A Ursula, startup brasileira que introduz emoção à inteligência artificial, entrou para o "time" da Prosus, gigante global de tecnologia que também controla negócios como iFood e OLX na América Latina, ao lado da Worldbuild.vc e da Village Global, apoiada por Bill Gates, Bob Iger e Jeff Bezos.
Além da Prosus, que liderou a rodada de captação, participaram a Betaworks e Norte Ventures, além de investidores-anjo. O cheque foi de R$ 20 milhões.
O negócio central da Ursula é criar uma plataforma para personagens digitais “vivos”, com IA emocional, que podem ser licenciados ou integrados em produtos de terceiros.
A ideia é que desenvolvedores de games, apps ou até marcas usem essa tecnologia para inserir avatares que interagem, demonstram sentimentos e mudam com o tempo — algo que foge dos NPCs [Non-Player Character] ou assistentes virtuais comuns, que só seguem scripts fixos.
Segundo a empresa, já há conversas com estúdios de mídia, empresas de brinquedo e produtoras de filmes interessados em usar a tecnologia para criar novas experiências digitais.
Além do foco em licenciar a tecnologia para estúdios e marcas — o coração do modelo B2B da empresa —, a Ursula quer também criar suas próprias experiências diretas ao consumidor, como forma de testar e demonstrar o potencial máximo da plataforma.
“É como a Epic Games, que tem a Unreal Engine mas também faz o Fortnite para mostrar o que é possível”, compara Pedro Passarelli, CEO e cofundador da Ursula ao lado de Jonathan da Silva.
O objetivo é posicionar a startup como a engine que vai dar vida a personagens digitais em larga escala, sejam eles criações originais ou ícones já conhecidos do público.
Para dar vida a esses personagens, a Ursula combina diferentes camadas de inteligência artificial. Usa os mesmos modelos de linguagem em larga escala que alimentam chats avançados, que são integrados a IA tradicional — que raciocina com base em regras — e a um sistema de memória duradoura, que registra o histórico de interações.
É essa arquitetura que permite que um avatar criado pela Ursula não apenas responda no momento, mas lembre o que aconteceu antes e adapte seu comportamento, desenvolvendo algo próximo de uma personalidade própria.
Passarelli conta que a ideia veio da paixão por games e personagens. “Sempre fui o nerd que queria interagir com o que via na tela. Fui uma criança com amigo imaginário, meio esquisita. Meu sonho era dar cérebro para esses personagens”, diz.

A visão vai além de simplesmente colocar um NPC mais inteligente. Para ele, o verdadeiro potencial está em criar gêneros completamente novos de videogame ou experiências digitais, em que o personagem lembra o jogador, cria laços e até toma decisões autônomas. “A partir do momento que você dá emoção, memória e necessidade para um personagem, que tipo de história dá para contar agora, que antes não dava?”, provoca.
Hoje a Ursula tem uma estrutura enxuta: são sete pessoas espalhadas pelo mundo, a maioria latinos, com experiências que vão de Pixar e Niantic (Pokémon Go) a Blizzard e Google. O time opera de forma totalmente remota, com hubs em Vancouver, Nova York e São Francisco.
O dinheiro captado, conta Passarelli, será usado principalmente para expandir a equipe, lançar a primeira simulação própria com personagens da Ursula e construir a infraestrutura que permita escalar o produto.
A projeção é que, no futuro, desenvolvedores precisem apenas subir o “corpo” do personagem, enquanto toda a parte cognitiva fica por conta da plataforma. “Hoje isso ainda é artesanal. Queremos automatizar para que qualquer IP possa ganhar memória, emoção e autonomia”, diz ele.
A startup foi criada há dois anos e ganhou tração após passar pela aceleração da Betaworks, de Nova York, que já foi o primeiro cheque institucional de companhias como a Hugging Face.
“Praticamente todos os VCs do Brasil disseram que isso era loucura e que nunca iam investir. Virou uma missão pessoal ajudar a mudar o ecossistema de venture daqui, mostrar que dá para um time latino jogar Champions League, com talento global e capital global”, diz Passarelli.
Para a Prosus, o investimento se encaixa na estratégia de buscar negócios que empurrem os limites da inteligência artificial e tenham potencial global, mas raízes fortes na América Latina.
“Uma das nossas principais estratégias de investimento é apoiar startups que estão revolucionando o mercado por meio da inteligência artificial. A Ursula é um exemplo marcante: está expandindo os limites da IA com uma visão criativa única, enraizada no Brasil e com relevância global”, disse Thiago Silva, diretor sênior do iFood e head da Prosus Ventures na América Latina.