Isabel del Priore, CEO da Animale, marca de moda feminina do grupo Soma, cresceu em um ambiente no qual aprendeu a “olhar com lupa” o contexto cultural e político do país.
Filha da historiadora bestseller Mary Del Priore, autora de obras como “História das Mulheres no Brasil” e “O Príncipe Maldito”, ela convivia de forma “simbiótica” com livros, bibliotecas e museus no Brasil e na Europa.
Combinou sua visão crítica com uma formação em business na França, na Faculdade Leonard De Vinci. E assim prosperou no mercado de marcas internacionais que queriam entender o país, como a Hermès, em que foi diretora para o Brasil e Latam.
Antes disso, tinha trabalhado no mercado americano como diretora da Rafael Cennamo Couture, em Nova York, negociando com as grandes varejistas locais como Neiman Marcus, Saks e Bergdorf Goodman.
Desde 2021 na Animale, ela agora faz o caminho inverso. Traz para dentro da empresa de 32 anos, as melhores práticas de gestão da indústria do luxo nesse processo de revitalização da grife carioca. No ano passado, a Animale atingiu a maior receita bruta da sua história com R$ 670,1 milhões, alta de 24,0% em relação a 2021.
No segundo trimestre deste ano, alcançou crescimento de 17,8% da receita bruta em relação ao mesmo período de 2022 (R$ 194,3 milhões) e de 30,3% em relação aos primeiros três meses do ano. “Resultado que conseguimos na nossa base instalada, sem abertura de lojas”, contou ela o NeoFeed.
No seu pacote de gestão entrou, por exemplo, a implantação das diretorias de merchandising de produto e de retail, cargos típicos nas empresas de luxo.
São elas que trabalham em sintonia com os departamentos de estilo e comercial com inputs vindo dos consumidores no desenvolvimento de coleções, de forma a atender ocasiões de uso diferentes e particularidades regionais.
“Imagine como é complexo para as marcas de luxo pensarem a cadeia para atender China, Estados Unidos, França, Coreia, tudo ao mesmo tempo. É preciso uma inteligência de produtos de forma que os lojistas possam compor seus acervos respeitando as características locais.”
Foi isso que ela implantou pensado nas regiões brasileiras. Enquanto os estados do Nordeste estão mais alinhados com o Rio de Janeiro na sua preferência por estampas e peças fluídas, explica ela, “São Paulo já prefere itens lisos e estruturados.” Dessa forma, ao estabelecer um hub para o mercado paulista, por exemplo, elevou as vendas no estado em 11% este ano.
A estratégia de focar em ocasiões de consumo permite que as peças resort entrem na mala de fim de semana das paulistas, por exemplo, enquanto que os itens mais sóbrios sejam uma escolha para as cariocas num jantar. “É como se o mercado tivesse uma certa sede para ter essa inteligência de oferta, essa resolução numa marca só.”
Este ano, a Animale se tornou também a marca de trajes sociais da Seleção Brasileira de Futebol Feminino. A associação de grifes de luxo com esporte vem desde Giorgio Armani e a seleção italiana, na década de 80. Mas hoje se tornou uma das ferramentas mais eficientes da indústria para ganhar consistência cultural. A LVMH, por exemplo, é a patrocinadora oficial da Olímpiada de Paris.
Os posts do anúncio da parceria da Animale com a Seleção representaram 81,5% do engajamento total do período da Copa e a categoria alfaiataria, que já era reconhecida na marca, teve um incremento, crescendo 38% em relação a 2022, na onda dos ternos azuis das jogadoras.
As marcas de luxo desenvolvem freneticamente formas de acesso, experiências e serviços para estreitar relacionamento e atuar em nichos. Quando entrou na companhia em 2021, Isabel em busca da conveniência figital (união do físico com digital), lançou o app da marca que se tornou “a melhor ferramenta de fidelização” da empresa.
O app é responsável por gerar cerca de 20% da receita total do varejo (lojas + site), com crescimento de 214% do share no acumulado do ano. De janeiro a julho deste ano, as vendas pelo aplicativo geraram receita de aproximadamente R$ 60 milhões. “Quem mais usa são as já seguidoras da marca que aumentaram a recorrência das compras.”
Dessa forma, a Animale incrementou também sua venda de joias, com a marca Oro, que hoje representa 10% do resultado. “Joia é sempre o ápice da relação da cliente com a marca, ainda mais quando se trata de coleção de uma grife de moda.”
Os planos de Isabela não envolveriam ainda o incremento da linha de acessórios, principal fonte de receita das marcas de luxo? “Faz todo sentido a gente desenvolver essa área, até porque o couro representa 20% do resultado da Animale”, diz. Mas destaca que a prioridade agora é equacionar o vestuário.
No próximo ano, o foco será a reconfiguração das 70 lojas nas mãos do Studio Tupi, unindo a identidade da marca com elementos regionais.
“A lição número 1 é respeitar o que é genuíno na cultura de uma marca, não importa que ela tenha 30 anos como Animale. É como as grifes centenárias de luxo fazem, pensando no longo prazo. Cultivam sua herança ao mesmo que inovam para as novas gerações.”