Em semana de rebote do IPCA que deve saltar em fevereiro e compensar a forte queda de janeiro pelo bônus de Itaipu que derrubou o preço da energia elétrica, o mercado vai ter que se desdobrar para monitorar a guerra comercial deflagrada por Donald Trump e as consequências de dois eventos locais que se impõem com a volta do governo e do Congresso ao batente.
Cobram atenção pelo tom de reforma ministerial, a posse de Gleisi Hoffmann na Secretaria de Relações Institucionais da presidência da República e de Alexandre Padilha no Ministério da Saúde na segunda-feira, 10 de março, e a corrida para a aprovação do Orçamento de 2025, a partir de terça, 11 de fevereiro.
Por duras críticas às políticas fiscal e monetária, Hoffmann, agora ministra palaciana, é considerada antagonista do titular da Fazenda Fernando Haddad que voltará aos holofotes com a tramitação do Orçamento. O texto, enviado ao Congresso em agosto, deveria ter sido aprovado em dezembro, mas deu lugar ao “pacote de corte de gastos” encaminhado pelo Executivo em novembro e à finalização da Reforma Tributária sobre o consumo.
Com previsão de economizar R$ 70 bilhões em dois anos, 2025 e 2026, o “pacote” impôs ajustes à proposta orçamentária que começará a ser discutida a partir de terça-feira, 11 de março, na Comissão Mista do Orçamento (CMO). E poderá ser votada em 17 ou 18 de março na CMO e em sessão conjunta do Congresso, segundo o relator da matéria, senador Angelo Coronel (PSD-BA).
Os ajustes no Orçamento vão desde a inclusão de programas desconsiderados na versão original – Pé-de-Meia já aprovado pelo Congresso e o Vale-Gás ainda não aprovado – até projeções de receitas e parâmetros econômico-financeiros. Indicadores aplicados aos cálculos mudaram substancialmente no último bimestre, quando o dólar disparou por descrédito na política fiscal e vitória de Trump à presidência dos EUA.
Na proposta orçamentária original, o PIB real foi estimado em 2,64%. Atualmente, o Ministério da Fazenda prevê expansão de 2,3% e a Focus, 2,01%. A inflação contemplada no Orçamento é de 3,30% pelo IPCA, a Focus aponta 5,65%. A Selic, de 9,61%, está muito aquém de cerca de 15% calculada pelo mercado. O dólar, de R$ 5,19 na peça original está subavaliado ante previsão Focus de R$ 5,95. E o salário mínimo, fixado em R$ 1.509,00, entrou em vigor em janeiro a R$ 1.518,00.
O Orçamento total para este ano, na proposta enviada ao Congresso em agosto passado, é de R$ 5,87 trilhões. O aumento real de receitas é de 5,78%. As despesas poderão crescer até 2,5%, como reza o arcabouço fiscal. O resultado primário deve ser zero, idêntico à meta definida e cumprida em 2024.
Vetos podem retardar (ainda mais) o Orçamento
Antes dos ajustes que o relatório final deverá apresentar, o Orçamento de 2025 prevê reserva de R$ 38,9 bilhões para emendas parlamentares impositivas que se tornaram um capítulo à parte na discussão orçamentária e chegaram a ser suspensas pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Após idas e vindas e um bocado de indisposição entre o Judiciário e o Legislativo, entre o pré e o pós-carnaval, os ministros da Corte aprovaram, por unanimidade, o plano de trabalho apresentado pelo Executivo e Congresso para garantir mais transparência e rastreabilidade das emendas parlamentares.
Com a solução do impasse, a liberação de parte das emendas poderá ser retomada. Procedimento que deverá destravar a discussão e a avaliação do Orçamento, cuja aprovação é necessária para colocar o País em marcha.
Contudo, o Orçamento não entra em vigor da noite para o dia. E mesmo sua aprovação pode enfrentar dificuldades (e mais atraso) por pressão parlamentar para a derrubada de vetos presidenciais. Em particular, quanto à isenção de fundos de investimento imobiliário e agroindustrial (FIIs e Fiagros).
Aprovado na CMO e no plenário do Congresso, o Orçamento segue à sanção do presidente Lula que poderá vetar decisões impostas por parlamentares. Um trâmite que catalisa a atenção do mercado financeiro porque o primeiro trimestre estará encerrado em breve e há urgência na normalização de pagamentos. Dependentes, portanto, da liberação de verbas.
O reajuste do funcionalismo, decorrente da formalização de 38 acordos firmados pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos e com efeito retroativo a 1º de janeiro, é uma das faturas a ser atendida. Se o Orçamento for sancionado até meados de março, o reajuste médio de 27%, acumulado até 2026, entra na folha de pagamento de 1º de abril.
De olho no Congresso, servidores lançaram uma jornada de lutas pela aprovação do texto entre 11 e 12 de março, propondo paralisação das atividades por 48 horas nessas datas. Porém, a perspectiva é de aprovação na semana seguinte para, depois, ser chancelada por Lula.
A liberação do Plano Safra 2024/2025 – cujo atraso indispõe a bancada ruralista contra o Executivo e num momento em que o governo tenta conter a alta de preços dos alimentos – também depende desse ritual. E levou o governo a garantir, por MP de 24 de fevereiro, crédito extra de R$ 4 bilhões para recompor linhas de financiamento a produtores.
O atraso do Orçamento também poderá retardar a divulgação do Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas do 1º Bimestre prevista para 21 de março. Sem o Orçamento, o governo poderá elaborar um relatório extemporâneo e, dessa forma, evitar maiores questionamentos sobre a política fiscal.
Essa prestação bimestral de contas é relevante porque é a partir dela que o governo anuncia bloqueio e/ou contingenciamento de despesas, se necessário, mirando o cumprimento do arcabouço e da meta fiscal. Para o mercado, as informações são um termômetro sobre o equilíbrio das contas públicas com potencial para elevar (ou não) a confiança na política fiscal – ainda que a expansão da dívida pública continue despertando críticas e preocupação.
Em tempo: o bloqueio de despesas ocorre quando os gastos obrigatórios crescem mais que o esperado e devem ser contidos para não estourar o limite estabelecido pelo arcabouço fiscal; o contingenciamento se dá quando há frustração de receitas e é necessário segurar gastos para cumprir a meta fiscal.