Seja por meio de parcerias estratégicas ou via M&As e investimentos inorgânicos, o iFood tem olhado cada vez mais além dos seus próprios limites para expandir o seu ecossistema, construído no entorno de sua plataforma de food delivery. E acaba de dar mais um passo para ampliar esse cardápio.

Com um investimento não revelado, a empresa anunciou a compra de uma participação minoritária de 20% na CRMBonus, martech brasileira dona de uma plataforma white label de giftback para varejistas e que também vem estendendo seus tentáculos, especialmente em áreas como vale bônus e retail media.

“Esse investimento está muito ligado ao espaço que estamos entrando, que é o mercado offline”, diz Thiago Viana, diretor de inovação e parcerias do iFood, ao NeoFeed. “E quando olhamos a CRMBonus, são ferramentas menos ligadas ao nosso core e muito mais às verticais que estamos construindo.”

A partir do acordo, que ainda depende da aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o iFood se torna o segundo maior acionista da CRMBonus, atrás apenas de Alexandre Zolko, cofundador e CEO da empresa. Os demais investidores seguem no captable da startup criada em 2018.

Conforme apurou o NeoFeed, há uma possibilidade, porém, ainda em discussão, de o iFood comprar 100% da CRMBonus em até três anos, o que estaria atrelado a determinadas métricas dessa associação. Nessas conversas, os termos incluiriam um cheque de R$ 10 bilhões para concretizar esse passo.

Essa cifra representaria quase cinco vezes o valuation divulgado pela CRMBonus na captação anterior ao investimento anunciado agora pelo iFood. Em maio de 2024, a companhia levantou R$ 400 milhões em uma rodada série B liderada pela gestora americana Bond, quando foi avaliada em R$ 2,2 bilhões.

Além do valor investido, a empresa não revelou o novo valuation a partir da entrada do iFood na operação. Mas, levando-se em conta essa última avaliação do aporte série B, o montante envolvido nesse novo aporte é de, no mínimo, R$ 440 milhões.

“Não é apenas um up round. Tínhamos feito nossa série B e estávamos bem capitalizados”, diz Zolko, da CRMBonus. “Mas, hoje, o iFood é muito mais do que um food delivery, é pioneiro em tecnologia brasileira e entendemos que poderíamos fazer muito mais se tivéssemos eles no nosso captable.”

Assim como o iFood, a CRMBonus também vem investindo em M&As para expandir seu portfólio. A empresa já soma cinco aquisições. A última delas, em maio, envolveu a Oto CRM, dona de uma espécie de “CRM para lojas físicas”, o que dialoga diretamente com o racional destacado por sua nova sócia.

A compra da Oto CRM reforçou a tese da CRMBonus, centrada em turbinar as vendas do varejo e em criar atalhos para a aquisição de clientes pelo setor. Com essa proposta, a companhia atende hoje mais de 3 mil clientes, em uma lista que soma cerca de 35 mil lojas e inclui nomes como Vivo, Arezzo e Vivara.

Do outro lado da mesa, os números também são expressivos. Hoje, o iFood contabiliza 55 milhões de usuários ativos, 120 milhões de transações mensais e 400 mil lojistas em suas plataformas. Já o Clube iFood, que dá acesso a descontos e benefícios da plataforma, tem mais de 13 milhões de assinantes.

Há cerca de um ano, o programa de fidelidade marcou justamente o início da parceria, ainda em âmbito comercial, entre as duas empresas, com a emissão de vales-bônus para os membros do clube de assinantes.

Com o plano de evoluir essa e outras ferramentas, as oportunidades no cruzamento das bases das duas empresas serão o fio condutor desse novo estágio da relação. E, nessa intersecção, o foco estará tanto em restaurantes como em varejista de outros segmentos. No digital e, principalmente, no offline.

Bastante amplo, esse leque vai incluir, por exemplo, a possibilidade de uma marca atendida pela CRMBonus, como a Chili Beans, oferecer um desconto ou um benefício para um cliente que acabou de fazer sua refeição em um restaurante próximo à sua loja, que, por sua vez, usa os sistemas do iFood.

Os restaurantes também podem ofertar descontos, seja em seu próprio estabelecimento, ou em outros varejistas no entorno. No fim do dia, a ideia é fornecer mais subsídios para que todos essas empresas ampliem o tráfego em suas lojas, fidelizem os consumidores e reduzam o custo de aquisição de clientes.

Há outras novidades no forno. Esse é o caso da PresenteIA, plataforma que será lançada pela CRMBonus no quarto trimestre de 2025 e que é fruto de uma parceria com o próprio iFood e com o WhatsApp. E que, em 2026, estará no centro de um aporte de R$ 100 milhões da companhia em marketing.

Na nova ferramenta, o consumidor poderá compartilhar, via WhatsApp, o contato de um amigo ou familiar que queira presentear. A plataforma vai sugerir os produtos mais indicados para aquela pessoa. Feita a escolha, o pagamento será realizado por meio do serviço de mensagens e a entrega pelo iFood.

Apetite por M&As

Esses planos se conectam ainda com a aposta do iFood em consolidar outras frentes de negócio, como o iFood Benefícios e o braço de produtos financeiros iFood Pago. E também com a expansão da empresa para outros segmentos, como mercados, farmácias e pets, entre outros.

Já sob o tempero do “offline” nessa receita, o iFood tem feito tantos movimentos internos como inorgânicos. Isso inclui exemplos como o lançamento, em 2024, da Maquinona, sistema de pagamentos dotado de um CRM (sistema de gestão de relacionamento com clientes) para os restaurantes.

Com essa mesma proposta de avançar nos salões de restaurantes e afins, a empresa também tem feito uma série de M&As e investimentos inorgânicos. Em junho, a empresa comprou a divisão de software de alimentação da Videosoft, de totens de atendimento.

Antes, em abril, o iFood anunciou três investimentos em uma só tacada. A companhia fez aportes – não revelados – no trio formado por OPDV, 3S Checkout e Saipos, que desenvolve sistemas de gestão e ponto de venda para diferentes perfis de estabelecimentos.

O apetite “externo” da companhia passa ainda pela compra de uma fatia na Shopper, de supermercados online, no fim de 2024. E por uma parceria estratégica com a Uber, anunciada nesse ano. Além das negociações avançadas para a compra da Alelo, gigante de benefícios.

Em paralelo a esses movimentos, o iFood vê a perspectiva de uma concorrência mais acirrada em seu negócio principal, personificada, especialmente, na chegada da gigante chinesa Meituan ao Brasil. E ainda em investimentos de empresas como 99 e Rappi nesse espaço.

Em um contexto mais amplo, essa estratégia agressiva também dialoga com escalada inorgânica da Prosus, controladora do iFood e que, desde maio de 2024, tem Fabricio Bloisi, ex-CEO da plataforma de delivery, como seu principal executivo.

Com a meta de dobrar sua receita até 2028, para US$ 12,5 bilhões, a holding de tecnologia fez aquisições como as compras da Just Eat Takeaway, também de delivery, por € 4,1 bilhões, em fevereiro desse ano. E da Decolar, principal agência de viagens online, por US$ 1,7 bilhão, no fim de 2024.