O empresário Caito Maia, fundador da Chilli Beans, passou dias bem difíceis em março. Quando ficou claro que o comércio seria fechado por conta da propagação do Covid-19, ele não acreditou no que estava acontecendo. “O meu oxigênio acabou naquele momento”, afirmou Maia, ao NeoFeed. “Foi uma coisa brusca.”
Não era para menos. A Chilli Beans conta com 917 lojas que vendem óculos de sol e de grau, além de relógios. Desse total, 77% delas estão em shopping centers ou em locais que tiveram que ser fechados por conta da pandemia.
Mas, passado o primeiro impacto, Maia, que também é jurado do programa de televisão Shark Tank, se trancou numa sala e, depois de cinco dias e de diversas videoconferências, saiu de lá com um plano para a Chilli Beans enfrentar a crise.
“Refiz todo o nosso planejamento financeiro até o fim do ano, sendo bem pessimista. Isso me deu tranquilidade e fôlego”, diz Maia.
O primeiro passo do plano da Chilli Beans para enfrentar a pandemia consiste em enxergar um horizonte. E como não havia nenhum, Maia resolveu criar o seu próprio horizonte. Um não. Na verdade, três. Ele estabeleceu três datas para que o comércio reabra. “Estou trabalhando com 1º de maio, 15 de maio e 1º de junho”, conta Maia.
A partir dessas datas, desenhou o seu planejamento financeiro. No ano passado, a Chilli Beans faturou R$ 650 milhões. A meta era atingir uma receita de R$ 780 milhões em 2020. Conseguirá? Maia acredita que será bem difícil chegar lá, mas ainda não desistiu de atingir esse número. Seu otimismo reside na estratégia desenvolvida para enfrentar a crise.
O fundador da Chilli Beans resolveu mudar o foco, literalmente, da companhia. Assim como a Omie, startup que atua com um sistema de gestão na nuvem que alterou sua estratégia em sete dias para enfrentar a crise, a Chilli Beans está se reinventando.
A varejista ficou conhecida e ganhou projeção no mercado brasileiro por conta de seus óculos de sol para o público jovem. Tanto que 80% das vendas da Chilli Beans são deste item. Os relógios e óculos de grau representam os outros 20%.
Sua participação no mercado brasileiro de óculos de sol era de mais de 22%, segundo dados da consultoria Euromonitor, referentes a 2017, o mais atual. A Chilli Beans só está atrás da italiana Luxottica, dona de marcas como Bulgari, Chanel, Dolce & Gabbana, Armani, Giorgio Armani, entre outras, que contava com uma fatia de quase 40%
Mas, por conta do coronavírus, o novo mix de produtos das lojas será mais equilibrado: 50% de óculos de grau e 50% de óculos de sol. “Mudei a estratégia. As pessoas precisam de óculos de grau. É um bem de saúde”, afirma Maia.
“Mudei a estratégia. As pessoas precisam de óculos de grau. É um bem de saúde”, afirma Maia
O empreendedor teve a oportunidade de testar esse novo mix em 30 lojas que foram reabertas em cidades espalhadas pelo interior do Paraná, de Santa Catarina e do Pará, onde as prefeituras autorizaram o funcionamento do comércio. “E as vendas estão equilibradas entre óculos de sol e de grau”, diz Maia.
Não se trata exatamente de uma estratégia nova. A Chilli Beans já conta com sete óticas. A pandemia, no entanto, acelerou o movimento de entrar em um mercado que fatura mais de R$ 20 bilhões por ano, segundo a Associação Brasileira das Indústrias Ópticas (Abióptica).
Mas como vender se quase todas as lojas estão fechadas e sem uma data para reabrir? Esse é o outro ponto da estratégia. Maia quer criar um exército virtual de seis mil vendedores pelo WhatsApp com capacidade de atender, em sua estimativa, mais de 1 milhão de consumidores.
A ideia é distribuir cupons para os vendedores das lojas franqueadas para que repassem aos seus clientes pelo WhatsApp. Quando as compras forem feitas no site da Chilli Beans, os vendedores irão receber comissões pela venda.
Hoje, o comércio eletrônico representa 4% das vendas totais da Chilli Beans. Com esse recurso, Maia quer aumentar essa fatia. Desde que as lojas fecharam, as vendas online já dobraram.
As vendas online não são a única estratégia para recuperar o fôlego. Enquanto as lojas estão fechadas, Maia quer levá-las até os consumidores. No bom e velho estilo de Avon e Natura, a Chilli Beans pretende fazer vendas porta a porta.
A Chilli Beans despachou 900 malas para seus franqueados que são uma espécie de miniloja portátil. O objetivo é usá-las para ir aonde o cliente estiver. Neste momento, em suas casas. “Dentro dessa loucura, eu coloquei toda a minha energia onde eu posso interferir”, afirma Maia.
Retaguarda
Mas não foi apenas na linha de frente que Maia agiu. O empreendedor também renegociou seus contratos com os fornecedores chineses, onde são fabricados os óculos da Chilli Beans. Consegui descontos e prazos maiores de pagamentos.
Para os franqueados, – a Chilli Beans opera exclusivamente neste modelo e tem apenas uma loja própria – ele também deu mais fôlego financeiro aos parceiros.
“As faturas de março e de abril foram jogadas para frente, assim como o fundo nacional de propaganda”, afirma Maia. Ele diz que o departamento jurídico da Chilli Beans foi colocado à disposição para auxiliar os franqueados na questão de como conseguir isenção de impostos e para entender as mudanças que estão sendo feitas nas leis trabalhistas durante a pandemia.
Fundada em 1998, a Chilli Beans contou com uma sociedade com Gávea Investimentos, do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, de 2012 até o ano passado. No fim do ano passado, a fatia de quase 30% da Gávea foi voltou para as mãos de Maia.
Agora com o controle total da companhia, Maia tem pela frente o seu maior desafio. Ao contrário do começo dessa reportagem, quando disse que estava sem oxigênio no início da crise do coronavírus, o fundador da Chilli Beans está mais tranquilo. Tem meditado e se exercitado mais. “Vamos enfrentar e vamos passar por isso”, afirma ele.