Em fase de reestruturação desde junho de 2022, quando Fabio Barbosa assumiu o comando do grupo, a Natura&Co decidiu reduzir sua ambição de consolidar uma plataforma global de cosméticos, o que começou a se materializar com as vendas, em 2023, da Aesop e da The Body Shop.
No início de fevereiro deste ano, a empresa incluiu nessa estratégia o ativo que melhor traduziu suas aspirações globais: a Avon, comprada em 2019, por cerca de US$ 2 bilhões. Nesse caso, porém, a estratégia, ainda em avaliação, tem um outro viés.
O grupo anunciou que avalia a separação da Natura e da Avon em duas companhias independentes e de capital aberto. E, passado pouco mais de um mês, essa alternativa foi um dos temas tratados na conferência sobre o resultado do grupo no quarto trimestre e em 2023.
“Ainda estamos em estágio inicial desses estudos e não é algo simples, há muito elementos que devem ser analisados”, disse João Paulo Ferreira, diretor-executivo da Natura&Co para a América Latina, a analistas na manhã de terça-feira, 12 de março.
Ao observar que um eventual spin-off daria continuidade a abordagem de simplificação das operações iniciada em 2022, o executivo ressaltou que, caso seja concretizada, a separação daria mais flexibilidade na capacidade de investimento das duas companhias.
“O fato é que não vemos tantas sinergias entre as duas marcas na região e isso seria uma continuidade em relação à simplificação da companhia”, afirmou. “Mas, em última análise, só podemos anunciar algo nessa direção devido ao trabalho que fizemos com essas duas marcas nos últimos anos.”
Nesse sentido, o executivo e seus pares destacaram alguns dos resultados obtidos a partir do foco em recuperação das margens, da rentabilidade e da chamada Onda 2, projeto que passa pela integração dos dois negócios na região, em frentes como logística e comercial, iniciada em agosto de 2023.
“O nosso negócio está se movendo na direção correta, com melhoras nas nossas margens, no fluxo de caixa, na desalavancagem da operação e com ganhos de produtividade no Brasil”, disse o CEO Fabio Barbosa. “E tivemos melhorias na Avon, com a companhia sendo gerenciada por duas regiões, em vez de quatro.”
Como parte desse processo de integração, a empresa informou que conseguiu solucionar boa parte do acúmulo de entregas atrasadas no mercado brasileiro observado, principalmente, no fim de 2023. Assim como estabilizou os problemas relacionados à falta de estoque.
“Nós resolvemos a maior parte das entregas no início do ano e o nível de escassez dos estoques também teve melhoras”, afirmou Ferreira. “Agora, temos uma situação muito melhor comparado ao quarto trimestre, mas ainda estamos aprendendo a tratar esse novo portfólio combinado.”
Dentro dessa combinação no mercado brasileiro, sob o ponto de vista da logística, o executivo ressaltou que os centros de distribuição das duas operações já foram integrados na região Nordeste. E que o mesmo processo deve ser concluído no Sul e Sudeste entre junho e julho desse ano.
No que diz respeito às margens, os executivos acrescentaram que ainda há espaço para o crescimento dos indicadores na América Latina, a partir da simplificação das operações combinada com aumentos calculados dos preços, de acordo com cada país e o cenário macroeconômico.
“Estamos preparando o terreno para um horizonte mais promissor em 2024 e nos próximos anos”, afirmou Barbosa, com uma ressalva. “Mas continuamos a esperar uma volatilidade no top line, porém, com melhoras de margem no ano todo, especialmente na Argentina.”
Calcanhar de Aquiles
A Argentina foi apontada justamente como um grande “calcanhar de Aquiles” para a Natura em 2023. A empresa encerrou o quatro trimestre com um prejuízo líquido de R$ 2,6 bilhões, contra a perda de R$ 890,4 milhões registrada em igual período, em 2022. No ano consolidado, porém, a empresa reportou um lucro líquido de R$ 2,9 bilhões, ante um prejuízo de R$ 2,8 bilhões, no ano anterior.
Entre outubro e dezembro, a receita líquida foi de R$ 6,6 bilhões, o que representou um recuo de 17,4%. Já em 2023, a receita líquida apresentou uma retração de 8,5%, para R$ 26,7 bilhões. A margem bruta, por sua vez, evoluiu 410 base points, para 63,8%.
A Natura&Co Latam apurou uma receita líquida de R$ 4,8 bilhões no quarto trimestre, queda de 17,9%. No ano, essa linha caiu 7,2%, para R$ 20,4 bilhões. Na Avon International, a receita trimestral recuou 16,9%, para R$ 1,7 bilhão, e, a anual, teve uma retração de 12,6%, para R$ 6,2 bilhões.
O Ebitda ajustado trimestral foi de R$ 670,6 milhões, alta de 31%, e, em 2023, ficou em R$ 2,7 bilhões, um crescimento de 31,7%. A margem Ebitda ajustada avançou 370 base points (bps) entre outubro e dezembro, para 10,1%, e 310 bps, para 10,2%.
A empresa fechou o ano com um caixa líquido de R$ 1,7 bilhão, contra R$ 700 milhões no terceiro trimestre de 2023. Já a alavancagem da operação, medida pela relação dívida líquida/Ebitda ficou negativa em 0,79 vez, contra 3,49 vezes, um ano antes.
O balanço foi acompanhado de um fato relevante no qual o grupo informou a distribuição de dividendos referentes a 2023 no valor total de R$ 979 milhões, a serem pagos no próximo dia 19 de março.
A Natura na visão do mercado
Em relatório, o Goldman Sachs ressaltou que o balanço foi misto, mas trouxe algumas “tendências encorajadoras”. Entre elas, o crescimento robusto da marca Natura no Brasil e os ganhos de margem provenientes de questões como a otimização do portfólio, aumentos de preços e controle de despesas.
“No entanto, os resultados também vieram – mais uma vez, com alto nível de reestruturação, despesas pontuais e custos de transformação, bem como ajustes na exposição da empresa à Argentina”, ressaltaram os analistas do banco, que tem preço-alvo de R$ 18 e recomendação neutra para a ação.
Na mesma linha, o BTG Pactual observou que a recuperação da Natura segue dando frutos, como a expansão da margem bruta, mas destacou que o cenário para a empresa segue desafiador, especialmente diante de fatores como os impactos da implementação da Onda 2.
“Embora saudemos os esforços para simplificar a sua estrutura e melhorar as margens, o ritmo de recuperação permanece incerto, com os números do quarto trimestre ainda afetados pela recuperação na América Latina, o que nos leva a manter a nossa classificação neutra”, escreveram os analistas do BTG, com preço-alvo de R$ 18 para o papel.
As ações da Natura estavam sendo negociadas com alta de 3,4% por volta de 12h30 na B3, cotadas a R$ 17,93. Em 2024, os papéis da empresa, avaliada em R$ 24,3 bilhões, acumulam uma valorização de 4,3%.