“Se perdermos essa oportunidade, nunca mais faremos a Transformação Digital (TD) desse negócio.”

O tiro certeiro veio do CEO de uma multinacional americana que tenho como cliente. O racional era claro. Na perspectiva dos consumidores, a TD estava acontecendo “na marra” e não faria sentido voltar, no pós-crise, a oferecer produtos e serviços do jeito antigo. A operar do jeito antigo. A se comunicar do jeito antigo. Seria um retrocesso. A perda, como ele mesmo falou, de uma oportunidade única.

Lembrei da piada que tinha recebido em vários grupos de WhatsApp - e que replico aqui pra vocês:

“Quem liderou o processo de transformação digital na sua empresa?
( ) CEO
( ) CMO
( ) CTO
(x) COVID-19”

Nunca um meme foi tão feliz para representar um momento. Porque o CEO tentou a TD, o CMO tentou, o CTO também tentou, mas o que realmente acelerou esse processo em milhares de empresas Brasil afora foi a realidade imposta pelo Covid-19. Do dia para a noite. Sem aviso prévio.

A pandemia e a consequente necessidade do isolamento social forçaram pessoas de todos os cantos do mundo a reinventarem suas rotinas. Trabalhar junto de colegas, fazer HHs com amigos, celebrar aniversários, conversar com familiares. Atividades rotineiras passaram a ser realizadas pela internet com o objetivo único de se voltar à normalidade. Ou pelo menos de se revisitar uma sensação de normalidade tal qual a conhecemos.

O que aconteceu na prática foi que as pessoas foram mais velozes que os negócios. Elas criaram hábitos digitais antes que a maior parte das empresas estivessem preparadas para isso. Um lembrete: a disrupção digital nunca é causada pela tecnologia per se, ela acontece quando o consumidor altera seus hábitos de consumo. Quando ele opta por dar seu dinheiro para o Uber em detrimento do táxi, voilá! A disrupção começa a tomar corpo. Traduzindo: sempre é sobre o consumidor.

Vão vencer o jogo as empresas que conseguirem ler de forma mais rápida e precisa as necessidades dos consumidores pós-Covid-19

O difícil neste momento é prever a magnitude desta mudança na vida desse consumidor. Sim, porque um choque desta magnitude deixa sequelas. A duração e a intensidade desta pandemia é que irão determinar os impactos nas expectativas e hábitos futuros dos consumidores. Mais ou menos profundos de acordo com a intensidade do trauma. A única coisa que sabemos é que não há volta atrás, o antigo normal não existe mais. Temos que construir um novo normal.

Um estudo divulgado pela McKinsey capturou quatro desdobramentos que já estão sendo sentidos no Brasil. Em resumo: (i) clientes mais abertos a experimentar novas marcas; (ii) migração massiva para o consumo online; (iii) busca por produtos saudáveis, seguros e locais e (iv) diminuição do tíquete médio à medida em que consumidores buscam produtos mais baratos. Ou seja, a oportunidade está dada para marcas que captem mais rapidamente estas tendências.

A adequação a este novo normal se inicia olhando para fora (consumidores, canais, marca) mas também deve, na mesma medida, ser aplicada para dentro (colaboradores, gestão e cultura). Curiosamente, uma inesperada consequência do Covid-19 foi mostrar a algumas dessas companhias os benefícios de uma digitalização dos negócios. É como se a vida tivesse dando uma segunda chance àqueles líderes que não investiram o tempo e os recursos necessários para essa virada de chave.

Vão vencer o jogo as empresas que conseguirem ler de forma mais rápida e precisa as necessidades dos consumidores pós-Covid-19, adaptarem suas estruturas internas e seus modelos de negócios e oferecerem uma experiência superior. Na Nova Economia, assim como nas ilhas Galápagos de Darwin, ganha o jogo quem melhor se adapta.

*Renato Mendes é cofundador da Organica, professor na pós-graduação do Insper, mentor na Endeavor Brasil e autor do livro “Mude ou Morra”, finalista do Prêmio Jabuti 2019.

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