Este ano promete! Promete que não vai faltar emoção e desafios para as empresas de todos os tamanhos no Brasil. Seguramente não será mais do mesmo, pois, embora tenhamos falhas estruturais que se perpetuam, elas se traduzem numa realidade sempre surpreendente e criativa em nos criar problemas.

Enfrentamos atualmente turbulência até em temas consagrados, como a vacinação. Nas últimas décadas, não havia polêmica sobre os benefícios da vacinação e o país inclusive se tornou uma referência em campanhas massivas que levaram à erradicação de doenças. Pois a polarização política e social transformou essa certeza em polêmica ao ponto de atrasar nosso acesso às vacinas para o combate à pandemia da Covid-19.

Vivemos um momento de total incerteza sobre acesso à vacina, o que impacta na capacidade do nosso sistema de saúde de enfrentar a pandemia e, consequentemente,  na extensão em fatalidades e em duração desta terrível crise. Mesmo com a vacina, nos surpreendemos a todo instante com as previsões científicas sobre o controle da doença, pelo visto, somente possível em 2022.

O efeito nos negócios já é óbvio. Pode ser mais um ano de estagnação, ou pior, de retrocesso econômico. Afinal, o governo não terá a mesma possibilidade de sustentar o auxílio emergencial e queimou esse tempo sem encaminhar um horizonte de solução para a crise do coronavírus. É nesse cenário, no qual o sentido de urgência está ainda mais aguçado, que as grandes empresas terão de navegar em 2021.

Em tempo: foco nas grandes empresas porque são elas que terão capacidade de resistir à crise e construir soluções para o futuro. Muitas estão em setores essenciais ou de exportação, portanto, com mais condições de se manterem ativas e mais resilientes à crise. As pequenas e médias, em geral, permanecerão trabalhando prioritariamente pela sobrevivência.

Os três princípios que trazemos a seguir servem para muitas empresas e são fundamentais para os negócios que querem sair fortes desta múltipla crise.

1 – Sustente e fortaleça seus compromissos com a sociedade

Especialmente no Brasil, com a forte polarização político-social e o enfraquecimento da capacidade de resposta do governo federal, somada à crise de confiança nos governantes, as empresas surgem como as instituições capazes de responder às necessidades da sociedade.

As líderes já têm assumido, no Brasil e no Exterior, compromissos em diversos campos de influência, cobrindo lacunas regionais ou setoriais em educação, saúde, diversidade, formação profissional, acesso a novos negócios, desenvolvimento tecnológico, transformação da cadeia produtiva, redução do impacto ambiental, entre outras.

Todas as pesquisas sobre nível de confiança nas instituições mostram que as pessoas confiam mais (ou desconfiam menos) nas empresas em comparação aos governos. O mais recente, o Trust Barometer, da Edelman, lançado no início de janeiro, mostra que as empresas superam em confiança os governos em 18 dos 27 países pesquisados.

Há, de fato, uma crise de confiança generalizada, decorrente do enfraquecimento das lideranças mundiais e da pulverização da informação nas mídias sociais. Neste contexto, a confiança é pautada pela proximidade. Por aqueles em quem eu convivo, conheço e já demonstraram ser confiáveis. Assim, aquelas companhias que já provaram ser boas empregadoras, parceiras leais, respeitosos vizinhos, ganham terreno em seus campos de influência.

Para se sustentar a confiança, é necessários saber dialogar com a sociedade. E dialogar demanda duas atitudes tão simples e consagradas, quanto desafiadoras para o mundo corporativo: 1) saber ouvir; 2) comunicar com total transparência.

Estes dois processos se tornaram centrais para a tomada de decisão das empresas. Sem eles, é impossível hoje estabelecer compromissos relevantes com os públicos essenciais para o desenvolvimento dos negócios, tampouco para com a sociedade em geral, ou ainda ajustar continuamente o planejamento à constante transformação da realidade.

Enfim, comunicar a realidade como ela é: escutar as demandas e o retorno dos seus públicos, recebendo com igual empatia as opiniões favoráveis e contrárias; e estabelecer metas que venham ao encontro dessas expectativas é a principal oportunidade a frente das grandes empresas ou mesmo das menores que exploram nichos ou têm forte relação com seus parceiros e consumidores.

2 – Abrace os temas ESG (Ambientais, Sociais e de Governança)

Sim, o mundo corporativo adora uma novidade. E adere a esse modismo em efeito manada. No entanto, entre perdas e ganhos, essa adesão, ainda que pouco consciente, abre espaço para aprendizados e a efetiva evolução das práticas de muitas empresas. É o caso da atual febre pelos temas ESG (sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança).

A busca por atenção aos temas ESG não é nova, vem sendo trabalhada nas últimas duas décadas, mas amadureceu nos últimos dois anos, quando os investidores (e os analistas e gestores que os representam) começaram, de fato, a questionar as empresas sobre suas performances nos campos ambiental, social e de governança, mais focados em conter potenciais riscos. Assim, quando passou a interessar ao dinheiro, imediatamente passou a interessar às empresas.

Atualmente ESG tem sido entendido por muitos como a nova roupagem da surrada sustentabilidade. Na verdade, tanto faz. O importante é que as empresas orientem sua atenção e compromissos para negócios cujo impacto/performance possam ser medidos nas dimensões ESG. E essa comunicação transparente e estruturada de ações, resultados e metas sirva de alimento para o diálogo com a sociedade e o constante e necessário realinhamento estratégico.

3 – Tenha foco na ação

Todos estamos cansados de blábláblá. E o contexto que descrevemos acima, pede compromissos e ações concretas dos negócios. Essa é a oportunidade e ela depende de um papo reto com a sociedade. O que eu posso fazer agora é isso. O que eu quero fazer (e é suficientemente ambicioso) é mais isso, mas preciso de um prazo até tal ano. E eu vou mostrar minha evolução no tempo até chegar lá.

Discurso vazio ou que tenta transformar pequenas evoluções em grandes conquistas já não funcionam, ao contrário, minam a confiança das audiências, cada vez mais críticas. Para completar, precisamos reforçar a confiança daqueles que estão mais próximos, dos quais dependemos mais para o sucesso dos nossos negócios. Assim, é uma péssima estratégia mentir, omitir ou distorcer informações para quem melhor nos conhece e de quem mais dependemos.

A pandemia também abriu muito espaço para a colaboração, como forma de viabilizar soluções emergenciais ou mesmo criar novas formas de atuação. E as grandes empresas, como elos mobilizadores de cadeias produtivas, podem e devem atuar como catalizadoras de arranjos locais ou setoriais que proporcionam respostas a problemas que dificilmente seriam possíveis se tentadas isoladamente por uma organização. Esse esforço vale a pena e têm gerado muitos resultados.

Sob o ponto de vista da estratégia global de sustentabilidade, esta é a década da ação. Fundamental para o alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, estabelecidos pela ONU, para 2030. As empresas que têm ambição de prosperar nesta década precisam estar conectadas e contribuir para o alcance das metas contidas nesta agenda.

Álvaro Almeida é jornalista especializado em sustentabilidade. Diretor no Brasil da consultoria internacional GlobeScan, sócio-fundador da Report Sustentabilidade, agência que atua há 17 anos na inserção do tema aos negócios. É também organizador e curador da Sustainable Brands São Paulo, integra o Conselho Consultivo Global desta rede de conferências e participa da Comissão de Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).