Em junho deste ano investidores brasileiros receberam uma mensagem da plataforma de investimento Launchbay com uma proposta para investir na startup brasileira de real estate Loft com uma desconto de 80% em comparação a sua última rodada, quando foi avaliada em US$ 2,9 bilhões, em 2021.
É comum que plataformas como a Launchbay, que atuam no mercado secundário vendendo ações de empresas privadas, terem ofertas com descontos generosos (em geral, são de papéis de funcionários que estão querendo liquidez e topam a transação).
Mas a oferta primária da Launchbay, a qual o NeoFeed teve acesso e que ficou ativa até o dia 31 de junho deste ano na plataforma, mostra muito mais do que uma proposta de venda de ações da Loft, fundada pelo alemão Florian Hagenbuch e pelo húngaro Mate Pencz. Ela traz informações de uma rodada de dívida que a startup captou com seus investidores, que avaliou a companhia em US$ 520 milhões.
De acordo com o documento, a Loft fez uma captação de uma dívida conversível em ações de US$ 100 milhões, com um valuation cap de US$ 1,3 bilhão com desconto de 25%. Um valuation cap estabelece o preço máximo que uma convertible note será convertida em ações.
Um exemplo: se, em uma próxima rodada, a companhia for avaliada em US$ 2 bilhões, as ações dos investidores dessa dívida vão ser convertidas pelo valor de US$ 1,3 bilhão. Se for em US$ 1 bilhão, há um desconto de 25%. Então, a conversão é pelo valor de US$ 750 milhões. “Sempre vale o que for menor”, explica um investidor ao NeoFeed.
Mas os atuais acionistas tinham garantias especiais que permitiam participar por um valor de US$ 520 milhões. “A rodada será quase inteiramente tomada pela Andreessen Horowitz (a16z) e outros investidores, incluindo os fundadores”, diz um trecho do documento. “Temos as condições de investir nos mesmos termos.”
Procurada pelo NeoFeed, a Loft, em nota, negou as informações e acrescentou que elas estão incorretas e não correspondem aos fatos, sendo pura especulações de mercado. Ao mesmo tempo, a startup informou que não permite transações secundárias sem autorização expressa. Na plataforma, a oferta era descrita como primária.
“A Loft informa que notificou a plataforma de que não há qualquer operação em curso no momento. O referido documento foi retirado da plataforma”, diz um trecho da nota. Por volta das 7h30 desta quinta-feira, 27 de julho, as informações da venda ainda estavam na Launchbay, mas o documento não podia ser acessado.
O NeoFeed conversou com alguns investidores que disseram que a Launchbay é uma plataforma conhecida no mercado e respeitada por empreendedores e investidores. Assim como ela, existem diversas outras que negociam ações de empresas privadas.
“Isso é algo bastante comum no mercado”, diz um investidor. “E é muito improvável que ela (a Launchbay) esteja vendendo essas ações nessas condições se não tivesse acesso ao papel.”
Segundo apurou o NeoFeed, essa mesma oferta que apareceu na Launchbay estava sendo oferecida no começo do ano pela Loft e estava quase que inteiramente tomada pela Andreessen Horowitz, como diz o documento. Esse aporte seria um “bridge” para uma rodada de equity que a Loft está negociando e que pode ser anunciada em breve, de acordo com uma fonte.
Essa nova rodada de equity deve trazer um novo investidor ao cap table da Loft. E deve vir junto com uma reestruturação dos atuais acionistas, o que, na visão dessa fonte, deve tornar a captação muito complexa e exigirá uma engenharia difícil de ser equacionada sem causar descontentamentos.
Em busca do breakeven
As rodadas de dívida têm sido bastante procuradas porque não geram diluição dos acionistas e dos fundadores e não podem ser consideradas uma marcação de valor de mercado. Mas, na prática, é o que vai acontecer quando a dívida da Loft for convertida.
“Esse é o valuation que os investidores estão dizendo que a Loft vale nessa rodada”, diz ao NeoFeed um investidor que recebeu o documento. “Na verdade, a Loft, na visão dos investidores, vale US$ 520 milhões.”
A Loft tem uma longa lista de investidores. Um dos mais importantes é a Andreessen Horowitz, que investiu na série A, em 2018, e coliderou as séries B e C. Ela também participou da série D, quando a empresa captou US$ 425 milhões. Segundo o Crunchbase, a empresa já levantou US$ 788 milhões.
Outros investidores da Loft são D1 Capital Partners, Advent International, DST, QED Investors, Vulcan Capital, Soros Fund Management, CPP Investments, GIC (o fundo soberano de Cingapura), Silver Lake Partners, Tarsadia e Tiger Global Management.
Entre os investidores brasileiros estão Canary e Monashees - esta, inclusive, havia remarcado o investimento em relatório anual de 2022 com uma queda de 30% em relação ao investimento que havia feito na Loft, segundo um documento distribuído a investidores em 2023.
O documento da Launchbay mostra também alguns dos números da Loft. De acordo com ele, o GMV atingiu R$ 2,6 bilhões em 2022, contra R$ 1,6 bilhão em 2021. A receita foi de R$ 122 milhões e a estimativa é chegar a R$ 170 milhões neste ano. A Loft, por meio de nota, informa que essas informações estão erradas e não correspondem aos fatos.
Outra informação que o documento da Launchbay traz é que a Loft trabalha para conseguir o breakeven no primeiro trimestre de 2024. A Loft diz que “o atingimento do breakeven é uma realidade a se confirmar muito em breve com aumento da receita e redução dos custos”.
A Loft foi uma das startups que mais demitiu em meio a uma mudança de humor dos investidores no ano passado. Após um período de alta liquidez e de valuations considerados irreais em muitos casos, o acesso ao capital ficou mais difícil. No total, foram quatro rodadas de cortes que somaram 1.195 funcionários. A última delas aconteceu em março deste ano, quando 340 pessoas perderam o emprego.
Os fundadores da Loft, Hagenbuch e Pencz, também criaram a Printi, que presta serviços de gráfica digital e foi vendida para a irlandesa Cimpress, e são sócios do fundo Canary. No mercado, eles têm fama de serem bons em captar.
Tanto que conseguiram fazer a Loft se tornar um unicórnio, como são chamadas startups avaliadas em mais de US$ 1 bilhão, em apenas 16 meses – na época, em janeiro de 2020, foi o mais rápido unicórnio brasileiro.
Em novembro do ano passado, a Bloomberg Linea publicou que a Loft tinha feito uma captação com a Andreessen Horowitz que a avaliou em US$ 1 bilhão. Na ocasião, a Loft negou também a informação.
A companhia foi fundada em 2018 e comprava apartamentos, reformava-os e os revendia. Ao longo do tempo, foi ajustando seu modelo de negócio com a criação de um marketplace.
Além disso, entrou na área de financiamento com a compra da CrediHome e da CredPago, ambas em 2021. A primeira atua com financiamento e home equity. A segunda com garantia locatícia. A Loft tem também uma área de CRM e inteligência de dados chamada Vista.