As “máfias” estão em alta... no setor de tecnologia. Mas não há nada pejorativo, neste caso, com o termo “máfia”. A expressão foi popularizada no Vale do Silício e a mais conhecida delas é a do PayPal, cujos fundadores criaram outras empresas bilionárias, como Reid Hoffman, que fundou o LinkedIn; Peter Thiel, que criou a Palantir; e Elon Musk, o multibilionário fundador da Tesla e da SpaceX.
Agora, as “máfias” tech estão ficando mais populares na América Latina. Uma pesquisa realizada pelas gestoras de venture capital Atlantico e Norte Ventures mostrou quais empresas geraram mais startups. Rappi, Stone e Mercado Livre, nesta ordem, lideraram o ranking.
“A existência de tech máfias mostra que o mercado de venture capital latino-americano amadureceu: já não dependemos de um unicórnio isolado, mas de ondas sucessivas de empreendedores que aplicam playbooks comprovados”, diz Gustavo Ahrends, sócio da Norte Ventures, ao NeoFeed.
A pesquisa teve alguns critérios para definir as “máfias”. Primeiro, escolheu apenas os unicórnios, como são chamadas as companhias avaliadas em mais de US$ 1 bilhão. E só contou as startups que receberam ao menos US$ 1 milhão em aportes. No total, 136 empresas passaram por essa régua.
Pessoas que trabalharam no Rappi fundaram 27 startups. Na Stone, 14. E o Mercado Livre, 13. A lista inclui ainda Creditas (12 startups), Nubank (12), iFood (11), 99 (9), Loft (9), QuintoAndar (9), Wildlife (8) e Decolar (7).
“Não surpreende que a maior máfia seja a da Rappi: além de levantar bilhões em capital ao longo dos anos, a empresa funcionou como um laboratório de iniciativas em múltiplos setores — de delivery a fintech — formando uma geração inteira de executivos prontos para criar os próximos unicórnios da região”, afirma Ahrends.
Exemplos de startups que surgiram de empreendedores que atuaram na Rappi são a BHub, de Jorge Vargas Neto; a Yuno, que atua em pagamentos, de Juan Pablo Ortega e Julian Nunez; e a Vammo, startup de aluguel de motos elétricas para entregadores de aplicativos e motoboys, de Jack Sarvary.
Apesar disso, a Rappi, que nasceu na Colômbia, ficou para trás na guerra do delivery do mercado brasileiro, perdendo espaço para o iFood, que é dono de uma fatia estimada em 80% nessa área. Agora, com um cheque da Amazon, a startup fundada por Sebastian Mejia entra de novo nessa disputa, em um momento em que 99Food e Keeta, da Meituan, tentam desafiar o iFood.
As pessoas que trabalharam na Stone criaram a Conta Simples (Ricardo Gottschalk), Fintalk (Luiz Lobo) e a Brex, fintech fundada por Henrique Dubugras e Pedro Franceschi, avaliada em US$ 12,4 bilhões. No caso do Mercado Livre, a lista inclui Elevva (Felix Tomas Elizalde) e Pomelo (Hernan Corral).
A pesquisa de Atlantico e Norte Ventures traz outro ângulo que mostra o poder das máfias tech. Os empreendedores que saem dessas empresas conseguem levantar mais capital. Nas rodadas seed, o cheque é até seis vezes maior do que a média do mercado latino-americano. Nas séries A, o aporte é três vezes maior.
“Fundadores vindos dessas máfias captam mais porque carregam um selo de confiança”, diz Ahrends. “Já provaram que sabem escalar negócios bilionários, atraem capital global e têm uma rede pronta para acelerar o próximo ciclo.”
Outro dado da pesquisa refere-se aos down rounds. Eles aumentaram três vezes desde o pico de valuation em 2021 — neste ano, 8% das rodadas foram abaixo do valor do aporte anterior. No ano passado, isso aconteceu em 21% dos rounds. A boa notícia é que esse é o mesmo patamar dos Estados Unidos.
Apesar de o ritmo de novas rodadas estar devagar, um sinal de que está mais difícil levantar capital, a pesquisa mostra que os fundos de venture capital estão com o caixa cheio: contam com US$ 3 bilhões para investir em startups da América Latina.