O túnel imerso Santos-Guarujá, primeira obra do tipo no Brasil, será construída por uma empresa estrangeira. Na manhã desta segunda-feira, 1º de setembro, a construtora portuguesa Mota-Engil e a espanhola Acciona entregaram envelopes as com as propostas para realização da obra. O leilão será nesta sexta-feira, 5 de setembro, na B3.

Dessa forma, as construtoras nacionais Odebrecht, Andrade Gutierrez, Álya (antiga Queiroz Galvão), que chegaram a revelar intenção de participar do certame, estão oficialmente fora da disputa. A construtora cearense Marquise também tinha afirmado que estaria no pleito, mas, a exemplo das demais, não entregou envelopes.

A obra custará R$ 6,8 bilhões, dos quais R$ 5,1 bilhões virão de recursos públicos, igualmente divididos entre os governos estadual e federal. Além dos aportes iniciais para a obra, o poder público vai pagar uma contraprestação para a empresa que, segundo o edital, está em R$ 438 milhões. Será declarada vencedora a concorrente que oferecer o maior volume de desconto na contraprestação.

A espanhola Acciona, que tem como acionista a gigante chinesa CCCC, atualmente é responsável pela construção da Linha 6-Laranja do Metrô de São Paulo, que ligará a estação São Joaquim, no Centro, a Brasilândia, na Zona Norte. Após sequência de atrasos, o primeiro trecho da linha deve ser inaugurado no segundo semestre de 2026.

A portuguesa Mota-Engil, responsável pelo VLT de Salvador, adquiriu, em maio deste ano, os 50% restantes da Empresa Construtora Brasil (ECB), de Belo Horizonte (MG). A primeira metade havia sido comprada em 2012.

“Por se tratar de um leilão que exige técnica internacional, já esperávamos a habilitação de empresas que preencham esses requisitos, e que já tenham em seus portfólios obras com essas características”, diz Anderson Pomini, presidente da Autoridade Portuária de Santos (APS), ao NeoFeed.

“Isso revela que a modelagem adotada para o leilão do túnel é a adequada, principalmente por causa dos investimentos do governo federal e do governo de São Paulo”, afirma o dirigente.

O túnel terá 1,5 quilômetro de extensão, dos quais 870 metros serão abaixo do canal do porto. A perspectiva é que a obra não cause interferência na movimentação dos navios que trafegam diariamente pelo maior terminal portuário da América Latina.

O pedágio previsto é de R$ 6,15 para automóveis, R$ 3,07 para motocicletas e R$ 18,35 para caminhões de 2 ou 3 eixos. A cobrança, que ocorrerá no sistema free flow, sem a utilização de cancelas, irá ser realizada nos dois sentidos do túnel.

A estimativa é que a própria vencedora defina exatamente qual será o trajeto oficial do túnel entre as duas margens do porto. Também há a etapa de desapropriações de moradias tanto do lado de Santos quanto de Guarujá. Para isso estão separados R$ 544 milhões, justamente para agilizar os pagamentos

Pelo próprio edital, a perspectiva é que, a partir do sexto ano de operação, a concessionária alcance uma receita tarifária de R$ 2,3 bilhões.

Atualmente, a ligação entre Santos e Guarujá é feita por meio de balsas, que levam, em média, 18 minutos por travessia, mas com frequência há filas dos dois lados, provocados por condições climáticas que chegam a paralisar a movimentação das embarcações.

A cobrança do pedágio para quem vai de balsa é de R$ 12,30 (automóveis) e R$ 6,20 (moto), com pagamento apenas no sentido Guarujá-Santos. Pela estrada, o deslocamento pode chegar a uma hora. Com o túnel, o trajeto será feito em até 5 minutos.

Para o consultor portuário Fabrizio Pierdomenico, a ausência das empresas brasileiras na disputa e, ainda assim, a participação de somente dois players no leilão mostra a complexidade da obra inédita no País.

“As duas construtoras já conhecem o Brasil e isso é bom. Em função da complexidade desta construção, poderíamos ter um cenário diferente. Não via nenhuma empresa no Brasil, a não ser que fosse consorciada, com condições de construir esse túnel”, diz ao NeoFeed Pierdomenico, ex-secretário nacional dos Portos.

“A obra traz um certo risco e um grau de incerteza, pelo seu tamanho, mas essa etapa de hoje é um passo muito importante para a concretização desse projeto. Vamos esperar qual vai ser o apetite de cada uma delas no leilão”, completa.

Uma comitiva formada pelo governador Tarcísio de Freitas, técnicos do governo do Estado, representantes do governo federal, como o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, fez um roadshow na Europa, em abril, justamente para apresentar a obra a possíveis investidores internacionais.

No início de agosto, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) emitiu licença prévia para a construção do túnel. O aval ambiental garante a viabilidade do projeto e reduz os riscos para a execução da Parceria Público-Privada (PPP). A emissão da licença antes mesmo do leilão foi visto por especialistas como um indicativo real de que haveria segurança jurídica para a entrada dessas empresas do exterior.

Na quinta-feira, 28 de agosto, o NeoFeed revelou que o impasse em torno de quem seria o dono do túnel após o fim da concessão de 30 anos havia sido solucionado, com a definição de que o equipamento passaria a ser um ativo da União. A confirmação foi dada pelo ministro Jorge Messias, da Advocacia-Geral da União.