Em 2017, três colegas da faculdade tomaram uma corajosa, para não dizer ousada, decisão para quem tinha apenas 24 anos de idade: fundar uma gestora para investir em empresas com teses consolidadas e que apresentassem um ritmo de crescimento acelerado.
Sem seed money para se apoiarem e com pouca experiência no mercado, Bernardo Garcia, Fernando Jamra e João Paulo Maia não se intimidaram e foram em frente. E cinco anos depois, o trio mostrou que a aposta que fizeram em aplicar a lógica fundamentalista e de value creation em empresas no middle market foi bastante acertada.
Com R$ 315 milhões em ativos sob gestão, o portfólio da Shift Capital registra uma valorização de 2,5 vezes do capital investido em um prazo médio de apenas dois anos. As apostas são nomes em ascensão, como a rede de microcafeterias The Coffee e a locadora de automóveis Kovi. E, agora, com a tese de investimento consolidada, a gestora parte em busca de consolidar seu plano de investir até R$ 60 milhões em 2023.
“A gente aposta em empresas que já passaram aqueles riscos iniciais, que é o risco que o mercado chama de venture capital, empresas que já tem um produto super bem desenvolvido, que já fizeram um go to market e já tem um bom faturamento”, diz Fernando Jamra, um dos sócios-fundadores da Shift Capital, ao NeoFeed.
Ele conta que a Shift está em busca de empresas com faturamento anual entre R$ 15 milhões a R$ 70 milhões por ano e que tem como desafio ganhar escala.
O foco são empresas ligadas à economia real, mas que tenham uma camada de tecnologia, como foi o caso com a Paketá Crédito. A Shift investiu, em 2020, R$ 9 milhões na companhia, que atua num segmento bastante tradicional da economia brasileira, o crédito consignado. A diferença é que ela faz uso intenso de tecnologia para automatizar processos e de dados para oferecer menores taxas a quem quer tomar empréstimo.
“Dificilmente vamos apostar numa companhia que vai criar um setor, causar uma grande disrupção, porque isso envolve um grande risco”, diz Jamra. “Gostamos de modelos de negócios mais defensivos, em setores mais tradicionais.”
O montante que a Shift tem separado para investir em 2023 vêm do primeiro fundo estruturado pela casa, colocado de pé em setembro de 2022, o Shift Alpha I. Antes disso, a gestora recorria a club deals, com o qual conseguiu investir em oito companhias.
O plano é que o Shift Alpha I tenha até R$ 250 milhões. No first closing, a gestora levantou cerca de um terço do valor estabelecido, o que dá cerca de R$ 83 milhões. Sem revelar nomes, Jamra diz que a maior parte dos investidores são multi e single family offices, e alguns poucos indivíduos do mercado financeiro com quem o trio desenvolveu relacionamentos.
O primeiro investimento por meio do fundo ocorreu em outubro do ano passado, quando a Shift liderou a rodada de captação de R$ 20 milhões da Zerezes, aportando R$ 12,5 milhões na marca de óculos.
A ideia da gestora é que o Shift Alpha I invista em nove ou dez empresas, realizando no máximo três investimentos por ano. Os cheques podem partir de R$ 12,5 milhões e chegar até R$ 20 milhões, em troca de 10% a 30% do capital social dessas companhias.
“O fundo é mais concentrado (em poucas empresas) do que a média do mercado, e com ritmo de investimento bem cadenciado”, diz Jamra. “Isso significa que a gente vai demorar três anos para alocar esse fundo.”
Com o processo de prospecção a todo vapor, envolvendo o time da Shift Capital tendo analisado 1,6 mil empresas no ano passado e iniciando conversas com 650 empreendedores, a expectativa é de anunciar algum aporte já no primeiro trimestre.
DNA operacional
Mais do que apenas ter uma fatia numa companhia considerada promissora, a Shift gosta de se envolver na gestão, entendendo que é um aspecto fundamental quando se trata de ajudar no crescimento das companhias. “Nós temos um DNA muito operacional”, diz Jamra.
Esse DNA operacional foi consolidado no começo da história da casa, em 2017, quando o trio quis investir na BlueFit. Eles apresentaram uma proposta de investimento para a rede de academias, mas o fato de serem jovens e sem qualquer histórico no mercado fez com que a iniciativa não avançasse.
A solução que encontraram foi se tornarem os representantes oficiais da franquia no Centro-Oeste, criando uma estrutura lateral da Shift, chamada Shift Fitness. Colocando R$ 200 mil do próprio bolso e se alavancando financeiramente, a ponto de envolver os pais como avalistas, eles começaram a atuar na região.
Adotando estratégias como inaugurar unidades com espaços amplos, investir pesado em marketing e focar em aulas coletivas, eles tornaram a Shift Fitness uma importante operação dentro do grupo Bluefit, com quase R$ 60 milhões em faturamento no ano passado e margem Ebitda de 40%.
Esses resultados fizeram com que a Shift Fitness fosse incorporada pela rede de academias em outubro do ano passado e João Paulo Maia acabou assumindo como CEO.
A partir deste aprendizado, a Shift entendeu o valor de estar próximo do dia a dia de suas investidas. Por mais que as empresas estejam em estágios um pouco mais avançados, Jamra afirma que algumas ainda precisam evoluir em certos aspectos, como em governança corporativa ou controle das finanças.
“Essas empresas que crescem rápido eventualmente têm déficits de gestão e a gente está disponível e tem o conhecimento para ajudar as empresas”, afirma Jamra.
Tudo isso visa a deixar as companhias preparadas para crescer e ser em rentáveis, possibilitando a Shift sair do investimento. Sem planos, nem conversas para realizar desinvestimentos neste momento, Jamra diz que a Shift deve priorizar a venda para algum investidor estratégico quando o momento certo chegar.
“A gente não quer depender de janela de IPO porque é wishful thinking, fora que estamos no Brasil, que também é um risco”, diz ele.