Em junho de 2020, no auge da pandemia, Allan Sztokfisz e Flávio Ghelfond decidiram empreender no mercado imobiliário. Mesmo com a situação pouco propícia naquele momento, eles seguiram em frente depois de constatarem dois movimentos que vinham acontecendo nos últimos anos no setor e que, se unidos, poderiam render bons resultados.
De um lado, um aumento na oferta de apartamentos compactos nas grandes cidades, atraindo pessoas em busca de imóveis para investir. De outro, uma demanda do público por novos formatos de locação, mais flexíveis em relação ao período dos contratos de aluguel, e por apartamentos mobiliados, com todos os serviços básicos inclusos e, eventualmente, serviços de hotelaria.
Diante dessas tendências, Sztokfisz e Ghelfond, que já tinham experiência em administrar hotéis e com locação de imóveis, fundaram a proptech Charlie. Por meio do modelo on demand, a dupla entendeu que poderia atender as demandas dessas duas pontas.
"O investidor que quer rentabilizar ativo tem um baita trabalho para isso", diz Sztokfisz ao NeoFeed. "Nós vimos a oportunidade de resolver a dor desse investidor e, ao mesmo tempo, oferecer uma experiência de alto padrão para o inquilino."
Por meio de parcerias com incorporadoras como Trisul, Eztec, Tecnisa e Cyrela, a startup oferece serviço de gestão aos investidores que compram apartamentos dessas companhias. A empresa assume a unidade, responde pela reforma e decoração, e depois disponibiliza o imóvel para locação no Airbnb, em plataformas de locação e em seu próprio site. Por esse serviço, o Charlie cobra de 18% a 20% do total das locações do mês.
Com apenas dois anos de idade, a proptech viu sua proposta de negócio ganhar força. A companhia amealhou mais de 700 apartamentos neste período ao assumir a gestão e administração de apartamentos comprados por investidores, sejam pessoas físicas ou fundos imobiliários, e colocá-los no mercado para pessoas que buscam hospedagens completas e flexíveis.
Um dos argumentos da empresa é que a rentabilidade desse formato é 40% superior à média dos alugueis em formatos tradicionais. "Desde o lançamento do prédio, a incorporadora oferece nosso serviço ao investidor como argumento de venda", diz o CEO. "Fazemos uma série de ações comerciais junto com a incorporadora para tentar chegar nesse investidor."
Pelo lado da demanda, a empresa está atendendo a um público mais jovem, que busca apartamentos compactos, entre 30 e 45 metros quadrados, mobiliados e eventualmente com serviços de hotelaria, para hospedagens curtas ou de longa duração. O Charlie calcula atender cerca de 10 mil pessoas por mês considerando todos os formatos de locação.
Sem abrir dados de faturamento, a proptech espera fechar o ano com mil apartamentos prontos para serem locados. Até 2026, o plano é ultrapassar 24 mil apartamentos sob sua gestão.
A meta é ambiciosa, considerando que o mercado de imóveis on demand conta com nomes de peso e que se movimentam para crescer suas operações. Um deles, no caso, envolve a junção de duas grandes empresas do segmento, a mexicana Casai e a brasileira Nomah.
A fusão, anunciada em agosto desse ano, resultou numa empresa com 3 mil unidades habitacionais em oferta no Brasil. A Nomah tem parcerias com incorporadoras, fazendo a gestão para essas empresas, enquanto o Charlie fecha acordos com os compradores dos apartamentos.
Além deles, o mercado conta com a concorrência da Housi, que tem por trás a incorporadora Vitacon e conta com um valor geral de venda (VGV) próximo de R$ 20 bilhões. E ainda a Yuca, que captou US$ 10 milhões em junho para expandir sua atuação para além do coliving, entrando no mercado on demand.
Apesar de menos conhecida, o Charlie vê seus negócios ganhando tração, a ponto de começar a inaugurar operações fora de São Paulo, onde estão 80% dos apartamentos que gere e aluga.
A expansão começou por Porto Alegre, onde a startup inaugurou sua primeira representação fora da capital paulista. A oferta de apartamentos na capital gaúcha foi incrementada em cerca de 150 apartamentos, distribuídos em três prédios que estão prestes a serem entregues e um hotel que foi reformado. Contando com aqueles que já possui, a empresa pode chegar no começo do ano que vem com quase 200 apartamentos na cidade.
“Começamos no ano passado uma operação pequena em Porto Alegre, para sentir o mercado", diz Sztokfisz. “Se tudo correr certo, Porto Alegre será o nosso segundo mercado por muito tempo.”
A startup está mapeando outras regiões do País para estabelecer operações, mas Sztokfisz destaca que as cidades precisam ter um volume relevante de lançamentos de apartamentos, especialmente os compactos. Elas também precisam demonstrar que têm demanda pelo modelo de locação promovido pelo Charlie.
“Adoraríamos colocar um alfinete em cada cidade no mapa do País, na América Latina, povoar e falar que estamos em vários lugares, mas nossa preocupação é ter um negócio sustentável do ponto de vista financeiro’, diz.
Entre as cidades em que o Charlie estuda abrir representação e expandir suas operações está o Rio de Janeiro, em que atua via parcerias. No entanto, segundo Sztokfisz, a oferta de novos apartamentos com perfil adequado é bem limitada, especialmente na Zona Sul, área de especial interesse da empresa.
A companhia avalia ainda ter uma presença maior em Recife, Curitiba, Florianópolis, Belo Horizonte e até Fortaleza.