Elon Musk, o homem mais rico do mundo, é agora o maior acionista do Twitter, após ter adquirido 9,2% das ações da plataforma de mídia social por um pouco menos de US$ 3 bilhões. O anúncio elevou em 27% o valor das ações do Twitter, que continuaram a aumentar na sequência, horas após o comunicado.

O entusiasmo dos investidores não é surpresa. As plataformas de mídia social vêm sofrendo ultimamente graças às pressões recém-desenvolvidas em seus ecossistemas. Por exemplo, o Twitter, e também a Meta (ex-Facebook), foram alvos das mudanças de política de privacidade da Apple que limitam o rastreamento de usuários que usam o iOS, sistema operacional do iPhone

A chegada de Musk como maior acionista do Twitter provavelmente não fará diferença nessa questão, mas aborda duas outras preocupações recentes dos investidores. Em primeiro lugar, Musk ameaçava criar uma rede de mídia social concorrente, na qual os ideais de “liberdade de expressão” seriam respeitados.

Assim, desaparece agora a ameaça de um novo concorrente popular criado por um líder de tecnologia visionário. Isso também mostra que Musk desembarca no Twitter com a ideia de impulsionar mudanças no ecossistema, algo que deve ser encarado com seriedade.

Em segundo lugar, a presença de Musk tem o potencial de acelerar a inovação e a competitividade na plataforma de mídia social e isso o Twitter não conseguiu fazer suficientemente no passado.

Há poucos meses, Jack Dorsey, ex-CEO e cofundador do Twitter, anunciou que sairia da empresa e com isso abriu espaço suficiente no topo da empresa para movimentos ousados que possam ajudar a plataforma a crescer além do nível a que chegou hoje. Sabemos, então, que os investidores do Twitter estão felizes – mas a longo prazo os usuários também estarão?

O problema do algoritmo

O Twitter é como uma praça digital de uma cidade, onde uma quantidade infinita de pessoas, com uma miríade de opiniões, podem compartilhar seus pensamentos. No entanto, ao contrário de uma praça tradicional, as vozes que ouvimos são determinadas por algoritmos subjacentes de aprendizado de máquina. Eles são voltados para maximizar a exposição e os cliques e isso impulsiona as receitas de publicidade.

Esses algoritmos não têm a finalidade de enriquecer nossas vidas com os pontos de vistas mais ponderados e interessantes. Esse conflito inerente entre objetivos sociais e financeiros provoca uma distorção em relação a quem é ouvido e com que frequência.

Toda essa situação é exacerbada pelas imposições financeiras para que essa praça cresça a cada trimestre, o que cria uma pressão para otimizar constantemente os algoritmos com o objetivo de atrair o maior número possível de cliques.

Assim, esses algoritmos acabam se transformando em uma espécie de receita secreta do proprietário e isso cria uma atmosfera de desconfiança e até de misticismo sobre como esses serviços operam.

Musk - famoso por ser um usuário frequente do Twitter - tem falado sobre fazer com que os algoritmos de mídia social sejam mais abertos. Vamos ver o que ele fará na prática, mas este é um ponto de partida promissor que pode se transformar em um benefício para a plataforma.

Musk tem falado sobre fazer com que os algoritmos de mídia social sejam mais abertos. Este é um ponto de partida promissor que pode se transformar em um benefício para a plataforma.

Algoritmos de código aberto eventualmente permitiriam que os usuários escolhessem não apenas o que veem e não veem na plataforma, mas como isso acontece. Nesse caso, um usuário poderia escolher um algoritmo inclinado à direita enquanto o outro escolheria um algoritmo inclinado à esquerda. A plataforma não faria a escolha em nome desses usuários.
Essa abordagem pode aumentar a tração do Twitter, que há algum tempo está estável.

Como isso pode afetar as receitas da empresa, o tempo dirá. Mas uma medida tão ousada poderá pressionar o Facebook e outras plataformas a seguirem o exemplo do Twitter e assim tornar as mídias sociais potencialmente melhores para todos.

Defendendo a Tesla

A Tesla gasta quase nada com anúncios. A popularidade desta marca vai além de Musk. Mas as travessuras da vida real do bilionário da tecnologia, incluindo seus tuítes, são uma máquina de marketing orgânico que vale bilhões de dólares para a empresa automotiva.
Musk, no entanto, ainda deve seguir as regras do Twitter como qualquer um e isso inclui ser chutado se for longe demais.

Nos últimos anos, ele fez com que a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC, na sigla em inglês) interviesse em vários tuítes, emitindo multas algumas vezes. Em 2018 ocorreu um episódio particularmente complicado: Musk ameaçou via Twitter tornar a Tesla privada a um preço muito mais alto do que o das ações na época. Ele acabou deixando o cargo de presidente da Tesla e concordou com a proposta de que os advogados da empresa supervisionariam o que ele dissesse na plataforma de mídia social.

Ser o maior proprietário do Twitter não o protegerá da Comissão de Valores Mobiliários dos EUA. De fato, houve relatos de que ele teria se atrasado para notificar a SEC sobre sua última ação, enviando um formulário errado (antes de enviar o correto).

Ser o maior proprietário do Twitter não o protegerá da Comissão de Valores Mobiliários dos EUA

Há ainda dúvidas sobre se suas ameaças de lançar uma plataforma alternativa antes de comprar a participação no Twitter foram feitas com o objetivo de manipular o mercado.
A SEC atualmente o investiga sobre tuítes postados em novembro nos quais ele perguntava a seus seguidores se deveria vender sua participação na Tesla. Com isso, ele agora pode atrair mais ira do regulador. Mas aconteça o que acontecer, Musk certamente será capaz de avaliar se sua remoção estará em jogo alguma vez.

Essa é uma enorme vantagem defensiva para a Tesla, que fica mais protegida de perder uma fonte de marketing tão valiosa. Portanto, Musk pode até dizer que está focado na liberdade de expressão ao comprar esta participação no Twitter. Mas não devemos nos esquecer de que ele tem mais a ganhar com o acordo.

Descentralização da internet

Hoje, a maior parte da internet e seus usuários é controlada por um punhado de empresas, como Alibaba, Microsoft, Meta, Amazon, Google e, em menor grau, o Twitter. Isso criou uma hierarquia de poder em que muitas startups e investidores evitam ativamente áreas onde esses ecossistemas em crescimento constante estenderam seu alcance.

Até agora, Elon Musk e a empresa Tesla foram protegidos desse fenômeno ao se concentrarem com muito sucesso em causar uma disrupção na indústria automotiva, amplamente desconectada.

Ao comprar ações do Twitter, Musk tem agora uma pequena cabeça de ponte, mas bem estabelecida, de onde ele poderá enfrentar esses jogadores entrincheirados. Sua infame propensão a ter uma visão de longo prazo e escolhas estratégicas não convencionais provavelmente significará que ele vai agitar as coisas, mesmo que não esteja claro hoje como ele fará isso.

O que pode-se dizer com certeza é que o Twitter é hoje uma empresa muito mais interessante do que era há alguns dias.

Hamza Mudassir é Palestrante em Strategy na Cambridge Judge Business School

Este artigo foi originalmente publicado em inglês no The Conversation.