Na retórica e na prática, os maiores bancos centrais do mundo – Federal Reserve (Fed), Banco Central Europeu (BCE) e Banco da Inglaterra (BoE) – evitaram o caos que ameaçava os mercados globais na manhã desta quarta-feira, 28 de setembro. Não houve ação conjunta, mas coincidente. E funcionou.

O Banco da Inglaterra entrou em campo com uma intervenção inesperada no mercado de títulos. Os presidentes do BCE e do Fed, Christine Lagarde e Jerome Powell, fizeram pronunciamentos públicos e enxutos, delimitando declarações e repercussões que poderiam pesar sobre os ativos.

O roteiro cumprido pelas autoridades monetárias interrompeu a desvalorização mais intensa das principais moedas ante o dólar. Embora o estrago dos últimos dias não tenha sido revertido, o saldo foi positivo.

A moeda americana segue nas máximas em 20 anos. Mas o Dollar Index (DXY), que mede a relação da moeda com seis divisas de economias desenvolvidas, declinou de mais de 114 pontos para 112 pontos em poucas horas. O euro e a libra valorizaram. Outras moedas também foram beneficiadas. No Brasil, o real chegou a ser cotado acima de R$ 5,40, desceu a R$ 5,33 e encerrou os negócios a R$ 5,34.

Prêmios agregados aos títulos públicos europeus e americanos também passaram por um detox. A arrancada de juros foi contida e a alta revertida no dia, mas a escalada recente não foi neutralizada e não há indícios de que será.

Nas últimas semanas, os juros mudaram de patamar no mundo desenvolvido. Os BCs vêm promovendo ajustes nas taxas básicas e os mercados recalibram os rendimentos de títulos ante a perspectiva de mais aperto monetário e retração econômica.

O posicionamento dos bancos centrais nesta quarta-feira também conseguiu evitar que os principais índices das bolsas em Nova York tombassem a recordes de baixa em 2022. Na terça-feira, 27 de setembro, o S&P 500 chegou a cair a 3.623,29 pontos – mínima em dois anos. Hoje, fechou aos 3.718,67 pontos, em alta de 1,96%. O Dow Jones ganhou 1,88% e o Nasdaq 2,05%.

Alvo de atenção pelas críticas disparadas contra o pacote de corte de impostos e aumento de gastos anunciado pelo Reino Unido na sexta-feira, 23 de setembro, o Banco da Inglaterra deu um cavalo de pau em sua política monetária.

O BoE anunciou uma intervenção nas operações com dívida pública com o objetivo de estabilizar os mercados que estão “disfuncionais”, colocando em risco a “estabilidade financeira do Reino Unido”. E deflagrou a compra imediata de papéis de longo prazo para injetar dinheiro na economia.

A operação se estende até 14 de outubro. Essa decisão, que precipitou a correção global dos ativos, é oposta à ação prevista para a semana que vem, quando o BoE deveria iniciar a venda de títulos de sua carteira.

O objetivo? Tirar dinheiro de circulação e potencializar o aperto monetário em curso para combater a inflação de 9,9%. A venda de títulos foi suspensa. O BoE diz que será retomada, mas não deu data.

Com sua intervenção, o Banco da Inglaterra impôs um freio de arrumação nos mercados, visto como temporário por analistas porque, na prática, a ação dos BCs contra a inflação já desencadeou uma batalha entre as moedas.

Na sequência da mobilização do BoE, por coincidência de calendário, Christine Lagarde, chefe do BCE, reafirmou durante um fórum econômico que a instituição deve seguir elevando o juro em busca da convergência da inflação para a meta de 2% no médio prazo.

A sinalização de mais juros nas próximas reuniões de política monetária para além da taxa neutra se mantém, caso a inflação não decline. Mas Lagarde reiterou que o BCE não quer causar recessão e trabalha para garantir a estabilidade econômica.

Jerome Powell, presidente do Fed, também com pronunciamento pré-agendado, participou por vídeo da Community Banking Research Conference, em St. Louis, Missouri, e não tratou de questões monetárias ou econômicas. Deu boas-vindas aos participantes. Mas declarações vieram do Fed, ainda com as bolsas europeias em atividade, e não atiçaram os traders.

Raphael Bostic, presidente do Fed de Atlanta, jogou água fria na fervura provocada, na terça-feira, 27 de setembro, por discursos inflamados de outros dirigentes da instituição, que defenderam altas mais agressivas da taxa de juro.

Bostic não trouxe novidade capaz de interferir na formação de preços dos ativos. Mas foi transparente. Afirmou que a linha de base das decisões do Fed, no momento, é de alta de 0,75 ponto percentual na taxa básica em novembro e de 0,50 ponto em dezembro.

Se a inflação não cair, afirmou o dirigente, o Fed precisará ser “moderadamente restrito” na política de juros. Isso significa levar a taxa básica ao intervalo de 4,25% a 4,50% até o fim do ano.

Em um contraponto, a praticamente meia hora do fechamento das bolsas americanas, o presidente do Fed de Chicago, Charles Evans, declarou que a inflação está muito alta e “é justo dizer que o Fed deveria ter começado a aumentar as taxas antes”.

Evans disse também que o atraso exige agora “incremento na caminhada” e espera chegar ao pico da taxa em março de 2023.  “Uma taxa entre 4,50% e 4,75% seria um bom lugar para a gente estar no final do ano ou em março de 2023”, acrescentou Evans. Os mercados já estavam fechados.