A crise no setor imobiliário da China se aprofundou na quinta-feira, 28 de setembro, com a decisão da Bolsa de Hong Kong de suspender a negociação de ações da Evergrande, que já foi a maior incorporadora do país, e de duas de suas subsidiárias, uma delas de serviços imobiliários e outra envolvida em negócios de fabricação de veículos elétricos.

O anúncio foi feito um dia depois que a agência Bloomberg revelou que o fundador e presidente da Evergrande, Hui Ka Yan, foi preso pela polícia chinesa no início deste mês. Além de Hu, dois altos funcionários do braço de gestão de fortunas da empresa já haviam sido detidos pelas autoridades.

A incorporadora tinha retomado as negociações de suas ações na Bolsa de Hong Kong em 28 de agosto, após ter sido suspensa por 17 meses por não publicar seus resultados financeiros. Afundada em dívidas de US$ 327 bilhões, a Evergrande viu sua crise se agravar este mês.

Na semana passada, a empresa descartou um plano de reestruturação de dívida offshore que levou mais de um ano para ser acordado com investidores internacionais. Na segunda-feira, um braço da holding, a Hengda Real Estate Group, deixou de pagar US$ 547 milhões do principal e juros de um título denominado em yuan, de acordo com um documento da bolsa de valores.

Em meio aos seguidos calotes, os investidores começaram a se desfazer de ações da incorporadora, que caíram mais de 40% na semana passada.

A Evergrande e outras incorporadoras começaram a ter problemas com o estouro da bolha imobiliária chinesa, a partir de 2020, na esteira da paralisação de novas incorporações por causa da pandemia, abrindo uma crise no setor - que responde por 25% do PIB (Produto Interno Bruto) e um quarto dos financiamentos bancários da China.

O estouro da bolha desestruturou um modelo de negócios que vinha se sustentando há mais de duas décadas por meio de um processo de contínua valorização dos terrenos e dos imóveis nos centros urbanos até atingir um nível insustentável. Os preços das moradias aumentaram 80 vezes nesse período.

Cerca de 80% das vendas de unidades novas da última década foram de propriedades parcialmente construídas, que as incorporadoras prometeram entregar num prazo de um a três anos. A receita dessas pré-vendas se tornou a maior fonte de financiamento para novos lançamentos.

Com a redução de obras e de vendas por causa da pandemia, o fluxo de caixa e de pagamento de prestadores de serviços foi interrompido. No final do ano passado, só a Evergrande tinha 720 mil apartamentos vendidos e não concluídos.

Ofensiva do governo

Em julho de 2020, órgãos reguladores chineses impuseram restrições aos empréstimos para reduzir os riscos financeiros e pelo menos 30 das grandes incorporadoras do país ficaram inadimplentes. Hoje, analistas ocidentais calculam que as empresas responsáveis por 40% das vendas de imóveis da China entraram em inadimplência. As dívidas do setor somam US$ 1,3 trilhão.

Outra grande incorporadora chinesa, a Country Garden, que reportou um prejuízo de US$ 7,3 bilhões no primeiro semestre do ano, está trabalhando para liquidar suas dívidas com os detentores de títulos.

Nas últimas semanas, o governo anunciou novas medidas para impulsionar o mercado imobiliário, como a redução das taxas hipotecárias. Algumas das maiores cidades da China tentaram aliviar as restrições à compra de casas.

Em outro movimento, o governo chinês deverá anunciar um novo ministro das Finanças. De acordo com o jornal britânico Financial Times, Lan Fo’na - antigo governador provincial e alto dirigente do Partido Comunista Chinês – deverá substituir Liu Kun nas próximas semanas.

A troca no ministério seria uma forma de tentar reanimar a economia do país, que vem desacelerando desde o início do ano, e reverter o pessimismo entre as famílias chinesas, profundamente cautelosas em investir em imóveis por causa dos seguidos escândalos do setor.