O clima de beligerância que nas últimas semanas imperava na Fiesp, mergulhada numa disputa entre o seu presidente, Josué Gomes da Silva, e sindicatos patronais de oposição à sua gestão, teve uma trégua nesta segunda-feira, 30 de janeiro, com a visita do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, à sede da entidade, na Avenida Paulista.
Haddad estava acompanhado do economista Gabriel Galípolo, secretário-executivo do Ministério da Fazenda e ex-integrante do Conselho Superior de Economia da Fiesp.
A presença de Haddad e de presidentes de entidades industriais do Rio de Janeiro e Minas Gerais, uma demonstração de prestígio do atual presidente da Fiesp, serviu para mostrar que as disputas internas na entidade passam longe da agenda de interesse da indústria neste início de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Apresentado por Gomes da Silva, Haddad fez um pronunciamento que agradou aos empresários presentes, defendendo como prioridade do governo a recuperação da indústria de transformação do País e a aprovação da reforma tributária, entre outros temas.
A agenda do encontro foi cuidadosamente preparada para colocar um fim à crise na entidade. Conduzida por Gomes da Silva, a reunião foi aberta e contou com participação da diretoria eleita, presidentes, vice-presidentes, membros dos conselhos superiores e diretores dos departamentos.
Os presidentes e delegados de sindicatos tiveram espaço reservado, reforçando a preocupação de Gomes da Silva de dar mais prestígio aos sindicatos menores, onde se concentra o núcleo de oposição à sua gestão.
O ex-presidente Paulo Skaf, ligado à oposição, foi colocado na mesa central, a poucos metros de Haddad.
Além dos pronunciamentos de Gomes da Silva e de Haddad, a reunião contou com participação de empresários e líderes na plateia, que fizeram perguntas diretas ao ministro.
“Front delicado”
O presidente da Fiesp abriu o debate com duas sugestões ao governo, que podem ser adotadas antes da aprovação da reforma tributária.
Uma delas é a depreciação dos investimentos feitos na indústria de transformação.
"Aplaudimos a neutralidade da reforma, mas, se o senhor abrir mão um pouco em um primeiro momento da arrecadação na indústria de transformação, o senhor vai ganhar logo na frente", disse Josué Gomes.
Gomes da Silva também reforçou a necessidade de reduzir o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) - promessa feita pelo vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, ao visitar a entidade no começo do mês.
Ao falar para a plateia, Haddad enfatizou que o governo Lula tem como prioridade três agendas de interesse da indústria: fiscal, de crédito e regulatória.
A primeira prevê a aprovação da reforma tributária e do arcabouço fiscal. “Essas duas aprovações a curto prazo já vão pacificar o Brasil em um front delicado", afirmou.
Sobre uma reforma no sistema de crédito, o ministro informou ter se reunido mais cedo, por videoconferência, com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para tratar do tema.
“Temos 70 milhões de CPFs negativados, não há recuperação econômica sem melhorar a oferta do mercado de crédito”, acrescentou.
A agenda regulatória, com remoção de lei e regulações que atrapalham os investimentos, interessa ao setor industrial.
O ministro diz ver espaço para "acomodação virtuosa" do câmbio e juros no Brasil sem comprometer a competitividade da nossa indústria.
“Se combinar com a tendência de valorização do real frente ao dólar, inclusive pelo ingresso de capital estrangeiro, tem espaço para uma acomodação virtuosa dessas variáveis que não compromete a competitividade do Brasil do ponto de vista do dólar e pode favorecer do ponto de vista do crédito”, acrescentou Haddad.
Cachimbo da paz
O clima cordial na Fiesp reforçou a percepção de que a disputa interna está próxima de um final feliz, constatou o NeoFeed ao acompanhar a agenda oficial.
Desde a semana passada, houve grande articulação dos dois grupos para superar as divergências envolvendo representantes de sindicatos patronais de oposição, ligados a Skaf, e o atual presidente da entidade – que chegou a ser destituído numa assembleia geral no dia 16 de janeiro, cujo resultado não foi reconhecido por Gomes da Silva.
Na última segunda-feira, 23 de janeiro, num primeiro gesto de conciliação, Gomes da Silva comandou uma reunião, aberta à participação de todos os sindicatos, para discutir a governança da entidade patronal, uma velha reivindicação da oposição.
Na sexta-feira, 27 de janeiro, Gomes da Silva e Skaf assinaram uma nota conjunta sinalizando, em tom conciliador, uma “gestão mais abrangente” na Fiesp, com “a participação de todos os sindicatos filiados, por meio de suas lideranças”.
“A montagem da visita do Haddad, com participação de todos os sindicatos filiados em locais reservados, mostrou o atendimento dos pedidos feitos pela oposição”, disse Eduardo Capobianco, vice-presidente não numerado da Fiesp.
Sobre a questão pendente da destituição de Gomes da Silva, há divergências. Um empresário presente, que não quis se identificar, disse acreditar que “todos vão colocar uma pedra no assunto”.
O jurista Miguel Reale Jr, advogado de Gomes da Silva, foi mais cauteloso. “A crise está sendo superada”, disse, sem entrar em detalhes sobre o episódio da assembleia.
Questionado sobre a crise recente na Fiesp, Haddad, mesmo involuntariamente, foi direto ao ponto ao conversar com os jornalistas.
“Não estou a par das divergências internas na Fiesp, mas temos uma agenda externa muito importante e urgente, que é levar ao Congresso Nacional a reforma tributária”, disse Haddad. “Quanto às questões caseiras, eles são adultos e resolvem.”