De todas as recorrentes pressões em favor da mudança de curso no comportamento do governo brasileiro quanto à preservação ambiental, nenhuma é mais eloquente que a divulgada, na terça-feira 14, por doze ex-ministros da Fazenda e cinco ex-presidentes do Banco Central, basicamente a representação do pensamento econômico brasileiro dos últimos 30 anos.

O título da versão integral do documento defende: UMA CONVERGÊNCIA NECESSÁRIA: POR UMA ECONOMIA DE BAIXO CARBONO. A mira é alta e vai muito além da básica e obrigatória necessidade de zelar pelos recursos naturais e sociais da Amazônia e interromper a escalada de desmatamento. É praticamente o Norte de um plano de governo para o Século 21.

É preciso dizer: chega atrasado. Mas antes tardar do que falhar. A maior parcela desse grupo de líderes do pensamento econômico brasileiro demorou a perceber a importância dos temas de sustentabilidade e pouco fez de significativo enquanto teve a caneta na mão. Agora recuperam o tempo perdido de forma louvável, apontando o País para a nova fronteira do desenvolvimento econômico global.

Seguem a mesma linha da carta formulada em abril por 13 ministros de Meio Ambiente e do Clima de países da União Europeia em favor de um Pacto Verde para a retomada após a pandemia. E que precedeu outro movimento, a Aliança Europeia para uma Recuperação Verde, lançado com 180 assinaturas de líderes políticos, executivos de grandes multinacionais, sindicatos, ONGs e especialistas.

A essência de todo esse pensamento é o mesmo: retomar a economia após a pandemia em novas bases, que combatam o risco climático e construam sociedades mais resilientes e socialmente menos vulneráveis. Para o atual momento de desgoverno do país, isto é praticamente uma utopia, uma guinada de 180 graus absolutamente improvável. De todo modo, é extremamente importante que esse caminho seja apontado agora e por aqueles que possuem o respeito do setor produtivo e dos detentores de capital.

A carta da “Convergência pelo Brasil” começa por explicar porque esse é o momento para adotarmos uma política de desenvolvimento diametralmente oposta à extrativista que temos adotado: “Superar a crise exige convergirmos em torno de uma agenda que nos possibilite retomar as atividades econômicas, endereçar os problemas sociais e, simultaneamente, construir uma economia mais resiliente ao lidar com os riscos climáticos e suas implicações para o Brasil”.

Explica a importância das políticas públicas com visão de longo prazo: “A recuperação da economia pós-COVID-19 oferece oportunidades importantes para promover a economia de baixo carbono e sustentável, em um momento em que o mundo atravessa importantes e rápidas transformações nos mercados de capital e de trabalho. Mais do que o volume do gasto público, o impacto de longo prazo da ação fiscal se dará pela escolha de como esse gasto será efetuado, estimulando ações que alavanquem as vantagens comparativas do país e contribuam para a produtividade de longo prazo da economia e a criação de empregos.”

E conclui que as tecnologia de baixo carbono podem conciliar os benefícios ambientais com os econômicos e sociais: “Por isso, nós, ex-Ministros da Fazenda e ex-Presidentes do Banco Central do Brasil, subscrevemos este documento e defendemos que critérios de redução das emissões e do estoque de gases de efeito estufa na atmosfera, e de resiliência aos impactos da mudança do clima sejam integrados à gestão da política econômica. Esses critérios já são, e serão cada vez mais, baseados em tecnologias compatíveis com o aumento da produtividade da nossa economia, a geração de empregos e a redução da desigualdade no Brasil. Além disso, a descarbonização significa a valorização da nossa economia no longo prazo, uma consideração cada vez mais importante para investidores internacionais”.

O documento ainda aponta ações em quatro tópicos-chave: Alcançar a economia de Baixo Carbono; Zerar o desmatamento na Amazônia e Cerrado; Aumentar a resiliência climática; e Impulsionar a pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias. De Zélia Cardoso de Melo a Henrique Meirelles, passando por FHC, Pedro Malan, Maílson da Nóbrega, Pérsio Arida, Armínio Fraga, assinam as figurinhas premiadas da economia brasileira. O recado é claro e está dado, não apenas para o governo atual, mas para todos que, porventura, venham sucedê-lo.

Álvaro Almeida é jornalista especializado em sustentabilidade. Diretor no Brasil da consultoria internacional GlobeScan, sócio-fundador da Report Sustentabilidade, agência que atua há 17 anos na inserção do tema aos negócios. É também organizador e curador da Sustainable Brands São Paulo, integra o Conselho Consultivo Global desta rede de conferências e participa da Comissão de Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

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