Foi durante a sua passagem como CEO do banco Losango, entre 2015 e 2017, que o engenheiro Marcelo Villela se deu conta de que era hora de olhar com mais atenção para a oferta de crédito às classes C e D. Isso não se resumia a conceder empréstimos com taxas mais justas, mas também facilitar o acesso a esse capital de diferentes maneiras.

Com esse plano em mente, Villela fundou a Bullla, em 2017. A empresa nasceu com uma plataforma para facilitar o empréstimo entre pessoas. Em 2020, passou a ter um cartão de adiantamento salarial, produto que se tornou o seu carro-chefe, com mais de R$ 170 milhões em crédito concedidos em 2021.

Agora, a meta é atacar o mercado de benefícios. Para isso, no início desse mês, a Bullla lançou um cartão de benefícios, o Bullla Flex. “É preciso ter uma solução para originar crédito de forma diferente e que fuja dos produtos tradicionais”, diz Marcelo Villela, fundador e CEO da Bullla, ao NeoFeed.

O produto segue os moldes de cartões de empresas como Flash e Caju, em que o funcionário recebe um determinado valor de crédito e pode utilizá-lo como bem entender, sem estar restrito a compras em restaurantes (como no vale-refeição) ou em supermercados e mercearias (como no vale-alimentação).

A chegada da Bullla a esse espaço coloca mais fogo na disputa pelo mercado de benefícios que durante anos foi dominado por companhias como Alelo, Ticket, Sodexo e VR Benefícios. Com mais de 300 mil empresas, 22 milhões de trabalhadores, o setor movimenta cerca de R$ 150 bilhões por ano.

Outra concorrente nesta disputa é a startup francesa Swile, que desembarcou no Brasil em fevereiro de 2021, ao comprar a operação da Vee Benefícios. E que, em outubro do mesmo ano, alcançou o patamar de unicórnio após uma rodada de US$ 200 milhões, liderada pelo Softbank.

Novata nessa corrida, a Bulla larga com um cliente, que já emitiu 14 mil cartões. Até o fim do ano, a previsão é ter 2 mil empresas cadastradas – boa parte delas com mais de mil funcionários.

Para chegar a esse número, o plano é explorar a própria base de companhias que já são clientes no produto de antecipação salarial, uma carteira que, atualmente, tem mais de mil empresas.

Isso tende a funcionar como uma via de mão dupla.  A expectativa é de que o cartão de benefícios atraia mais clientes para a fintech. Com essa estratégia, a previsão é fechar 2022 com uma receita de R$ 50 milhões, contra R$ 20 milhões no ano passado.

A empresa também projeta encerrar 2022 com mais de 500 mil cartões de adiantamento salarial emitidos e R$ 340 milhões em crédito concedidos. O volume representa uma alta de 66% sobre os R$ 204 milhões registrados em 2021.

Ao contrário de outras startups, como a Flash, por exemplo, que já captou mais de US$ 130 milhões com investidores, a Bullla desenvolveu sua operação, até o momento, apenas com recursos próprios. “Existem conversas para captar um aporte, mas não quero queimar dinheiro. Já somos lucrativos”, diz Villela.

Adiantamento salarial

Ainda que a Bullla esteja entrando no mercado de benefícios corporativos, onde vai competir diretamente com a Flash, que já tem mais de 2.000 empresas cadastradas, entre elas Cimed, Loggi, GuiaBolso, Dazn, entre outras, a tendência é de que a maior aposta da fintech siga sendo o seu produto de adiantamento salarial. Nesse caso, a disputa envolve startups como Deel e Leve.

A Bullla permite que os trabalhadores antecipem até 30% do salário a custo zero. O juro só incide em operações em que o valor supere esse índice. “Onde eu ganho? Quando ele passa a buscar crédito e arca com juros”, diz Villela.

Nesse modelo, é possível antecipar o pagamento de até dois salários. Mas isso não significa que o trabalhador ficará sem receber qualquer dinheiro por dois meses para pagar pelo crédito antecipado. O valor é parcelado e deduzido posteriormente.

Villela explica que a ideia é alcançar um público ainda à margem do mercado de crédito, seja por estar negativado ou por enfrentar altas taxas de juros impostas em empréstimos – e que se tornaram mais agressivas com a disparada da Selic nos últimos meses.

Uma pesquisa recente feita pela empresa de meios de pagamento Valecard apontou que 74% dos brasileiros que pedem o adiantamento salarial usam o dinheiro para comprar comida. Já 14% dos solicitantes gastam o valor com combustível, enquanto 7% usam o dinheiro para gastos com farmácia.