A americana “Arii” tem 18 anos e 2,6 milhões de seguidores no Instagram. Suas fotos, que exibem seus looks e o seu dia a dia, recebem milhares de curtidas na rede social.

A jovem é o que se convencionou chamar de “influenciadora digital”, pessoas que, pela alta popularidade no mundo online, são capazes de influenciar o comportamento de outros consumidores.

Tamanha fama no mundo digital incentivou “Arii” a ser uma empreendedora neste ano. Ela lançou uma linha de camisetas e conseguir vender “incríveis” 36 unidades. Isso mesmo. Os 2,6 milhões de seguidores do Instagram não deram a menor bola para o produto de “Arii”.

O fracasso de “Arii”, ao menos como vendedora de camisetas, demonstrou que não basta ter uma legião de fãs nas redes sociais para engajar seus seguidores. E essa regra, que fez a fama e a fortuna de muitos influenciadores digitais, está começando a mudar.

O Instagram, o Facebook e até mesmo o YouTube estão começando a matar as métricas que eles próprios inventaram para quem quer ser popular nas redes sociais.

Segundo essa fórmula, bastava ter um grande número de seguidores e de likes para chancelar a sua popularidade nas redes sociais. Os algoritmos entendiam isso e valorizavam os posts desses influenciadores, dando mais visibilidade a eles.

Agora, as curtidas caminham para a “aposentadoria”. Primeiro, foi o Instagram. Em julho, a rede social que pertence ao Facebook anunciou testes em sete países, incluindo o Brasil, para esconder os likes dos usuários.

O Facebook admitiu que pode esconder os likes dos usuários

Agora, é a vez do Facebook, que admitiu que pode esconder os likes dos usuários. Em vez de ver um número exato de curtidas no post, os usuários veriam se um amigo gostou do conteúdo. Só o autor do post conseguiria enxergar o total de curtidas.

O site de vídeos YouTube, do Google, também anunciou que vai deixar de mostrar números precisos sobre os assinantes de seus canais a partir deste mês.

“As curtidas são uma péssima métrica, pois são vazias e não geram conversão”, afirma Carolina Terra, pesquisadora e professora na área de mídias sociais. “São métricas de vaidades.”

Observe o comentário de Felipe Neto, um dos maiores influenciadores digitais do Brasil, com mais de 10 milhões de seguidores no Instagram e 34 milhões de inscritos em seu canal no YouTube.

"Conheço pessoalmente a maioria das pessoas consideradas mais belas e com as vidas mais perfeitas do Instagram e digo, com propriedade e sem medo de represálias, que quase todas essas pessoas são completamente diferentes do que vendem por aqui", postou ele, em julho.

E complementou que a medida de ocultar as curtidas do Instagram era positiva e podia “diminuir essa disputa vazia de vaidades, essa busca constante de tentar parecer algo que não é.”

Reais intenções

Não está claro as intenções de Instagram, Facebook e YouTube. De uma forma genérica, as empresas alegam estar motivadas por preocupações com o bem-estar mental das pessoas, tentando reduzir a competitividade das mídias sociais.

“O número de conexões e de likes é uma aproximação da importância e da influência”, afirma Marcelo Coutinho, coordenador do mestrado profissional da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo. “Ao redor dessas métricas, surgiu um sistema comercial. Talvez, agora o Facebook queira normalizar o mercado.”

Por normalizar, Coutinho entende que possa ser uma desconcentração do número de influenciadores e, ao mesmo tempo, uma autorregulação. “Perde-se o efeito bola de neve que quanto mais pessoas curtiam um post mais incentivava os outros a curtir”, diz o professor.

A professora titular da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), Beth Saad, acredita que possa haver motivações econômicas na mudança. “Essas métricas não estavam dando o retorno adequado para a plataforma”, afirma ela. “Um influenciador ganha para fazer um post de uma determinada marca, mas o que a plataforma leva?”

Não se trata de um mercado pequeno. Estima-se que, em 2020, o mercado de influenciadores digitais possa movimentar globalmente US$ 10 bilhões, segundo estudo da Mediakix, uma agência que atua nesta área.

Os influenciadores digitais e as marcas vão ter de deixar a abordagem quantitativa, baseada nas conexões e curtidas, e partir para uma mais qualitativa

A única certeza, segundo os dois especialistas, é que os influenciadores digitais, assim como as marcas que atuam nas redes sociais, vão ter de deixar a abordagem quantitativa, baseada nas conexões e curtidas, e partir para uma mais qualitativa.

Dessa forma, influenciadores digitais e marcas terão de entender o tipo de engajamento que seus conteúdos estão produzindo, a intensidade dos comentários, entre outros indicadores.

“O grande desafio das marcas e influenciadores será fazer com que alguém seja compelido a interagir e engajar com o conteúdo”, afirma Carolina. “Do contrário, será uma visibilidade rápida, volátil e efêmera.”

O influenciador digital Federico DeVito conta com mais de 400 mil pessoas inscritas em seu canal de YouTube e mais de 60 mil no Instagram. Ele publica vídeos sobre cultura pop, filmes e séries e escreve sobre lifestyle.

“Agora tenho mais liberdade e um sentimento de tranquilidade para postar aquilo que tenho vontade sem estar preso a cultura dos números", afirma ele.

DeVito diz que ainda está analisando a situação, mas que não sentiu, pelo menos até agora, nenhum efeito. Ele que vive das redes sociais – “meu trabalho full time”, diz – afirma que a demanda de trabalho não foi ainda afetada. Seu ganha-pão é escrever posts patrocinados e participar de eventos.

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