Após uma série de turnarounds desde 2013, a BRF parece, enfim, a caminho de ser bem-sucedida em seu quinto plano de reestruturação nesse intervalo, iniciado em meados de 2022. E, num intervalo de menos de 24 horas, a empresa trouxe duas provas de que está vivendo, de fato, um novo momento.

A primeira delas veio na noite da quarta-feira, 13 de novembro, com o anúncio de uma distribuição de juros sobre capital próprio, a primeira desde 2016, no valor de R$ 946 milhões e correspondente ao valor bruto de R$ 0,57 por ação.

O segundo movimento que traduz um cenário mais otimista para a operação foi feito na manhã de quinta-feira, 14 de novembro, quando o grupo de alimentos dono das marcas Sadia e Perdigão deu mais detalhes sobre outros destinos da alocação dos seus recursos.

“Em 2025, teremos um investimento bem superior ao ritmo dos últimos dois anos”, afirmou Fabio Mariano, CFO da BRF, em call com analistas. “Obviamente, precisamos remunerar o capital próprio, há oito anos não fazíamos isso, mas vamos priorizar o crescimento da companhia.”

Uma parcela considerável desse novo plano será aplicada na expansão da capacidade de produção da empresa. E, apenas nessa linha, o executivo afirmou que a BRF já tem um pipeline de projetos no valor de R$ 1 bilhão em avaliação, o que não significa que todos eles serão necessariamente aprovados.

Para se ter uma base de comparação em relação aos últimos anos, o capex total da companhia em 2023 chegou a R$ 3,1 bilhões. Já no acumulado de janeiro a setembro de 2024, o montante foi de R$ 3 bilhões.

“Além de haver sentido e espaço na estrutura, essa é uma ótima sinalização para a nossa base acionária”, observou o CFO. Ele ressaltou que boa parte dos recursos será aplicada em categorias como processados e congelados, de alto valor agregado, além do crescimento da capacidade de abate.

Em termos de geografias, ele citou como alguns prováveis destinos desses aportes plantas que já estão operando próximas de suas capacidades plenas. Esses são os casos, por exemplo, das fábricas em Abu Dhabi e na Arábia Saudita, além de uma unidade de congelados no Brasil.

No que diz respeito à alocação de capital, a BRF também tirou do forno um novo programa de recompra para a aquisição adicional de até 30 milhões de ações. E, como parte dessas discussões, a empresa também foi questionada por analistas sobre a possiblidade de distribuir dividendos extraordinários.

“A estratégia de priorização passa por uma decisão do controlador e da sua estratégia”, afirmou Miguel Gularte, CEO da BRF. “O que temos feito é trabalhar no dia a dia pra que a empresa tenha condições de fazer as suas escolhas. Existe espaço para crescer e retribuir ao acionista.”

Ele se referiu à Marfrig, dona de uma fatia de 50,49% da operação. Gularte, inclusive, atuava como CEO da companhia até agosto de 2022, quando foi anunciado para assumir o mesmo posto na BRF, a partir da indicação da controladora, cujas ações registravam alta de 7,24% por volta das 13h15.

De volta ao campo da BRF, o balanço trimestral que acompanhou a distribuição de juros sobre capital próprio e a recompra de ações também trouxe alguns marcos para a companhia. Entre eles, a maior geração de caixa operacional da sua história, de R$ 3 bilhões, contra R$ 558 milhões um ano antes.

Em outros indicadores, a empresa reduziu sua dívida líquida entre julho e setembro, na base anual, em 33,7%, para R$ 6,86 bilhões, a menor cifra desde 2015. Já a alavancagem saiu de 2,66 vezes para 0,71 vez, o menor patamar da história do grupo.

Programa de eficiência adotado na gestão de Gularte, o BRF+ também registrou índices recorde, ao capturar R$ 330 milhões no trimestre e alcançar a soma de R$ 1,13 bilhão no acumulado de janeiro a setembro.

No trimestre, a BRF reverteu ainda o prejuízo líquido de R$ 262 milhões apurado há um ano ao contabilizar um lucro líquido de R$ 1,13 bilhão. A receita líquida, por sua vez, avançou 12,4%, para R$ 15,5 bilhões, enquanto o Ebtida ajustado cresceu 146,4%, para R$ 2,96 bilhões.

Um novo patamar

Em relatório no qual salientou o “ciclo de pico” da empresa, forte da receita ao lucro, o BTG Pactual ressaltou outros indicadores, como a margem Ebitda ajustada recorde de 19,1%, além do Ebitda ajustado acima do consenso e da geração de fluxo de caixa livre mais robusta.

“Isso permitiu que a BRF anunciasse a distribuição de juros sobre capital próprio, o primeiro desde 2016, juntamente com um novo programa de recompra de ações. Esperamos que venha mais quando o resultado do ano fiscal for divulgado”, escreveu o banco.

Entre outros pontos, os analistas do BTG também observaram que a operação brasileira da BRF “roubou a cena” no período, com uma margem Ebitda recorde de 16,6% e um Ebitda de R$ 1,2 bilhão, 10% acima das projeções do banco.

Ao destacar a frase “que seja eterno enquanto durar”, o BTG disse acreditar que a BRF já superou a fase em que os investidores questionariam sua capacidade de entregar níveis históricos de margem normalizados.

“Mas, a menos que estejamos inclinados a acreditar que as margens e o crescimento de alguma forma aumentaram em relação ao histórico, as avaliações não parecem deixar muito valor a ser capturado”, acrescentou o banco, com recomendação neutra e preço-alvo de R$ 25 para a ação.

Já o Goldman Sachs frisou que o balanço da BRF se fortaleceu ainda mais e que a empresa manteve seu bom momento, ao apontar que o mercado internacional seguiu sendo responsável pela maior parte da “surpresa” na lucratividade da companhia, enquanto o Brasil sustentou margens sólidas.

Ao ressaltar possíveis upsides em frentes como ganhos operacionais contínuos, preços de grãos mais baixos e a abertura de novos mercados – foram 13 habilitados no trimestre e 70 no ano -, o banco manteve, porém, a recomendação neutra e o preço-alvo de R$ 24 para o papel.

As ações da BRF registravam uma ligeira queda de 0,24% na B3 por volta das 13h15, cotadas a R$ 24,88. Os papéis têm uma valorização, no entanto, de 80,1% no acumulado de 2024. A BRF está avaliada em R$ 40,7 bilhões.