. A dívida líquida fechou o terceiro trimestre em R$ 639,2 milhões. Mas, nos últimos meses, a companhia conseguiu um reperfilamento da sua dívida em acordo com os debenturistas.

Para isso, foi realizado um aumento de capital no montante de R$ 549,9 milhões e uma tender offer (recompra de títulos de acionistas minoritários) no total de R$ 75 milhões.

Com valor de mercado de R$ 1,5 bilhão, a ação da CVC acumula perda de 26,5% no ano.