A maior coleção privada de arte da Argentina será exposta no Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC), a partir de 19 de novembro. É apenas um pequeno recorte do acervo do empresário Alec Oxenford, argentino que vive no Rio desde 2020.

Oxenford é um dos pioneiros latino-americanos do mercado digital. Ele é cofundador da OLX, empresa conhecida pelo seu bordão de sugere que os consumidores desapeguem de itens que não usam mais. Ele também fundou a letgo e a Alpha Capital, SPAC que que levou a brasileira Semantix à Nasdaq, além do fundo de venture capital Myelin II.

"Por um lado, trazer a coleção para o país é algo natural e orgânico já que, há dois anos, elegi o Brasil como minha casa. Portanto, minha coleção visitar o Brasil é, de certa forma, um retorno ao lar. Alguém disse: 'sua casa é onde está sua arte', e eu concordo com isso", disse Oxenford ao NeoFeed.

"Em um nível menos pessoal, gostaria que a visita à minha coleção servisse para iniciar um novo diálogo entre brasileiros e argentinos, que apesar de vizinhos, não se conhecem tão bem. Creio que, de certa forma, a arte é uma linguagem universal e, portanto, uma ferramenta perfeita para desencadear este diálogo de descoberta mútua."

Formado em administração em Buenos Aires com MBA em Harvard, Oxenford, de 53 anos, é como a maioria dos colecionadores: não revela o valor do que possui. A coleção Oxenford é centrada na arte contemporânea, com algumas peças da década de 1970, outras dos anos 1990, mas 90% está concentrada na produção deste século. No total, são cerca de 550 obras, de 150 artistas. Esta será a primeira exposição numa instituição do exterior feita pelo empresário e se divide em três capítulos.

Começa em Niterói, segue no próximo ano para a Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre e, em seguida, vai para o Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo. Cada capítulo terá artistas e obras diferentes sob um mesmo título: “Un lento venir viniendo”, que é um verso do escritor e poeta argentino Macedonio Fernández (1874-1952).

Oxenford começou sua coleção aos 26 anos, assessorado pela curadora Inés Katznstein, que hoje é coordenadora do departamento de arte latino-americana do MoMA, em Nova York. Os dois se conheceram quando o empresário foi convidado a ser o primeiro presidente do MALBA (Museu de Arte Latino-americana de Buenos Aires), instituição à qual segue vinculado. De lá para cá não parou de comprar e nunca vendeu. E adquire também obras variadas, sobre as quais não fala, que não fazem parte da coleção.

Pablo Accinelli, "Donde quiera que estés", 2010

A exposição no Brasil, que trará 140 obras de 85 artistas é resultado de um encontro de Oxenford com João Paulo Siqueira Lopes, um dos fundadores da produtora cultural Act., que organiza a mostra. Lopes, que assessora colecionadores, cujos nomes mantém em sigilo, conheceu o empresário num jantar no Copacabana Palace, há três anos, durante a ArtRio.

“Nunca tinha ouvido falar da coleção, mas gostei muito da maneira e da seriedade com que ele falava sobre arte. Marcamos um encontro e mais tarde fui a Buenos Aires (onde está o acervo) para conhecer”, disse Lopes, ao NeoFeed.

Segundo Lopes, o empresário teve e continua tendo um papel decisivo na produção artística argentina. “Ele é um motor. Como colecionador fomentou a criação e a produção até mais do que qualquer instituição.”

Oxenford é integrante ativo de várias organizações internacionais que promovem a arte latino-americana como a Latin American and Caribbean Fund do MoMA. Foi, também, diretor da Fundación ArteBA (Organização não governamental sediada em Buenos Aires).

Lopes, da Act.: papel decisivo de Oxenford na produção de arte argentina

O Brasil não é um grande mercado para a arte contemporânea argentina, embora algumas galerias como Vermelho e Luisa Strina representem artistas. Um dos objetivos da mostra é, justamente, dar a conhecer essa arte ao público brasileiro.

E aí é que entra o trabalho da Act., que tem trânsito global no mundo da arte e busca conectar artistas, colecionadores, galerias, museus e outras instituições culturais. Esta será a primeira exposição organizada pela Act., que surgiu em 2017 e teve seu desenvolvimento prejudicado pela pandemia.

O Brasil e o México são os grandes embaixadores da arte latino-americana no mundo. Sediam as principais feiras de arte do continente (SP-Arte e Zonamaco) e concentram as galerias mais relevantes.

Julio Le Parc, "Sphere Blanche", 2001:2016

“São Paulo tem a segunda Bienal mais antiga do mundo e o México também tem nomes reconhecidos e valorizados internacionalmente. O autorretrato 'Diego y Yo', de Frida Kahlo foi vendido por mais de US$ 30 milhões neste ano. É curioso que a arte brasileira é bastante reconhecida no nosso país vizinho, mas nós não temos o mesmo contato com as produções argentinas”, lembra Lopes.

Para o curador, Mariano Mayer, argentino que vive em Madri, também é um projeto de fôlego. Ele já havia trabalhado com Oxenford, mas nunca numa exposição. Ao comentar a seleção das obras, que abarca várias gerações, diz que é um tipo de arte conectada ao resto do mundo, embora de pequena inserção por enquanto, por isso a relevância desse tipo de exposição.

Entre os artistas está Julio Le Parc, um dos argentinos mais conhecidos por aqui e mais valorizados no mercado, mas supreendentemente não há nenhuma obra na coleção do provocativo León Ferrari (1920-2013), listado pelo The New York como um dos cinco artistas mais importantes do mundo. “As coleções privadas têm sempre um recorte subjetivo”, disse Mayer ao NeoFeed, para explicar a ausência de qualquer obra do artista entre tantas adquiridas pelo empresário.

Embora não traga nenhuma referência ao período da ditadura militar argentina (1976-1983), que voltou à ordem do dia com o filme “Argentina 1985”, lançado há dois meses e protagonizado por Ricardo Darín, o curador diz que a política também está presente sobre outro viés.

Mariana Ferrari, Lavanderas, 2014

“A política sempre atravessa a arte de uma maneira ou de outra. Há reflexões sobre a política doméstica, quando se coloca a intimidade das pessoas como um ato político e sobre as diferentes estéticas como a arte naif, numa época em que esse tipo de produção era relegado e marginalizado.”

Serviço:
UN LENTO VENIR VINIENDO – CAPÍTULO I
Mac Niterói – Mirante da Boa Viagem, Niterói – RJ
De 19 de novembro a 26 de fevereiro de 2023
De terça a domingo, das 10 às 18 horas
Ingressos: Inteira R$12, Meia R$6
Mais informações www.macniteroi.com.br