Depois de meses de disputas com o governo chinês, o bilionário Jack Ma parece estar cedendo à pressão.
O Ant Group, fintech controlada pelo Alibaba, grupo fundado por Ma, vai passar por uma grande revisão de seu modelo de negócios, após o fracasso de seu IPO de US$ 34,5 bilhões no ano passado, que era considerado o maior história.
Pressionada pelo governo chinês, a fintech deve se tornar uma instituição financeira sob a supervisão do banco central chinês, nos moldes dos pares locais e tradicionais do setor.
Nesta segunda-feira, 12 de abril, o Banco Popular da China convocou representantes do Ant Group e membros de quatro agências reguladoras para estabelecer as bases de um grande plano de reestruturação, segundo o The Wall Street Journal.
No processo, o Ant Group terá que corrigir o que os reguladores dizem ser uma "competição injusta em seu serviço de pagamentos". A companhia também será obrigada a reduzir os riscos de liquidez de seus produtos de investimento e os ativos sob gestão do fundo Yu’e Bao.
Outra premissa é acabar com o que o governo chama de "monopólio de informação", em uma referência ao grande volume de dados que o Ant Group detém sobre seus usuários.
De acordo com o jornal estatal The Economic Daily, o plano de reestruturação está alinhado a uma visão do governo chinês de que as plataformas financeiras tecnológicas devem focar em servir à economia do país e à sociedade.
O Ant Group parece ter entendido o recado. "Vamos colocar nosso crescimento proativamente dentro do contexto estratégico nacional", diz uma nota oficial da companhia, publicada em sua conta no aplicativo de mensagens WeChat. "Vamos nos esforçar para criar valor para a sociedade."
Considerada a maior fintech do mundo, o Ant Group tem mais de 1 bilhão de usuários e movimentou o equivalente a US$ 17 trilhões até junho de 2020. Além de empréstimos, o portfólio inclui apólices de seguros e outros produtos de investimento.
Criado oficialmente em 2014, o Ant Group tem origem no Alipay, aplicativo lançado por Ma, em 2004, e que dá acesso a mais de 100 serviços, desde pegar um táxi até comprar ingressos de cinema e marcar consultas médicas.
Em quatro rodadas, a empresa captou US$ 22 bilhões, junto a investidores como Sequoia Capital, Credit Suisse e Carlyle Group. O aporte mais recente, de US$ 14 bilhões, veio em 2018 e foi liderado pela Temasek e pelo Fundo Soberano de Cingapura.
O anúncio desta segunda-feira foi feito dias depois de o Alibaba ser multado em US$ 2,8 bilhões pela agência antitruste chinesa, que acusou a holding de abusar de sua posição como líder de mercado em detrimento de concorrentes e consumidores. Além do pagamento da multa, a companhia concordou em passar por uma revisão de suas operações para garantir que vai cumprir as novas exigências.
"Nos últimos meses, cooperamos completamente com a investigação e estudamos seriamente as políticas e expectativas do governo para plataformas econômicas digitais", disse o Alibaba, em comunicado divulgado sobre a sanção. "A penalidade serve para alertar companhias como a nossa. É uma ação importante para salvaguardar a competição justa e o desenvolvimento da economia."
A multa e a reestruturação do Ant Group são os novos capítulos do embate entre Jack Ma e o governo chinês. No ano passado, a fintech, que planejava uma listagem dupla nas bolsas de Xangai e Hong Kong, suspendeu esses processos poucos dias antes de concretizá-los.
A decisão veio na esteira de críticas pesadas a bancos e autoridades reguladoras feitas por Ma. Ele afirmou que "o sistema regulatório chinês estava sufocando a inovação e deveria ser reformado para fomentar o crescimento".
A declaração enfureceu o governo chinês. Ele e outros executivos foram convocados a depor sobre “problemas com o ambiente regulatório de tecnologia financeira” da companhia. Esse foi o primeiro passo na tentativa de encolher o império tecnológico de Ma. Mas não está restrito aos negócios do bilionário.
Os órgãos reguladores chineses vêm ampliando a pressão sobre os negócios de internet locais na tentativa de criar regras antitruste mais eficazes. No fim de 2020, a China divulgou um projeto de regras antimonopólio para suas plataformas online, sinalizando um maior apetite para controlar empresas de tecnologia com posição dominante.
Ma pode ser o alvo mais conhecido, mas o objetivo do governo chinês é mais amplo e foca em outras empresas de internet. Entre elas, a gigante Tencent, dona do aplicativo WeChat e um arsenal de negócios em diferentes segmentos.
No começo de março, Pony Ma, fundador do grupo, também participou de uma reunião com representantes de agências chinesas que exigiam explicações sobre seus negócios e investimentos realizados pela companhia.
Ao menos até o momento, as sanções à Tencent, no entanto, foram bem mais brandas. Ainda em março, o grupo foi multado em 500 mil yuans (US$ 77 mil) por não buscar a aprovação necessária na aquisição da plataforma de educação online Yuanfudao. O valor é insignificante para uma empresa que vale US$ 763 bilhões, mas pode ser interpretado como um alerta das autoridades chinesas.
De acordo com o jornal inglês Financial Times, no diálogo com o governo chinês, Pony Ma pode estabelecer uma estrutura similar a que está sendo proposta ao Ant Group, de holding financeira que seguirá as regras das instituições tradicionais do setor. O empresário já afirmou que uma eventual revisão de seu modelo não terá grande impacto nos negócios do grupo.