Em busca de fortalecer suas finanças, a Netflix anunciou no final do ano passado a possibilidade de compartilhamento de senhas. Com 223 milhões de assinantes na ocasião, a estimativa era de que mais de 100 milhões de pessoas utilizavam seu serviço de streaming em contas compartilhadas.

Vista como arriscada por alguns analistas, com alertas para a possibilidade de perda de usuários, a iniciativa demonstrou ter tido efeito no terceiro trimestre, sendo muito bem recebida pelo mercado na quinta-feira, 19 de outubro.

Por volta de 13h45, as ações da Netflix subiam mais de 15% na Nasdaq, a US$ 398,40. No ano, elas acumulam alta de 36,7%, levando o valor de mercado a US$ 176,5 bilhões.

A companhia de streaming divulgou na quarta-feira, 18, que adicionou 8,8 milhões de novos assinantes no terceiro trimestre, resultando num aumento de 10,8% da base de assinantes em relação ao mesmo período do ano anterior.

O resultado de adição líquida de assinantes foi o melhor para um trimestre desde o começo de 2020, quando a pandemia levou a uma explosão na assinatura de serviços de streaming. O número também superou em 45% a média das expectativas dos analistas de Wall Street, segundo o jornal The Wall Street Journal.

A receita cresceu 7,8% em base anual, excluindo efeitos cambiais, para US$ 8,5 bilhões. O lucro líquido somou US$ 1,67 bilhão, alta de 20%, com a margem operacional indo de 19,3% para 22,4%.

Em relatório, o Morgan Stanley decidiu elevar a recomendação para as ações da Netflix de neutro para compra e o preço-alvo de US$ 430 para US$ 475, vendo a companhia no rumo certo e removendo incertezas em relação a sua tese de investimento.

Além do resultado do terceiro trimestre, os investidores repercutem a expectativa de que a adição de novos usuários no quarto trimestre deve permanecer no mesmo patamar do terceiro, segundo indicação da Netflix.

O bom resultado com a estratégia de limitar o compartilhamento de contas também está encorajando a Netflix a reajustar os preços das assinaturas nos Estados Unidos, a primeira mais significativa desde o começo de 2022. A mensalidade para os dois planos mais premium vão subir em 15% e 20%, respectivamente, para US$ 11,99 e US$ 22,99.

Sustenta?

Ainda que a estratégia de impedir o compartilhamento de senhas da Netflix tenha se mostrado bem sucedida no terceiro trimestre, alguns analistas levantam alguns pontos no balanço e as perspectivas da companhia daqui para frente.

Segundo Matheus Popst, sócio da Arbor Capital, a adição líquida de assinantes veio principalmente da Europa, Oriente Médio e África, em que a receita por membro é um pouco menor. O balanço mostra que o chamado ARM, receita média por assinante, caiu 1% em base anual, por conta de regiões cujos aumentos de preços foram bem limitados.

Ele destacou ainda que o processo de conversão depende ainda do avanço do modelo de assinatura com propaganda, para permitir a migração daqueles que não querem pagar valores maiores. O crescimento do modelo de propaganda foi de 70% em relação ao segundo trimestre, mas a base de comparação é baixa, segundo Popst.

“O dilema que a Netflix está enfrentando é que eles não conseguem vender muito o inventário de propaganda, tendo que devolver dinheiro para alguns clientes, porque não tem tantos usuários”, afirmou o especialista.

Outro ponto destacado pelo sócio da Arbor é que a conversão ocorre num momento em que um menor número de produtos subirá na plataforma, efeito da greve de roteiristas e atores, tendo efeito sobre os custos de produção, o que pode ter efeitos negativos.

Segundo ele, embora o fluxo de caixa livre de US$ 1,9 bilhão seja robusto, ele foi obtido às custas de investimentos em programação. E a Netflix está reduzindo os gastos com conteúdo neste ano e no próximo para US$ 30 bilhões, menos do que os US$ 34 bilhões despendidos entre 2021 e 2022.

“Isso vai impactar a Netflix mais para frente”, disse o sócio da Arbor. “A MAX, da Warner Brothers, perdeu market share, basicamente porque não lançaram nenhum programa novo.”

Ele acrescenta ainda que, considerando o múltiplo em que as ações da Netflix são negociadas, um preço por lucro (P/L) de 37,3 vezes, segundo dados do InvestingPRO, o resultado do terceiro trimestre foi “bem ok”. “Se esperaria um crescimento bem maior do que os 8% [da receita]”, disse.