Os data centers viraram um dos maiores cases de investimento da nova economia digital. Impulsionado primeiro pela corrida da nuvem e, agora, pela explosão da inteligência artificial, o setor concentra uma enxurrada de capital de grandes fundos e corporações globais.

Grupos como SoftBank e BlackRock se juntam à onda de aportes multibilionários liderados por big techs como Microsoft, Meta, Amazon e Oracle, que ampliam sua infraestrutura para suportar o crescimento vertiginoso da demanda por processamento e armazenamento de dados.

De acordo com estimativas da McKinsey & Company, o mundo deve investir cerca de US$ 6,7 trilhões em data centers até 2030 — um volume inédito na história da infraestrutura digital. Diante de cifras tão expressivas, investidores brasileiros também correm para fazer parte desse rali, cada um à sua maneira.

Seja por meio de parcerias estratégicas, atuação no desenvolvimento imobiliário ou via exposição ao mercado externo, o setor de data centers vem atraindo diferentes perfis de players no País. Em comum, todos estão atentos à expansão acelerada da demanda por capacidade computacional e armazenamento de dados.

Na Reach Capital, gestora com DNA em ações, a escolha tem sido buscar exposição à tese por meio do mercado internacional. A casa aposta em empresas listadas nos Estados Unidos que lideram o desenvolvimento da infraestrutura global.

A gestora não investe diretamente em operadoras de data centers, mas nas empresas que sustentam essa infraestrutura global. A exposição à tese ocorre por três frentes principais: infraestrutura e energia, com apostas em GE Vernova e Brookfield; semicondutores, com Nvidia, TSMC e Broadcom; e big techs, entre elas Amazon, Google, Meta e Microsoft.

“A IA representa um salto de produtividade muito grande. E, em data center, é mais interessante tê-lo localizado perto do consumidor, com energia disponível e acesso às GPUs. Por isso, boa parte desse investimento vai ficar focado nos Estados Unidos”, disse Henrique Lara, sócio e gestor de renda variável da Reach Capital.

De acordo com o mesmo estudo da McKinsey, dos US$ 6,7 trilhões projetados para o setor até 2030, cerca de US$ 5,2 trilhões devem se concentrar em data centers voltados à inteligência artificial — uma frente ainda distante de se tornar realidade no Brasil.

Falta nuvem no Brasil

Por aqui, os principais projetos seguem focados em reduzir o déficit da infraestrutura de nuvem, etapa inicial da digitalização que ainda exige forte expansão de capacidade da infraestrutura local.

Segundo um relatório da Research and Markets, entre 50% e 60% da carga de processamento em nuvem usada por empresas brasileiras ainda roda no exterior, principalmente em servidores situados nos Estados Unidos.

Essa falta de infraestrutura doméstica cria custos de latência mais altos, amplia os riscos de barreiras regulatórias e impõe limitações para workloads de IA e 5G, que exigem processamento próximo do usuário.

Hoje, o Brasil opera com cerca de 700 MW de capacidade instalada (contra 25,6 GW nos Estados Unidos), concentrada principalmente nas regiões de São Paulo e Rio de Janeiro. Segundo o relatório, seria necessário atingir algo em torno de 2.500 MW para que o país alcance autossuficiência em infraestrutura de nuvem.

É com base nessa demanda reprimida por infraestrutura que diversos players locais têm se movimentado para capturar as oportunidades desse novo ciclo de investimentos.

Uma dessas empresas é a Timenow, especializada no planejamento e gestão de grandes obras industriais para companhias como Vale e Gerdau. Recentemente, a empresa firmou uma parceria de exclusividade com a britânica RLB, referência global em projetos de alta complexidade, incluindo data centers de grandes clientes como Microsoft e AWS.

Antônio Toledo, CEO da Timenow, diz que a empresa já está prospectando terrenos no Brasil para a instalação de um data center ligado a um cliente global da RLB, em um estudo que avalia a viabilidade técnica e energética do projeto.

O executivo explica que o objetivo é identificar as regiões mais adequadas em termos de acesso à energia e conectividade, fatores críticos para esse tipo de empreendimento. A RLB, parceira internacional da Timenow, é responsável por projetos semelhantes nos Estados Unidos e na Europa e tem entre seus principais clientes big techs como AWS e Microsoft.

“Essa é uma demanda real no Brasil. Precisamos ter quase que, do ponto de vista de política pública, data centers no país, até para você ter uma política de segurança e soberania de dados. Toda nuvem do Brasil ficar fora do Brasil é um risco”, afirma Toledo.

Dado o nível de investimentos, ele afirma que a tendência é que esse seja um ramo cada vez mais segmentado, com diversos atores a depender da fase do projeto.

Do lado imobiliário

As oportunidades emergentes têm atraído também novos entrantes. Esse é o caso da Tivio, gestora de ativos alternativos, que vem estudando maneiras de ter exposição ao setor de data centers no Brasil, avaliando modelos de investimento que possam se conectar à sua atuação em real estate.

“O que temos observado é uma demanda crescente de operadores globais querendo entender o mercado brasileiro, mas ainda há muitas barreiras — custo de energia, impostos, burocracia”, afirma Marcelo Guerra, do time de gestão imobiliária da Tivio Capital.

Segundo Guerra, o maior desafio para o avanço dos data centers no Brasil é encontrar terrenos com capacidade de conexão e disponibilidade elétrica. “Hoje, existe um gargalo enorme de energia no país”, afirma o executivo.

Um dos pioneiros nesse tipo de investimento no país é a Alianza, que começou a atuar com data centers ainda em 2018, quando adquiriu um condomínio logístico em que dois galpões estavam sendo convertidos para esse tipo de operação.

O modelo é puramente imobiliário: a gestora atua como proprietária do ativo físico, responsável pela construção e ampliação da capacidade elétrica e estrutural, enquanto o operador de data center é quem instala os servidores e administra a operação.

“Não podemos nem entrar. O operador que assume a locação é quem cuida de tudo. Nosso papel termina quando entregamos o prédio pronto, com toda a infraestrutura física — piso elevado, estrutura elétrica, hidráulica e de segurança”, afirma Fabio Carvalho, sócio da Alianza. “É como a gente costuma dizer: a Alianza faz a casca, e o operador coloca o recheio.”

A Alianza possui três ativos em operação, todos localizados na região metropolitana de São Paulo, e mantém planos de expansão em parceria com um fundo soberano internacional.

Os contratos seguem a lógica dos aluguéis atípicos de longo prazo, com duração de 15 anos e garantias travadas para ambas as partes. Essa estrutura proporciona previsibilidade de receita para o investidor e segurança operacional para o operador, que costuma investir múltiplas vezes o valor do prédio em equipamentos e, por isso, raramente muda de endereço.

“O aluguel, no caso de um galpão logístico, representa uma parte relevante do custo da operação. Já em um data center, o imóvel é algo entre 10% e 15% do investimento total. O grosso está na energia e no recheio. Por isso, ninguém muda de endereço. Uma vez instalado, o operador fica por muito tempo, o que garante estabilidade e previsibilidade para o investidor”, diz ele.

Carvalho afirma, no entanto, que apesar da demanda crescente por data centers no Brasil, falta dinheiro para financiamento de novos projetos, uma vez que o país concorre com os Estados Unidos e outras regiões na atração desse capital.

"As big techs têm muito dinheiro, mas não é infinito e o Brasil está atrás da lista de prioridades. Tem gente com projeto de R$ 10 bilhões para fazer, mas não tem de onde tirar o dinheiro, porque não se arruma R$ 10 bilhões no Brasil hoje em dia."