O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu nesta quarta-feira, 23 de março, manter a taxa básica de juros em 13,75%.
No comunicado que acompanha a decisão, o Copom ignorou as pressões do governo federal e de parte do setor privado e não deu indicações se pretende baixar os juros na próxima reunião, daqui a 45 dias.
Em um longo comunicado, os nove integrantes do Copom preferiram olhar o copo meio vazio. No texto, citam a piora do cenário externo, lembrando a crise bancária nos Estados Unidos e na Europa.
No Brasil, o comunicado não faz menção ao possível efeito positivo do arcabouço fiscal a ser anunciado pelo governo e ainda advertiu que a inflação “segue acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta”.
“O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”, diz um trecho do comunicado. “Os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e (o comitê) não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado.”
A manutenção da taxa Selic no mesmo patamar pela quinta vez consecutiva já era esperada pelo mercado, como indicou a edição mais recente do boletim Focus, pesquisa semanal com analistas de mercado.
Mesmo assim, horas antes, o governo federal elevou a pressão sobre o órgão, com críticas duríssimas do ministro Rui Costa, da Casa Civil, ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
”O que o presidente do BC está fazendo é um desserviço à nação”, disse Costa, reclamando da taxa de juros com uma ameaça: se o Copom não começasse a baixar Selic mais tarde, o governo ia continuar criticando Campos Neto.
“O Copom não precisa conhecer o novo marco fiscal para começar a baixar os juros”, disse o ministro. Segundo ele, quando o Copom começou a elevação da Selic, havia um cenário de inflação em torno de 10%, e agora esse índice está na faixa de 6%. “Os juros altos asfixiam o comércio, os investimentos, e não permitem que a economia volte a crescer.”
Fator Fed
A expectativa de que a decisão do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Undios) pudesse interferir na reunião do Copom também não se concretizou – horas antes, o Fed anunciou um aumento de 0,25 ponto percentual na taxa de juros.
Em comum, Brasil e EUA enfrentam inflação alta e longe da meta, taxas de juros elevadas e um cenário de restrição de crédito, por diferentes motivos.
Nos EUA, a escassez de crédito escalou com a crise bancária após a liquidação do Silicon Valley Bank (SVB), que afetou os bancos pequenos e médios do país, responsáveis por 40% dos empréstimos.
Por aqui, além do efeito da alta nos juros nos últimos meses, o caso Americanas levou mais restrição ao mercado de crédito privado, o que em tese deve contribuir para a queda da inflação e, por tabela, dos juros.
De acordo com o Banco Central, o saldo de crédito para as empresas teve uma desaceleração de 7,9% nos últimos 12 meses. Outro dado relevante, o indicador de custo do crédito (ICC), atingiu 21,9% ao ano, alta de 3 pontos em 12 meses.
Outros cenários de retração levaram várias analistas a prever ao menos uma sinalização do Copom de que os juros poderiam começar a baixar, como o aumento de desemprego e redução do consumo.
O texto lembra ainda que as projeções de inflação do órgão em seu cenário de referência subiram para 5,8% em 2023 e para 3,6% em 2024, enquanto as de preços administrados são de 10,2% em 2023 e 5,3% em 2024.
“O Comitê julga que a incerteza em torno das suas premissas e projeções atualmente é maior do que o usual”, diz o texto.
Entre os riscos de alta inflacionária, o documento cita persistência da inflação global e a incerteza sobre o arcabouço fiscal e seus impactos sobre as expectativas para a trajetória da dívida pública. E adverte para uma desancoragem maior, ou mais duradoura, das expectativas de inflação para prazos mais longos.
“Por um lado, a recente reoneração dos combustíveis reduziu a incerteza dos resultados fiscais de curto prazo”, diz o Copom. “Por outro lado, a conjuntura, marcada por alta volatilidade nos mercados financeiros e expectativas de inflação desancoradas em relação às metas em horizontes mais longos, demanda maior atenção na condução da política monetária.”