Com as reformas iniciais e a compra da antiga fábrica têxtil que transformou em museu, Marcos Amaro gastou R$ 30 milhões. A Fábrica de Artes Marcos Amaro (FAMA), localizada em Itu, no interior de São Paulo, e aberta ao público há quatro anos — tem um orçamento anual que gira em torno de R$ 5 milhões, saídos praticamente só do bolso do empresário, artista, colecionador e galerista de 37 anos.

Na FAMA, uma área com 25 mil metros quadrados, está a coleção que ele vem formando desde 2008. São cerca de 2 mil trabalhos de artistas renomados como Adriana Varejão, Tunga (1952-2016) e Nuno Ramos. Agora, Marcos Amaro acaba de inaugurar uma versão de seu museu no metaverso.

Para tirá-la do papel, Amaro arrematou um terreno por R$ 80 mil na plataforma Decentraland, um metaverso popular em que as pessoas podem comprar terrenos, visitar edifícios e se relacionar com outas pessoas por meio de seus avatares. O espaço virtual exibe as mais de 70 obras digitais cujos NFTs o empresário adquiriu a partir de janeiro deste ano.

Os NFTs, que em português significam token não-fungível, são baseados na tecnologia do bitcoin. Mas, ao contrário da maioria das moedas virtuais, você não pode trocar um NFT por outro, da mesma forma que faria com dólares, reais ou barras de ouro. Cada NFT é único e atua como um item de colecionador que não pode ser duplicado, o que os torna raros.

Caçula do Comandante Rolim Amaro (1942-2001), fundador da TAM, Amaro já gastou mais de R$ 1 milhão com cripto arte baseada nos NFTs. O trabalho mais caro, “Into the Ether”, leva a assinatura do americano Mike Winkelmann, o Beeple, autor de "Everydays: The First 5000 Days", leiloado pela Christie’s por US$ 69,3 milhões em março de ano passado, a terceira obra de um artista vivo mais cara da história.

A composição adquirida por Amaro, que custou o equivalente a R$ 322 mil, exibe dois astronautas diante de um monolito que remete ao símbolo do ethereum, uma das moedas digitais mais populares, atrás apenas do bitcoin.

No mundo da cripto arte, Amaro utiliza o codinome de Mr Vanderbilt. Sua meta é adquirir mais 130 NFTs e “tokenizar” toda sua coleção física. Ele também planeja instalar displays nas galerias da FAMA para exibir itens da coleção digital ao lado de trabalhos tradicionais. “Não dá para desconsiderar o potencial da cripto arte”, diz Amaro, ao NeoFeed.

Misunderstood, do artista Jake, NFT adquirido por R$ 37 mil

Amaro diz ter se rendido a cripto arte após descobrir o quanto ela já movimenta. Foram US$ 22 bilhões no ano passado, segundo a DappRadar, que atua no setor de finanças descentralizadas. Já o setor de arte tradicional movimentou US$ 50,1 bilhões em 2021, pelas contas da Art Basel.

“É um movimento sem volta”, acredita o fundador da FAMA. “Mas que não invalida todas as obras físicas produzidas até aqui. Vale lembrar que a arte contemporânea não tirou a importância do Renascimento.”

Como artista, Amaro faz principalmente desenhos com carvão e esculturas confeccionadas a partir de objetos como lâmpadas tubulares e peças retiradas de antigos aviões. Com a ajuda de um iPad, ele chegou a fazer dois desenhos digitais que ganharam NFTs, mas não se deu por satisfeito — ambos saíram de circulação.

“Acredito que os artistas do mundo físico precisarão se reinventar”, afirma Amaro. “Não digo que todos precisam agora produzir um trabalho digital, mas que o mercado está mudando, está.”

A principal vantagem, acredita, é deixar os artistas livres para negociar suas obras sem a participação de marchands. “Nem todo artista está inserido no mercado de artes tradicional”, diz Amaro, que tem estimulado os nomes representados por sua galeria, a Kogan Amaro, a tentar a sorte com os NFTs. “No mundo da cripto arte, porém, não é assim.”

Com matriz em São Paulo e filial em Zurique, a galeria Kogan Amaro surgiu da Emma Thomas, arrematada por ele em 2017. O negócio ganhou um braço na Suíça, pois é lá que ele vive parte do ano e onde conheceu sua atual mulher, a pianista russa Ksenia Kogan, com quem teve duas filhas.

Marcos Amaro despertou para os US$ 22 bilhões dos NFTs de arte

O filho do Comandante Rolim ganhou notoriedade no mundo das artes plásticas a partir de 2016. Foi quando estreou, como artista, na SP-Arte. Na edição seguinte, participou também como patrocinador de um prêmio batizado com seu nome, cujo objetivo era fomentar a produção artística contemporânea — a premiação foi repetida até 2019.

Até o começo daquela década, seu nome era associado sobretudo ao mundo dos negócios. Em 2004, ele começou a importar e a distribuir no Brasil os óculos da grife suíça TAG Heuer. Quatro anos depois, adquiriu o controle das óticas Carol, hoje com mais de 1.300 unidades — em 2013, sem jamais descobrir o porquê do nome da rede, vendeu suas ações para um consórcio formado pelo fundo inglês 3i.

Em 2009, quando se desfez da maioria dos papéis que herdou da TAM — hoje não tem mais nenhuma participação na empresa aérea —, Amaro naugurou na Rua Oscar Freire, em São Paulo, uma loja focada em óculos escuros de grife, a OpArt, que teve vida breve.

Em dezembro do ano passado, voltou a investir fora da arte. Foi quando deu a partida na Amaro Aviation, companhia de aviação executiva da qual tem o controle e que reuniu investimentos de US$ 48 milhões.

Com sede operacional no São Paulo Catarina, o aeroporto da incorporadora JHSF, a empresa vende aviões recorrendo ao modelo de propriedade compartilhada e se incumbe da gestão das aeronaves, inclusive de quem já tem a sua, mas não quer dividi-la com ninguém.

Agora, Amaro quer alçar novos voos no mundo da arte. Na verdade, no mundo da cripto arte.