A cidade de Cravinhos, que fica na região metropolitana de Ribeirão Preto, a cerca de 300 quilômetros de distância da capital paulista, acompanhou a construção de um centro de distribuição de 38 mil metros quadrados (m²) ao longo do ano de 2024.
Erguido em uma área de 115 mil m², esse espaço passa a ser o centro de distribuição responsável por armazenar, embalar e enviar os produtos dos lojistas do Mercado Livre a partir do início de 2025. O projeto é o primeiro da WTLog, a marca de galpões logísticos que recupera a origem da incorporadora WTorre.
“Se a empresa tem um e-commerce e precisa de um galpão de 30 mil metros quadrados, ela tem poucas possibilidades de achar isso em São Paulo. E, se sair do estado, essa chance cai para quase zero”, afirma Marco Siqueira, CEO da WTorre, em entrevista ao NeoFeed. “É com base nesse cenário que estamos estruturando esse projeto, pois a procura é gigante e o mercado não está conseguindo supri-la.”
Para a nova fase, a incorporadora tem um cheque de R$ 1 bilhão, que será destinado à construção de galpões em diversas regiões do País, como Porto Alegre, Curitiba, Recife, Manaus, Rio de Janeiro e São Paulo.
A WTorre focará em projetos de 100 mil m² de área, com a expectativa de desenvolver cerca de 300 mil m² por ano. Serão investidos cerca de R$ 350 milhões por projeto, desde a compra do terreno até a construção da unidade.
A ideia é ter, pelo menos, 50% do espaço locado para começar a construção. E a negociação anual dos espaços retroalimentará o caixa para reinvestimentos. A WTorre vai usar capital próprio para os investimentos e não vai se alavancar para esses projetos logísticos.
O CD de Cravinhos seguiu esse roteiro com o Mercado Livre. E, antes mesmo de começar a ser desenvolvido, já estava vendido para o fundo imobiliário ALZR11, da Capitânia Investimentos e da Alianza Investimentos, por cerca de R$ 150 milhões.
A WTLog vai explorar regiões mais distantes dos grandes centros, embora a demanda por espaços nesses locais seja menor. A maioria das empresas de desenvolvimento logístico disputa áreas próximas aos grandes centros.
Em São Paulo, por exemplo, a área locada por empresas como Amazon, Magalu, Mercado Livre, Shein e Shopee em um raio de 30 quilômetros da capital cresceu 18,5%, segundo a consultoria Binswanger. Quando se pega uma distância entre 30 quilômetros e 60 quilômetros, a expansão é de 21,6%.
Mas há uma tendência de explorar outras regiões. A Cy Capital, gestora de fundos imobiliários que tem a Cyrela como controladora, por exemplo, captou recentemente para buscar terrenos de 100 mil m² para projetos de 40 mil m² a 50 mil m² nas cidades de Brasília, Belo Horizonte e Rio de Janeiro.
Outra forte concorrente por terrenos em outras praças é a Log, a empresa de galpões logísticos controlada pela família Menin. A companhia tem um plano agressivo de entregar 2 milhões de m² de área bruta locável (ABL) até 2028. Desse total, 40% já está no landbank da empresa. Cidades no Nordeste como Salvador, Fortaleza, Recife, Natal, João Pessoa e Maceió são as preferidas para receber os projetos.
Para a WTLog, essa é uma estratégia de diferenciação. Todo o mercado logístico olha a demanda e a dominância dos e-commerces, mas eles enxergam oportunidades de atender empresas de outros segmentos e setores, que também precisam de espaço de armazenamento.
“A ideia é que tenhamos o nosso produto logístico em todos os principais mercados do país, retirando a centralização do eixo Rio-São Paulo e mostrando as oportunidades que existem em outras regiões”, diz Siqueira.
Com a logística no portfólio, a WTorre projeta elevar seu faturamento de R$ 500 milhões neste ano para R$ 700 milhões em 2025.
Desafios dos galpões logísticos
A incorporadora está à procura de cidades e regiões que foram deixadas de lado pelos grandes fundos da Faria Lima. Na visão da empresa, existem locais com muita disponibilidade de espaço para o desenvolvimento desses galpões, com alta concentração populacional e baixa presença dos empreendimentos.
Abiner Albuquerque, diretor de desenvolvimento da WTorre, afirma que um dos maiores desafios dessa estratégia é encontrar bons terrenos. Segundo ele, de 50 terrenos pesquisados, dez são selecionados e no máximo um ou dois efetivamente se tornam úteis para os galpões.
Esse processo, de entender a viabilidade de um terreno, é custoso e demanda tempo. O executivo explica que é preciso ter pelo menos 200 mil m² de platô (a parte plana do terreno) para atender 100 mil m² de área construída.
“Normalmente, esses terrenos contam com nascentes, área de preservação, linhas de transmissão cortando a área e muitas outras variáveis que inviabilizam o projeto ou mesmo tornam ele muito caro”, afirma Albuquerque. “Às vezes, só para fazer a terraplanagem de um espaço já fica mais caro do que o preço do terreno em si.”
O executivo explica, ainda, que o valor do terreno é a única variável que a WTorre consegue controlar ao longo do processo, já que o custo da construção do galpão é uma commodity e todo mundo oferece algo semelhante.
Até o momento, a WTorre não tem seu próprio fundo de investimento imobiliário para deixar esses projetos dentro de casa, mas essa é uma possibilidade que a empresa está de olho no médio prazo.
Altos e baixos
Criada pelo empresário Walter Torre (1956-2020) no início dos anos 1980, a WTorre tem oito milhões de metros quadrados construídos ao longo de sua trajetória, sendo 70% desse montante alocado em galpões. Mas, nos últimos anos, a empresa se aventurou no setor de entretenimento.
A companhia foi responsável, por exemplo, pela construção do Allianz Parque e do Teatro Santander. Mas, nos últimos dez anos, a empresa passou por altos e baixos. Ela se envolveu em polêmicas e teve seu nome citado nas operações Lava Jato e Greenfield. Desde lá, a companhia renegociou dívidas superiores a R$ 1,5 bilhão com grandes bancos e reduziu seu tamanho.
A questão mais recente envolvia o clube de futebol Palmeiras. No último mês, os dois se acertaram, pondo fim em uma batalha judicial que durou quase uma década em torno da gestão do Allianz Parque e os repasses de suas receitas. No acordo, a WTorre ficou de pagar R$ 117 milhões ao time por meio de troca de serviços como a suspensão do aluguel de camarotes, loja oficial e do museu.