Fundada em 2014, a Trocafone foi um dos nomes que desbravaram o modelo de compra e venda de celulares seminovos e recondicionados no Brasil. Com essa proposta, desde então, a startup atraiu R$ 200 milhões junto a fundos como Bulb Capital e Barn Investments.

Em 2021, a empresa decidiu testar o apetite dos investidores por essa trajetória ao protocolar o pedido para uma oferta pública inicial de ações. Foram duas as tentativas. Entretanto, a companhia, assim como tantas outras no período, recuou do seu intento quando as janelas favoráveis para IPOs se fecharam no mercado.

As conversas sobre a retomada de uma oferta ficaram para 2023 e podem incluir o percurso até um IPO no exterior. Mas, enquanto o tema não volta à mesa, a Trocafone antecipou ao NeoFeed uma agenda de projetos que envolve a oferta de produtos financeiros e de seguros, além da entrada em novos segmentos.

“Estamos dando sequência à transição de uma empresa que apenas comprava, reprocessava e revendia dispositivos”, diz Guille Freire, cofundador e CEO da Trocafone, ao NeoFeed. “Nós entendemos que esse modelo, por si só, não era suficiente para democratizar, de fato, o acesso à tecnologia.”

A startup já mantém, por exemplo, uma parceria com a Porto que, por meio de um plano de assinatura anual, dá acesso a aparelhos da Samsung. Ao fim de doze meses, o usuário escolhe se compra o dispositivo ou troca por um novo modelo. Nessa combinação, a Trocafone é responsável pelos celulares devolvidos.

Com um papel semelhante, a companhia tem parcerias em programas de varejistas como Magazine Luiza e Americanas, e operadoras como Vivo e TIM. Nessas iniciativas, o consumidor dá seu aparelho usado como parte do pagamento de um novo e a Trocafone recolhe, recondiciona e revende esses dispositivos.

Além de conversas com a Samsung e com a Apple para construir alternativas no modelo de leasing, a Trocafone trabalha em novas opções no seu menu. Com lançamentos programados para o quarto trimestre de 2022, um dos projetos em curso é a oferta de microcréditos para financiar a compra de aparelhos.

“Estamos na fase de costurar parcerias com bancos e fintechs e trabalhar a quatro mãos para desenvolver essas ofertas. Ainda não temos taxas definidas”, diz Freire. “A ideia é usar o próprio aparelho como um colateral e nós já temos um sistema que trava funções, caso o consumidor não pague a parcela.”

Guille Freire, cofundador e CEO da Trocafone

Outra iniciativa em andamento envolve a estruturação de um braço de aluguel de smartphones novos, dentro do conceito de device as a service. Com projeção de chegar ao mercado também no fim de 2022, a oferta em questão vai marcar a entrada da Trocafone no atendimento a empresas.

A startup já mantém conversas com fabricantes, operadoras e varejistas para colocar o novo formato de pé. Uma das possibilidades é que esse modelo seja ofertado na ponta por esses parceiros e que a Trocafone ofereça a estrutura por trás dos programas.

Com essa pegada, o plano é oferecer contratos nos quais, além dos aparelhos e da possibilidade de upgrades nos modelos, as companhias clientes terão acesso a serviços de reparos e de manutenção, a partir do centro da startup instalado em Barueri (SP).

Em outra “estreia”, a Trocafone vai estender o seu modelo de compra e venda de dispositivos seminovos à categoria de notebooks. Nessa ponta, prevista para ser lançada em setembro, a empresa está fechando acordos com varejistas da sua rede para criar programas nos quais as máquinas usadas poderão abater o preço de um equipamento novo.

Em paralelo, um outro foco é reforçar e aprimorar a oferta de seguros, frente na qual hoje, a Trocafone já tem parcerias com empresas como a Sura e a Go Phone, com alternativas de proteção contra furtos e danos no aparelho, além de garantia estendida, vendidas nos quiosques e no site da companhia.

“Hoje, nos Estados Unidos, quando o cliente tem qualquer problema, o aparelho é substituído por um dispositivo usado, enquanto no Brasil, envolve um celular novo”, explica Freire. “Isso encarece o seguro que, no mercado americano, é quase a metade do valor cobrado aqui.”

Partindo dessa premissa, a companhia está negociando com seguradoras – cujos nomes não foram revelados, para desenvolver alternativas mais acessíveis e lançá-las até o fim do ano. “Hoje, os seguros disponíveis no mercado estão na faixa de 30% a 35% do aparelho”, diz. “Nossa ideia é baixar para algo próximo de 20%.”

Como parte da estratégia para avançar em todas essas iniciativas, a Trocafone também está reservando espaço na sua agenda para uma frente destacada no prospecto do seu IPO: as aquisições. A projeção é anunciar ao menos um acordo até o fim do ano. Além de companhias ligadas a seguros e serviços financeiros, a empresa está olhando para ativos ligados a reparos de equipamentos.

Usados em alta

A Trocafone vai financiar todos esses movimentos com caixa próprio e não vê, a princípio, necessidade de levantar novas rodadas de capital. Freire não abre os números atuais da operação, mas diz que o crescimento está acima dos níveis pré-pandemia e que a projeção é fechar o ano com um salto próximo de 50% na receita sobre o resultado de 2021.

De acordo com os indicadores divulgados no prospecto do IPO, a startup registrou uma receita líquida de R$ 217,2 milhões, em 2019. Já em 2020, o balanço trouxe uma receita líquida de R$ 199,2 milhões.

Em 2020, seu último resultado público, a Trocafone reportou uma receita líquida de R$ 199,2 milhões

Dados da IDC ajudam a reforçar as projeções da Trocafone. Segundo a consultoria, o mercado brasileiro de celulares seminovos deve movimentar R$ 5 bilhões em 2024, a partir da venda de 5,5 milhões de aparelhos. Em 2020, esses números foram, respectivamente, de R$ 2,2 bilhões e 3,1 milhões de dispositivos.

“O consumidor está buscando novas formas de comprar um produto que caiba no seu bolso”, diz Reinaldo Sakis, analista de consumer devices da IDC. “Ao mesmo tempo, há um mercado mais estruturado, com os fabricantes investindo em novos formatos, como aluguel e leasing, que também favorecem esse modelo.”

Nesse cenário, outros nomes estão disputando o mercado com a Trocafone. Em junho, por exemplo, a Allied, distribuidora de produtos de tecnologia listada na B3, lançou a Trocafy, empresa de smartphones recertificados, estruturada a partir da aquisição, em 2021, da BrUsed.

Ao entrar no segmento de aluguel para empresas, a startup também vai encontrar novo rivais. Entre eles, a Simpress, empresa brasileira de outsourcing controlada pela HP. Com origem em impressoras, a companhia estendeu sua oferta na pandemia, ao lançar um braço de locação de computadores e celulares.

Outra concorrente nesse espaço é a também brasileira Plugify que, em maio desse ano, captou R$ 120 milhões em um Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) para financia sua operação de aluguel de equipamentos de tecnologia.