O executivo Cesario Nakamura está à frente da Alelo, empresa de benefícios do grupo Elopar, que tem Bradesco e Banco do Brasil como acionistas, há um ano e quatro meses. E, neste período, ele se acostumou com as pessoas trabalhando remotamente.
Explica-se. Há quatro anos, a companhia desenvolve o projeto “anywhere office”, em que o funcionário pode trabalhar uma vez por semana de qualquer lugar: de casa, de um café ou de um coworking.
“Mas a situação de 100% não estava no radar”, disse Nakamura, em entrevista ao NeoFeed, referindo-se ao fato de que todos os 700 funcionários da Alelo agora estão trabalhado remotamente. “Tenho conversado com as pessoas e elas falam que têm trabalhado até mais e têm sido mais produtivas com a questão do home office forçado.”
A pandemia, que fechou os restaurantes, acelerou também uma série de projetos da Alelo. O principal deles foi a integração com os aplicativos de entrega Rappi e iFood. Já são mais de mil estabelecimentos cadastrados em cada uma das plataformas. E Nakamura revela que o Uber Eats é o próximo da lista.
Nesta entrevista, o executivo conta que, pelo menos por enquanto, a operação da Alelo não foi afetada pela crise, diz que as empresas estão mudando o mix de produtos (estão substituindo o cartão refeição pelo o de alimentação) e fala de um projeto com a Prefeitura de São Paulo para o cartão da merenda escolar para 300 mil alunos.
Sem conseguir saber quando a situação vai voltar ao normal, Nakamura acredita que os produtos digitais da Alelo, que tem 8 milhões de clientes e 550 mil estabelecimentos conveniados, vão se fortalecer depois que a pandemia passar. Acompanhe:
Como está a operação da Alelo?
Estamos de home office desde 18 de março para 100% dos colaboradores. É uma situação que eu nunca tinha imaginado que teríamos algum dia. A Alelo já praticava o “anywhere office” há cerca de quatro anos. Anywhere é um conceito expandido do home office, pois você pode trabalhar de qualquer lugar: de um café, de sua casa ou de um coworking. Já tínhamos adotado essa política e era um dia por semana. E, mais recentemente, estávamos expandindo para dois dias por semana. Mas uma coisa é ter uma parte da equipe trabalhando de casa ou de outro lugar. A situação de 100% não estava no radar.
E como tem sido essa experiência?
Do ponto de vista operacional, estamos trabalhando muito bem. Não tivemos nenhum problema que nos afetasse a ponto de não conseguir trabalhar. Tenho conversado com as pessoas e elas falam que têm trabalhado até mais e têm sido mais produtivas com a questão do home office forçado.
A Alelo é uma empresa de benefícios. E grande parte das empresas está com os funcionários em casa e os restaurantes estão fechados. Qual o impacto que isso tem para a companhia?
Importante dizer que a Alelo sim é uma empresa de benefício, mas ela vem expandindo seu leque de atuação nos últimos seis, sete anos. Hoje, temos 11 linhas de produtos distintas. Trabalhamos cartão alimentação e refeição. Mas também temos produtos pré-pagos que ajudam a gestão de frotas para controlar despesa de combustível e manutenção de veículos. Temos também vários outros produtos, como premiação e incentivo.
Mas como essa crise afetou a Alelo?
Como as empresas ainda estão segurando (os empregos) durante esse distanciamento social, não observamos uma redução significativa de pedidos. A maioria tem reduzido jornada ou dado licença não remunerada. O que teve foi uma mudança de mix. Algumas empresas que faziam crédito em refeição estão pedindo para mudar para alimentação. Como os restaurantes estão fechados em parte das cidades, o cartão alimentação tende a crescer. É o que estamos percebendo.
"Sabíamos que, quando os restaurantes fechassem, o delivery ia crescer muito"
Os acordos com Rappi e iFood foram feitos em função dessa crise?
Não. A gente já vinha trabalhando nesses dois projetos de integração. Quando entrou a discussão de distanciamento social e de quarentena, nós aceleramos o projeto. Por quê? Sabíamos que, quando os restaurantes fechassem e não pudessem atender os clientes nas suas próprias instalações, o delivery ia crescer muito.
Você já tem uma ideia de como está sendo a utilização?
Tem uma quantidade grande de pessoas que já está utilizando. O que acontece? Como eu preciso ter a adesão de cada estabelecimento comercial, estamos entrando e ativando individualmente. Não posso automaticamente ligá-los, pois tem uma questão contratual. Eu preciso da autorização deles. A quantidade está crescendo. E a quantidade de transações também. Cada dia temos mais estabelecimentos.
Você tem o número?
A ideia é estar 100%, mas são milhares de estabelecimentos que já aderiram. A gente deve, nos próximos dias, chegar a quantidade total. É interessante porque existia, pelo jeito, uma demanda reprimida de clientes que já queriam utilizar o benefício nessas plataformas, mesmo antes do coronavírus. Praticamente não fizemos comunicação e já tinha pessoas utilizando.
Como foi que vocês aceleraram o projeto de Rappi e iFood?
Foi em esquema de mutirão. O pessoal se desdobrou. Rappi e iFood também (se desdobraram). Até porque para o Rappi e para o iFood é também interessante ter a Alelo como parceira. Nós temos também sido procurados por prefeituras e governos de Estados.
