Um relatório da OCDE, organização internacional composta de 38 países, divulgado na segunda-feira, 2 de junho, em Paris, jogou um balde de água fria na estratégia de muitos países de adotar práticas protecionistas visando a reduzir a dependência de cadeias de suprimentos globais, como resultado da deterioração do ambiente geopolítico.

De acordo com o estudo, denominado Revisão da Resiliência da Cadeia de Suprimentos da OCDE, a relocalização agressiva das cadeias de suprimentos poderia reduzir o comércio global em 18%, sendo que alguns países - em especial os mais ricos -, perderiam até 12% do PIB em comparação com a insistência em um regime comercial globalizado.

A OCDE usou modelagem econométrica para avaliar o impacto da relocalização das cadeias de suprimento – o termo “relocalização” foi definido como a imposição de tarifas de importação mais altas, o uso de subsídios para incentivar a produção nacional e a imposição de restrições ao fornecimento de insumos de determinados países.

Marion Jansen, chefe da diretoria de comércio e agricultura da OCDE, afirma que o relatório forneceu uma contranarrativa cautelosa às economias avançadas, que corriam o risco de se inclinar demais na direção da nacionalização das cadeias de suprimento ou no chamado nearshoring – a busca por fornecedores geograficamente mais próximos.

“No passado, talvez subestimássemos o risco de dependência excessiva de um único parceiro comercial, mas ir longe demais em direção à localização e evitar o comércio internacional seria outro erro, deixando-nos expostos a choques domésticos e enormes ineficiências”, afirma Jansen.

O relatório constata que a ascensão da China como uma potência industrial nos últimos 25 anos alterou o equilíbrio comercial numa economia globalizada. Desde 2009, de acordo com a OCDE, as restrições à exportação de matérias-primas industriais críticas aumentaram cinco vezes, com a China se tornando um parceiro comercial dominante para um número crescente de países.

A análise concluiu que a dependência da China “aumentou consideravelmente” para vários países e regiões membros da OCDE desde meados da década de 1990, particularmente em setores de manufatura avançada, como automóveis, produtos farmacêuticos, elevadores e peças de máquinas.

Neste sentido, Canadá, França, Alemanha e Reino Unido foram os mais expostos a choques na cadeia de suprimentos, enquanto países que dependiam mais da produção nacional, incluindo EUA, Brasil e China, foram relativamente menos expostos.

No início da década de 2020, o estudo descobriu que a China era o principal parceiro comercial em 30% dos casos em que os países tinham “importações significativamente concentradas”, em comparação com 5% no final da década de 1990.

Para os membros da OCDE, no entanto, essas dependências eram frequentemente “mútuas”, ocorrendo em ambas as direções, enquanto para outras grandes economias não pertencentes à OCDE, como Brasil, Índia, Indonésia e África do Sul, o crescimento da dependência das importações com a China “parece mais unilateral”.

Ainda assim, a modelagem indicou que a relocalização da cadeia de suprimentos não tornou os países mais resilientes a choques externos, com mais da metade das economias se tornando mais vulneráveis a expansões e recessões do que se tivessem continuado com o regime global interconectado.

“Isso contraria algumas das alegações no debate geral sobre os riscos das cadeias globais de valor”, aponta o relatório, acrescentando que “a abertura e a diversificação geográfica” oferecem maiores opções para se ajustar às interrupções.

EUA em baixa

Outro levantamento, que analisa as classificações de favorabilidade global de comércio dos países, divulgado pela consultoria americana Morning Consult, mostra que a política comercial dos EUA afetou negativamente a imagem do país – e, em contrapartida, melhorou a da China.

A Morning Consult entrevistou adultos em 41 países incluindo Canadá, França, Japão, Rússia e Reino Unido. Os dados rastreiam as classificações líquidas de favorabilidade, que são a proporção de entrevistados com uma visão positiva de um país menos aqueles com uma visão negativa.

No final de maio, a China tinha uma classificação de favorabilidade líquida de 8,8, em comparação com -1,5 para os EUA, de acordo com dados de favorabilidade do mês passado. Em janeiro de 2024, a classificação dos EUA estava acima de 20 e a China estava em território negativo.

A classificação da China era negativa desde outubro de 2020, quando a Morning Consult começou a monitorar os dados. A tendência passou a ser positiva após o dia das eleições do ano passado e se consolidou em março, incluindo uma forte alta após os anúncios de tarifas do "Dia da Libertação" de Trump

A queda na reputação dos EUA está custando caro ao país economicamente, por meio da queda no número de visitantes estrangeiros desanimados pelas políticas da Casa Branca e até mesmo do declínio do dólar.

"À medida que a visão sobre os Estados Unidos piora, as oportunidades de comércio e investimento para empresas americanas que fazem negócios no exterior também podem diminuir, já que os consumidores evitam os produtos e oportunidades de emprego que eles oferecem", afirma Jason McMann, chefe de inteligência política da Morning Consult.