Em um momento no qual gigantes da indústria sucroalcooleira como a São Martinho e outros players estão estocando etanol à espera de uma melhora nos preços do combustível, a francesa Tereos, dona de uma receita global de 5,5 bilhões de euros, está indo em uma direção contrária.

Depois que o governo zerou o PIS/Cofins e a Cide da gasolina, o que fez os preços nas bombas cair – não só o da gasolina como o do etanol, o grupo, com presença em 13 países, passou a buscar alternativas para escoar sua produção. E, ao que parece, encontrou.

A Tereos, dona de sete unidades de processamento e duas refinarias por aqui, vai exportar mais de 25% de sua produção de etanol. “É a primeira vez na nossa história aqui no Brasil que ultrapassamos 10% de exportação”, diz Pierre Santoul, CEO da Tereos no Brasil. Muito disso por conta da inflação na Europa.

Com a Guerra da Ucrânia e a crise de abastecimento de gás no Velho Continente, produzir o etanol que é adicionado na gasolina na Europa ficou muito caro. “O preço do gás passou de 50 euros para 350 euros”, diz Santoul.

Diante disso, a Tereos, que deverá faturar R$ 6 bilhões no Brasil, direcionou boa parte de sua produção brasileira para a região. “Aqui no Brasil, o metro cúbico é vendido entre R$ 2,2 mil e R$ 2,7 mil. Estamos exportando por mais de R$ 4 mil”, diz o executivo. A produção total de etanol da Tereos Brasil na safra 2022/2023 deve atingir 520 milhões de litros.

O crescimento das exportações por parte do grupo vem a reboque de uma conjunção de fatores. Além dos impostos zerados, que fizeram o etanol perder competitividade frente à gasolina, a companhia recebeu duas certificações que abriram mais portas no mercado exterior.

Pierre Santoul, CEO da Tereos no Brasil

Uma de suas unidades recebeu a certificação CARB (California Air Resources Board) que abre espaço nos EUA e atesta baixa emissão de carbono do etanol produzido pela empresa. Outra certificação fundamental foi a Bonsucro European Union Renewable Energy Directive, que permite a exportação a países do continente.

“Por termos operações em vários países, consigo ter mais visibilidade do mercado internacional e esse é um diferencial nosso”, diz Santoul. Principalmente na Europa, onde a Tereos tem mais unidades e o etanol é pouco usado – somente 7% de etanol é adicionado da gasolina enquanto aqui no Brasil são 27%.

“O etanol não estava mapeado como uma fonte alternativa, os carros elétricos estão mais na visão dos europeus”, diz Annelise Izumi, analista da consultoria agro do Itaú BBA. “Mas a questão do preço do gás na Europa está abrindo uma oportunidade para o etanol brasileiro.”

A analista diz que isso pode colocar o produto em uma posição privilegiada no cenário global. “Quando o Brasil produz max etanol (mais etanol do que açúcar em uma safra), o país consegue produzir muito etanol.”

O mercado brasileiro vem sofrendo nos últimos anos com a quebra de safra. “No ano passado, o setor assistiu a maior seca em 100 anos”, diz Leonardo Alencar, head de agro, alimentos e bebidas da XP. “Tivemos uma quebra entre 10% e 15%. E neste ano parece que a moagem será menor.” Os dados apresentados pela Única corroboram com essa visão.

Segundo relatório da entidade, “a moagem de cana-de-açúcar na região Centro-Sul, no acumulado da safra até a segunda quinzena de agosto, totalizou 366,29 milhões de toneladas ante 393,47 milhões de toneladas registradas no mesmo período de 2021 – uma queda de 6,91%.”

Ou seja, o mercado não está fácil para o setor. Além da quebra de safra prevista novamente, das mudanças de tributação que devem deixar a gasolina mais barata por mais tempo do que se esperava, o custo de produção subiu por conta da alta do petróleo, dos fertilizantes e dos defensivos. É preciso encontrar saídas. Algumas delas, como mostra a Tereos, estão no exterior.