Com os sucessivos recordes que as bolsas de Nova York têm experimentado desde o início da pandemia, impulsionadas por estímulos fiscais e monetários, tem sido mais frequente que os investidores se perguntem: o mercado de ações está perto de uma bolha?
O S&P 500, por exemplo, principal índice de Wall Street, acumula alta de 21% em 2021 e de 30% nos últimos 12 meses. A bolsa eletrônica Nasdaq, focada em companhias de tecnologia, avança 20% no acumulado do ano e tem alta de 31% em um período de um ano.
Mas o que pensa o CEO e um dos fundadores da maior gestora de ativos do mundo, a BlackRock? O americano Larry Fink, uma das lendas vivas do mercado financeiro, parece pouco preocupado, pelo menos no que se refere ao médio prazo.
“Teremos mais uns dois anos de mercado de ações muito forte”, disse o executivo, durante participação na edição deste ano da Expert XP, o evento de investimentos da XP. “E os lucros estão validando isso. Os valuations estão lá em cima, de um modo geral”, afirmou o gestor, que participou do evento de forma online, diretamente de Aspen, na Suíça.
Fink, que comanda uma gestora com cerca de US$ 9,5 trilhões de ativos sob gestão, ressaltou que os estímulos fiscais continuarão “grandes” nos Estados Unidos e em outros países, e lembrou que a lei de infraestrutura, em discussão no Congresso americano, deve ser aprovada, o que será mais um incentivo à maior economia do mundo.
“Temos também bancos centrais atuando no mundo e a quantidade de receita disponível é impressionante. São trilhões de dólares que precisam ser aplicados, investidos e usados”, afirmou o investidor, que fundou a BlackRock em 1988.
O gestor, porém, chamou a atenção para a inflação, um dos temas que mais têm preocupado investidores e economistas pelo mundo. Nos 12 meses encerrados em julho, o índice de preços ao consumidor dos EUA alcançou 5,4%, sendo que o país é acostumado a uma taxa que gire em torno de 2%.
“Vamos ter mais inflação, sim, e não vai ser transitória, não”, disse Fink, entrevistado pelo CEO do Banco XP, José Berenguer. O investidor, porém, quis deixar claro que não está se referindo a uma hiperinflação. “Não estou dizendo que será como foi no Brasil (nos anos 1980). Mas, nos EUA, teremos 3%, 3,5%, durante vários anos. Isso, sim, vai acontecer”, afirmou.
Será um problema? Fink acredita que isso pode impactar o valor de mercado das empresas. “Só teremos de reavaliar os valuations, ter talvez um grau de desconto maior e analisar retornos”, disse ele.
De qualquer forma, ressaltou ele, se a inflação não for transitória, será preciso ficar atento à atuação dos bancos centrais pelo mundo. “Será que vão subir as taxas de juros ou olhar para frente e esperar? Eles devem continuar investindo no médio prazo para manter as economias funcionando”, disse Fink. “Mas o que as curvas de juros estão dizendo é que há atividades muito incomuns sendo feitas pelos BCs para manter as economias funcionando.”
Outra previsão feita por Fink, esta não tão animadora, diz respeito à pandemia. Para ele, o mundo ainda terá de conviver com o problema por pelo menos mais um ano ou um ano e meio, até que a vacinação avance a ponto de transformar a covid-19 em uma “gripe”, menos ofensiva e parte do cotidiano das pessoas.
Na visão do gestor, este é um cenário que deve expor ainda mais a desigualdade entre países, uma vez que as nações mais ricas e mais avançadas no combate ao novo coronavírus devem experimentar uma recuperação mais rápida de suas economias, enquanto os demais ainda levarão “anos” para retomar o nível de atividade que tinham em 2019, antes da pandemia. “Isso mostra questões sociais importantíssimas, da grande desigualdade que foi criada”, disse o CEO da BlackRock.
Na visão dele, a solução passa por repensar o papel do Fundo Monetário Internacional (FMI), que em geral socorre países em dificuldades financeiras. Para o executivo, o FMI precisa trabalhar em conjunto com o capital privado para realizar investimentos em mercados emergentes e desenvolver as economias.
“O capital privado não consegue investir na maior parte do mundo e é muito binário. Por exemplo, o capital investido na Argentina, antes do atual governo (do presidente Alberto Fernandéz, eleito em 2019, pelo partido peronista Justicialista), sofreu um corte de 50%. O capital privado não vai seguir para os emergentes da mesma forma”, disse.
Sem entrar em detalhes, ele ressaltou que o FMI precisa mudar a sua forma de financiar os países e atuar em parceria com o capital privado. “É preciso uma nova estratégia: ver como os agentes (emergentes) funcionam e responder a eles”, afirmou Fink.