Nesta terça-feira, a Comissão Parlamentar de Inquérito da Americanas retomou seus trabalhos com a participação de Sergio Rial, executivo que comandou o grupo por apenas 9 dias, em janeiro deste ano, e que trouxe à tona, na época, o rombo contábil bilionário da operação, alvo agora da CPI na Câmara dos Deputados, em Brasília.

Na audiência pública, durante pouco mais de duas horas, Rial foi alvo de uma série de questionamentos dos parlamentares. Entretanto, quem dominou o debate, de fato, foram outros personagens: Beto Sicupira, Jorge Paulo Lemann e Marcel Telles, os acionistas de referência da varejista.

Não foram poucas as vezes em que o executivo foi perguntado sobre um possível envolvimento do trio no suposto esquema de fraude contábil na empresa. E, em todas as oportunidades, Rial recorreu à mesma tecla para responder aos deputados presentes.

“Essa é uma pergunta recorrente e o que eu posso dizer é que não vi nenhum indício nem antes, nem durante e nem depois em relação a isso”, afirmou Rial. “E não estou aqui como advogado de defesa e nem como assistente de acusação.”

Ele também ressaltou que, no curto período em que esteve à frente da Americanas, não identificou nenhuma ingerência na gestão de Beto Sicupira, o representante do trio no conselho de administração da varejista, que fosse além do papel que cabe tradicionalmente a um membro de um board.

“A minha interação foi limitada”, observou. “Não tive tempo para afirmar categoricamente, mas acho improvável que tenham cruzado essa linha. E todo indício que tive é de que não se sabia que havia algo estruturado.”

O tom adotado veio em linha com o discurso de Leonardo Coelho Pereira, atual CEO da Americanas, em seu depoimento à CPI, em 13 de junho. Na ocasião, o executivo reconheceu que o grupo foi alvo de uma fraude conduzida por ex-diretores, e isentou o trio de acionistas de qualquer envolvimento.

Antes de reforçar esse discurso, Rial abriu a audiência exaltando seu currículo e, na sequência, fez uma cronologia da sua curta relação com a Americanas como CEO. Do primeiro contato, feito por Sicupira, em março de 2022, até o dia 11 de janeiro, quando, além do rombo, anunciou sua saída do cargo.

Entre outros pontos, ele destacou que, diferentemente do que acontece em processos dessa natureza, não houve de fato uma passagem de bastão, com um período para que ele e o antigo CEO, Miguel Gutierrez trabalhassem juntos.

“A determinação do CEO anterior era de que ele sairia em 31 de dezembro de 2022”, disse. “E eu entendo perfeitamente. Havia um certo desapontamento pelo fato de a sucessão não ter ocorrido com um candidato interno.”

Na sequência, Rial mencionou uma apresentação feita por Gutierrez ao board, em 27 de dezembro. E afirmou que só começou a entender a real situação da varejista nos primeiros dias da sua gestão, quando foi alertado por dois diretores sobre alguns pontos no balanço da companhia.

“No dia 4, eu recebo a informação de que o número que eu tinha visto na apresentação, de R$ 15,9 bilhões, era dívida bancária não reportada como dívida”, conta. “Eu levo um soco no estômago e, no mesmo dia, informo os órgãos de governança do que eu havia escutado.”

A partir desse momento, ele disse que sua prioridade foi fazer as diligências e ter o mínimo de conhecimento da situação contábil, e não buscar os culpados. “Isso foi confirmado e, no dia 11, sai o fato relevante e eu renuncio. A empresa estava insolvente e não foi esse o projeto que eu comprei.”

Entre outras questões, o executivo também rebateu as críticas sobre a decisão de publicar o fato relevante, algo que o colocou, inclusive, na mira de um processo da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

“Eu não tinha outra alternativa a não ser fazer o que eu fiz”, observou. “E, hoje, em retrospectiva, oito meses depois, tudo ficou mais claro. O que se tinha efetivamente, a dívida bancária reportada, parece ser um pedaço de algo maior, que vai ser comprovado ou não pelas autoridades.”