O Brasil está preparado, mas o “day after” da eleição para valer ficou para daqui a 29 dias. Em 30 de outubro, os brasileiros voltarão às urnas para definir quem será o próximo presidente.

A votação em 1º turno realizada no domingo, 2 de outubro, não foi conclusiva. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva conquistou 48,43% dos votos válidos e o presidente Jair Bolsonaro, que tenta a reeleição, obteve 43,2%.

Mas o alívio de estar superada a primeira etapa produziu forte reação positiva dos principais ativos na abertura dos negócios nesta segunda-feira, 3 de outubro: a bolsa disparou e o dólar e os juros tombaram.

O “day after” da eleição – com a definição do próximo presidente do Brasil – está no radar dos investidores, dada a elevada polarização da disputa entre os dois candidatos; o resultado do 1º turno em placar apertado, que pode levar à radicalização da militância; e à perspectiva de devolução – ou acréscimo – de prêmios nos ativos.

As próximas semanas poderão ser marcadas por ampla volatilidade, a depender de eventuais anúncios de equipe ou propostas sobre o arcabouço fiscal a partir de 2023 que podem ser feitos tanto por Lula quanto por Bolsonaro.

Não há indício de disruptura no mercado financeiro que tem se mostrado mais exposto e reativo à turbulência externa do que a eventos domésticos. Não se descarta, porém, um aumento na tensão política nas próximas semanas, o que poderá contaminar o mercado e alimentar movimentos especulativos.

Mas o Tesouro tem um antídoto – com 12 zeros – para enfrentar eventos inesperados que coloquem em risco o financiamento da dívida pública: R$ 1,178 trilhão, o dobro do nível prudencial adequado para a gestão da dívida e suficiente para garantir sua rolagem por quase um ano.

Essa reserva monetária não é instrumento de ocasião. Começou a ser criada há duas décadas. Inicialmente, para cobertura de três meses de vencimentos da dívida pública e com o objetivo de dar conforto ao governo em qualquer situação imprevisível. E não apenas doméstica.

Essa garantia de refinanciamento e uma coleção de indicadores econômicos foram apresentados a investidores estrangeiros pelo comando do Tesouro Nacional em “roadshow”, em Londres, na semana passada.

Paulo Valle, secretário do Tesouro, mostrou que as despesas do governo que chegaram a 26,1% do PIB durante a pandemia já declinaram a 18,6% e devem recuar a 16,5% em 2025.

Aos investidores, o secretário falou da redução de despesas com o funcionalismo público federal decorrente da reforma previdenciária e do intenso processo de digitalização de serviços do governo.

A apresentação de Valle aos estrangeiros foi divulgada na quinta-feira, 29 de setembro. Em entrevista coletiva, ele confirmou que a volatilidade dos ativos impera no mercado internacional, mas observou que há muito dinheiro para investimentos que está “aplicado em moeda forte e em prazos mais curtos”, neste momento, em função da turbulência observada nas maiores economias.

O secretário do Tesouro disse também que, apesar de questionamentos sobre a eleição no Brasil, os investidores não demonstram preocupação com o próximo governo.

“Os estrangeiros têm uma visão de longo prazo. E há consenso de que o Brasil saiu na frente no ajuste da política monetária ante a inflação e o país está bem-posicionado”, diz o titular do Tesouro, para quem o País tem todas as condições para se descolar dos demais na preferência dos investidores.

Segundo Valle, o investidor estrangeiro acompanha a eleição, o desempenho fiscal e o Orçamento do ano que vem, mas vê o Brasil bem situado na comparação com outras economias emergentes.

Valle informou aos estrangeiros que a dívida bruta do Brasil equivalente a 79,6% do PIB em dezembro de 2019, portanto antes da pandemia, estava em 79,5% em junho deste ano. Em agosto, o indicador já havia recuado a 77,5%, segundo o Banco Central.

Esse desempenho contrasta com a evolução do mesmo indicador de 100 países que era de 53,6% do PIB em 2019 e, em abril deste ano, segundo dados mais recentes, estava projetada em 62,3%, refletindo, portanto, um aumento de 8,7%.

Em comparação semelhante, em países de renda média da Ásia, Europa e América Latina, a dívida bruta em proporção do PIB evoluiu de 51,6% do PIB em 2019 para 62,9% em abril de 2022 – um salto de 11,3%.

Um indicador de solvência externa relevante para os investidores também é favorável ao Brasil. O investimento externo direto (IED) dedicado ao país compensa com folga expressiva o déficit em transações correntes.

Em 2021, enquanto o investimento direto alcançou US$ 46 bilhões, o déficit foi de US$ 28 bilhões. A projeção para este ano é de US$ 58 bilhões de IED, ante US$ 19 bilhões em déficit de transações correntes. E as projeções de mercado apontam oferta crescente de investimento externo direto de até US$ 80 bilhões em 2026 – o dobro do déficit estimado em US$ 40 bilhões.

Aos investidores estrangeiros, o Tesouro Nacional também destacou que as reservas internacionais correspondem a 22,5% do PIB, enquanto da dívida externa líquida do país é de 10% do PIB.

Em sua apresentação em Londres, o Tesouro também demonstrou que a inflação brasileira, comparativamente a países latino-americanos, EUA e Zona do Euro, inspira confiança na convergência para a meta em 2024 – sinalização dada pela centena de contribuidores da pesquisa Focus.

No campo das reformas, a apresentação de Paulo Valle pontuou avanços alcançados desde 2016, quando foi aprovado o teto de gastos – principal âncora do arcabouço fiscal no País.

Em 2017, foi aprovada a reforma trabalhista com regras mais flexíveis; em 2019, a reforma previdenciária e o programa de devolução de recursos pelo BNDES ao Tesouro Nacional; em 2020, foi aprovado o marco legal do saneamento, a Lei de Falências; a autonomia do Banco Central transformou-se em lei no ano passado; em, em 2022, ocorreu a privatização da Eletrobras.

O Tesouro acena com esforços em favor da reforma administrativa, reforma tributária, privatizações, concessões e parcerias público-privadas e o processo de adesão do Brasil à Organização para a Coordenação do Desenvolvimento Econômico (OCDE).