Uma nova estimativa da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) divulgada na quarta-feira, 12 de novembro, em Paris, mostra que a demanda por petróleo e gás poderá continuar a crescer até 2050 - e não até 2030, como previsto anteriormente. A informação caiu como um balde de água fria a 7.500 km de distância, na 30ª Conferência do Clima da ONU, a COP 30, em Belém (PA).

Em seu novo Panorama Mundial da Energia, a IEA atribui a revisão para um prazo maior de demanda por petróleo e gás à adoção mais lenta de tecnologias verdes, entre outros fatores. O relatório foi publicado enquanto as nações reunidas na COP 30, na capital paraense, com o Brasil à frente, articulavam a aprovação de uma resolução que estabeleça um plano prático para o abandono dos combustíveis fósseis.

A proposta - discutida desde a COP 28 em Dubai, em 2023 - já vinha encontrando resistência em Belém por parte da delegação da Arábia Saudita, país que depende da exportação de petróleo, responsável por 60% da receita do governo e mais de 20% do Produto Interno Bruto (PIB).

Em seu relatório, a IEA afirma que, com a demora dos países em implementar a transição energética de combustíveis fósseis para fontes verdes, a demanda por petróleo e gás poderá continuar a crescer até 2050, enquanto o carvão entraria em declínio antes do final desta década.

Trata-se de uma revisão de outro modelo anterior, agora descartado, no qual as energias renováveis e a rápida adoção de carros elétricos levariam o mundo a se desvencilhar do petróleo e do gás por volta de 2030.

A mudança da política energética dos EUA sob Donald Trump, com maior dependência de combustíveis fósseis, a possibilidade de adoção de veículos elétricos mais lenta do que o esperado e o custo elevado da transição energética dos países, ante previsão anterior, contribuíram para a IEA alterar sua estimativa.

O pico do consumo de petróleo — o ponto em que a demanda global de petróleo atinge seu nível mais alto antes de iniciar um declínio sustentado — tem estado no centro do debate energético nos últimos anos. A IEA estimou repetidamente que a demanda por petróleo atingirá seu pico antes de 2030, enquanto outros no setor preveem que isso ocorrerá mais tarde nesta década ou até mesmo depois.

A agência inclui diversos cenários em seu relatório anual, que frequentemente servem como base influente para governos e empresas ao planejar políticas e investimentos em energia.

No Cenário das Políticas Atuais (CPS, na sigla em inglês), baseado nas políticas e regulamentações existentes, por exemplo, a demanda global aumenta para 105 milhões de barris por dia em 2035 e 113 milhões de barris por dia em 2050, ante 100 milhões de barris por dia no ano passado, impulsionada principalmente por matérias-primas petroquímicas e pela aviação.

Entretanto, a participação dos veículos elétricos no total de vendas de automóveis deverá estabilizar após 2035 devido ao apoio político insuficiente em algumas regiões, com exceção da China e da Europa. Essa desaceleração deverá impulsionar ainda mais o crescimento da demanda por petróleo para além da década de 2030.

Cenário de incertezas

A decisão de reintroduzir o cenário CPS foi ditada “pela mudança no contexto econômico e energético”, afirmou o diretor executivo da IEA, Fatih Birol.

“Existem muitas incertezas hoje em dia — econômicas, políticas e tecnológicas”, diz Birol. “Queremos ter uma gama mais ampla de cenários para tentar abordar todas essas incertezas, e espero que isso atenda à demanda de nossos líderes, nossos governos, a indústria e outras partes interessadas.”

Um aspecto do relatório que chama a atenção é que a revisão confirma o declínio da produção de petróleo nos campos existentes, mas ao mesmo tempo assegura que o aumento do consumo será rapidamente absorvido.

Segundo a IEA, até 2035 serão necessários cerca de 25 milhões de barris por dia em novos projetos de petróleo para manter o equilíbrio dos mercados, com o aumento dos preços do petróleo incentivando investimentos adicionais na exploração e produção.

Essa previsão representa uma boa notícia para o Brasil, que acaba de aprovar a exploração da Bacia do Amazonas da Margem Equatorial. A tendência é que a produção de petróleo na Margem Equatorial seja maior a partir de 2030, o que deve assegurar mercado por mais duas décadas.

Já o Cenário de Políticas Declaradas (STEPS, na sigla em inglês) considera a aplicação de uma gama mais ampla de políticas, incluindo as formalmente propostas, mas ainda não adotadas. Nesse cenário, a demanda por petróleo atinge o pico de 102 milhões de barris por dia por volta de 2030, antes de declinar gradualmente.

No entanto, ao contrário das previsões do ano passado, a demanda por gás continua a crescer na década de 2030, impulsionada por mudanças nas políticas dos EUA e por um aumento de 50% na oferta global de gás natural liquefeito (GNL), o que pressiona os preços.

“Temos vários cenários baseados em diferentes premissas políticas e que mostram diferentes trajetórias energéticas com diferentes consequências, e não atribuímos nenhuma probabilidade a nenhum dos cenários”, disse Birol. “Cabe aos governos, à indústria e a outras partes interessadas escolherem aquele ao qual consideram que devem dar mais atenção.”

O relatório observa, por exemplo, que as energias renováveis crescem mais rapidamente do que qualquer outra fonte de energia importante em todos os cenários, impulsionadas pela energia solar fotovoltaica. A China continua sendo o maior mercado, respondendo por 45% a 60% da implantação global na próxima década, e segue dominando como o maior fabricante da maioria das tecnologias renováveis.

No que diz respeito aos minerais críticos, o principal desafio reside no alto nível de concentração da oferta, particularmente no refino, onde a China controla cerca de 70% do mercado de 19 dos 20 minerais críticos relacionados à energia.

“Quando analisamos a história do setor energético nas últimas décadas, não há outro momento em que as tensões em torno da segurança energética tenham afetado tantos combustíveis e tecnologias simultaneamente – uma situação que exige o mesmo espírito e foco demonstrados pelos governos quando criaram a IEA após o choque do petróleo de 1973”, diz Birol, o diretor executivo da IEA.

O custo financeiro da transição energética, maior do que o esperado anteriormente, também faz parte dessa equação. A própria IEA estima que o investimento global em energia limpa precisa subir para US$ 5,3 trilhões anualmente até 2035 para atingir a meta de Emissões Líquidas Zero até 2050.

Embora o investimento atual no setor de energia gire em torno de US$ 3 trilhões, com US$ 1,9 trilhão destinados à energia limpa, isso não é suficiente e a lacuna de investimento, especialmente para economias emergentes e em desenvolvimento, permanece substancial.

A IEA ressalta que, apesar dos altos custos iniciais, a transição levará, em última análise, a um sistema energético mais barato e acessível ao longo do tempo, desde que as principais barreiras ao investimento, os altos custos de capital nos países em desenvolvimento e a potencial volatilidade de preços sejam superados.