Para quê?
Com a situação das escolas fechadas, as crianças que tinham acesso à merenda escolar estão em casa. E aí tem uma preocupação muito nobre do prefeito que é garantir comida e alimentação. A prefeitura de São Paulo fez uma pesquisa de um parceiro que poderia auxiliar na distribuição de um cartão de merenda escolar. Fizemos um cartão específico. Ele está sendo entregue nas residências das famílias, principalmente as mais carentes, que necessitam desse auxílio. Tivemos que nos desdobrar porque o pedido foi para entregar porta a porta, em cada residência de cada uma dessas crianças. Imagine o desafio. Só para te explicar. O nosso processo de entrega é centralizado: entregamos na empresa ou na filial da empresa. Em uma empresa com dez escritórios, por exemplo, só entregamos em dez localidades físicas. Imagina o desafio logístico de entregar 300 mil cartões, um em cada casa.
É um cartão com dinheiro?
Sim, ele vai com um crédito mensal de R$ 55 até R$ 101. Ele é exclusivamente para alimentação. O intuito aqui não é permitir saques.
Esse projeto foi feito pela Alelo de forma gratuita?
Fizemos o mínimo que dava para fazer, porque tem o custo do plástico e da entrega. Foi uma coisa para cobrir os nossos custos.
Quando a vida voltar ao normal, o negócio da Alelo vai ficar mais digital?
Eu acredito que sim. E não só o meu negócio. Acho que todos estão percebendo isso. Essa capacidade de poder trabalhar de forma remota é uma coisa que ninguém imaginava.
"Dos 8 milhões de clientes, 6 milhões já usam o nosso aplicativo. Essa tendência vai crescer ainda mais"
Mas os produtos da Alelo vão ficar mais digitais?
Já temos uma alta penetração do uso de nosso aplicativo. Dos 8 milhões de clientes, 6 milhões já usam o nosso aplicativo. Essa tendência vai crescer ainda mais, com mais pessoas utilizando os nossos canais digitais. Já temos a solução de QR Code. Estamos olhando também a questão do contactless. Acreditamos que soluções como Apple Pay e Samsung Pay vão estar mais voltadas para o topo da pirâmide. Para a base, a maior parte dos clientes tem smartphones mais simples. Acredito que solução de QR Code, embora tenha mais passos, seja uma tendência para essas pessoas usarem para pagamentos.
Então, os pagamentos digitais vão crescer?
Sim, as carteiras digitais e a utilização dos apps são uma tendência. Outra coisa que tem crescido, não só no nosso segmento, é o delivery. Com Rappi e iFood, estamos vendo isso. E brevemente vamos ter o Uber Eats dentro da nossa plataforma. Estamos em desenvolvimento e logo vamos disponibilizar. Temos produtos como o cartão de mobilidade, que já integra vários modais de transporte. Com ele, o cliente pode utilizar no 99. Ele está disponível lá e pode usar para pagamento de corridas.
Isso tudo está acelerando a sua digitalização?
A gente já vem fazendo a transformação digital na companhia há três anos. E, no ano passado, aceleramos esse movimento. Do segundo semestre para cá, a gente vem acelerando o trabalho em squads e em metodologia ágil para ganhar agilidade no desenvolvimento de novos produtos e serviços.
Você trabalha com alguma perspectiva de quando vai voltar ao trabalho normal?
Essa é a pergunta de US$ 1 bilhão. Não sei. Estamos trabalhando com um cenário de pelo menos o mês de abril inteiro nesse esquema. Maio ainda estamos na dúvida. Vai depender muito da evolução (do número de infectados e de mortos pelo coronavírus). Eu, particularmente, acredito que em maio ainda vamos viver um período de distanciamento, mas não me atrevo a dizer como vai ser. É difícil. Ainda estamos na escalada (da doença). Quando você olha a curva, a gente vê que está crescendo. E em países que já deveria estar caindo, ela está caindo bem lentamente, como a Itália e a Espanha.
Você já enfrentou uma crise como essa?
Dessa magnitude, não. Normalmente o que a gente já viveu eram crises econômicas. Essa começou como uma crise sanitária, com repercussões fortíssimas no lado da economia. E os relatos são dramáticos. Estamos num setor que, como comentei, não foi muito impactado ainda. Mas vários clientes nossos estão sofrendo, como os de varejo que estão em shopping centers; os de serviços como segurança, limpeza e manutenção que atendem empresas de varejo; os dos setores aéreo e de turismo e até os próprios restaurantes.
Você disse que a Alelo não foi ainda muito afetada. Mas citou diversos de setores, que são seus clientes, que estão sendo muito impactados. À medida que eles demitirem, e o risco de termos uma taxa de desemprego alta não é baixo, a Alelo não será afetada?
Sim, aí podemos ser afetados. Mas vai depender muito da dimensão da crise e de quanto tempo nós vamos ficar parados. O que eu tenho sentido é que as empresas têm segurado um pouco esse movimento (de demitir). Há movimentos pontuais de demissões. Mas as empresas estão indo mais numa linha de reduzir jornada de trabalho e salário, para poder se manter e não ter que recontratar.
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