Quando se imaginava que a vida da Oi ficaria mais fácil depois da venda das suas operações de telefonia móvel, a possibilidade de ter que renegociar os termos do acordo está provocando arrepios na companhia e em seus investidores.
Nesta segunda-feira, 19 de setembro, as principais rivais da operadora e compradoras da Oi Móvel – TIM Brasil, Vivo e Claro – comunicaram ao mercado a intenção de discutir o valor final do negócio, fechado em abril do ano passado, por R$ 16,5 bilhões.
A Oi conta com os recursos para pôr fim à sua recuperação judicial iniciada em 2016, com uma dívida acumulada de R$ 65 bilhões. A companhia já informou que discorda dessa possibilidade e que vai tomar “todas as medidas cabíveis no sentido de fazer prevalecer seus direitos.”
A situação derrubou os papéis da Oi no pregão de hoje. As ações ordinárias fecharam o dia com queda de 11,32%, a R$ 0,47, enquanto os preferenciais recuaram 4,85%, para R$ 0,98. No ano, as ações acumulam perdas de 38,1% e 23,4%, respectivamente, levando o valor de mercado da empresa a R$ 3 bilhões.
O ponto de discórdia está no Preço de Fechamento Ajustado (PFA). Segundo as compradoras, um estudo encomendado à KPMG mostrou divergências em premissas técnicas utilizadas para calcular a operação, justificando uma redução de R$ 3,2 bilhões no preço pago pela Oi Móvel.
O levantamento mostra diferenças em questões como capital de giro, dívida líquida, capex e base de clientes. Por seus cálculos, as compradoras afirmam que têm o direito de receber de volta R$ 1,7 bilhão e manter R$ 1,4 bilhão em recursos retidos para eventuais ajustes de preço de fechamento ou indenizações, conforme acertado originalmente. As teles argumentam ainda terem o direito a receber uma indenização de R$ 353 milhões.
A Oi informou, por sua vez, que a avaliação apresentada pelas compradoras contém “uma série de erros técnicos e processuais”, além de equívocos na metodologia, nos critérios, nas premissas e na abordagem, “fazendo com que o ajuste proposto esteja fora de qualquer base de razoabilidade”.
A venda dos ativos móveis foi o passo mais importante para a Oi pleitear o fim da recuperação judicial, juntamente com a venda do controle da empresa de fibra óptica para fundos geridos pelo BTG Pactual, R$ 12,9 bilhões
Em agosto, o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) apresentou uma manifestação favorável ao fim do processo de recuperação judicial, desde que a empresa comprovasse ter sustentabilidade financeira.
Essas duas operações abriram caminho para o cumprimento dessa exigência, mas a revisão que as compradoras estão propondo coloca em dúvida se a recuperação judicial chegará ao fim em um futuro próximo. O montante pleiteado é relevante para a Oi, uma vez que representa cerca de 58% do Ebitda registrado pela operadora no ano passado.
A empresa encerrou o segundo trimestre com R$ 4,3 bilhões em caixa e equivalentes, enquanto a dívida bruta consolidada registrou um saldo de R$ 21,1 bilhões. Esse montante representa uma queda de 27,3% em relação ao mesmo período do ano passado. Boa parte desse recuo está relacionada ao pré-pagamento de dívidas após a conclusão da venda dos ativos móveis.
Para Flávio Conde, analista da Levante Investimentos, esse imbróglio envolvendo a Oi Móvel representa mais uma notícia surpreendente envolvendo a Oi, mesmo que a situação esteja se normalizando nos últimos anos. Ele destacou que o montante discutido é extremamente elevado e que ultrapassa o valor de mercado da companhia.
"Não se esperava no caso dessa operação que acontecesse um ajuste tão alto, porque R$ 3,2 bilhões é praticamente 20% do valor da operação", afirmou. "O normal, quando se trata de PFA, é discutir 5% mais ou menos."
O imbróglio prevê um período de 30 dias para que as partes busquem uma solução para as divergências em relação ao ajuste e, uma vez terminado esse prazo, a determinação poderá ser submetida a uma auditoria independente contratada para esse fim específico.
Ao destacar que o pagamento dos R$ 3,2 bilhões não é "líquido nem certo", Conde observa que a situação pode resultar numa disputa jurídica prolongada, atrapalhando ainda mais o encerramento do processo de recuperação judicial e pesando sobre o desempenho das ações da Oi.
"A recuperação já estava contando com os valores que entraram das vendas, isso atrapalha bastante", diz ele. "A empresa ter que devolver R$ 3,2 bilhões, e tendo um endividamento muito alto, é algo muito desagradável."
Essa não é a primeira vez que a venda é colocada em xeque. Em julho desse ano, o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Carlos Baigorri, disse ao jornal O Globo que vai conversar com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a respeito da possibilidade de desfazer a operação.
Por enquanto, não está claro como isso ocorreria. Mas, no caso desse movimento ser concretizado, seria uma medida inédita para a autarquia responsável pela telecomunicação brasileira.